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Memória Libertária

Documentos e Memórias da História do Movimento Libertário, Anarquista e Anarcosindicalista em Portugal

Documentos e Memórias da História do Movimento Libertário, Anarquista e Anarcosindicalista em Portugal

Memória Libertária

13
Jan23

Uma “ manifestação de impotentes” tentou boicotar a primeira manifestação feminista em Portugal  a 13 de janeiro de 1975


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Há 48 anos, no dia 13 de janeiro de 1975, uma manifestação convocada pelo MLM (Movimento de Libertação das Mulheres) , criado alguns meses antes, foi atacada por centenas de populares (a maioria voyeurs) que agrediram as feministas - com quem vários sectores do movimento libertário tinham contactos próximos, participando mesmo na abertura e limpeza da casa que ocuparam no alto da Avenida Alvares Cabral, em Lisboa, e onde esteve instalado durante algum tempo o equipamento para a produção de material impresso da Associação de Grupos Autónomos Anarquistas -, tornando, não apenas simbolicamente, o Parque Eduardo VII em Lisboa, num verdadeiro campo de batalha.

A manifestação tinha sido convocada para contestar os valores de uma sociedade que oprimia as mulheres e, para tal “ficou decido que uma das mulheres iria vestida de noiva, uma outra de dona de casa e uma terceira iria mascarada de vamp (um símbolo sexualà época). No fim, o objetivo era queimar o véu e o bouquet de flor de laranjeira, a esfregona e o pano do pó e deitar por terra a ideia da mulher como objeto sexual”. (aqui)

O jornal Expresso, no sábado anterior, tinha, no entanto, noticiado que as mulheres, em protesto, iriam queimar "todos os símbolos de opressão" e fazer "strip-tease", num acto simbólico de libertação, o que nunca esteve previsto, nem aconteceu, mas que levou centenas de homens a concentrarem-se no local.

Numa notícia posterior à manifestação, intitulada “A manifestação dos impotentes”, o jornalista Júlio Henriques, actual director da revista Flauta de Luz, também publicada no semanário Expresso, a 18 de Janeiro, escreve que “paradoxalmente, a esta manifestação responderam, não as mulheres (em número mínimo) mas os homens. E a manifestação original (a convocada) transformou-se numa outra: a dos impotentes. A dos que têm como valores sagrados a sagrada trilogia “trabalho, família e pátria” (a que em versão lusitaníssima, se deve acrescentar: deus).(...) E é de espontaneidade que se pode falar acerca do movimento que fez acorrer à manifestação do MLM uma multidão de mirones impotentes, atraídos, como as moscas pela merda, pelo que julgavam ser um strip-tease público (...)”.

A jornalistas Lourdes Feria, no Diário de Lisboa, de 14 de janeiro, dá também conta do que se passou na manifestação do MLM: ““Os cartazes que as mulheres do M.L.M traziam foram-lhes brutalmente arrancados. E não contentes com a façanha, os homens rasgavam e espezinhavam os bocados de papel onde se reivindica ‘Democracia sim, falocracia não’. Verificou-se naquele triste espectáculo dos homens um ‘complot’ muito evidente. Os que não agiam consentiam. Esperavam assistir a um strip-tease (e de borla), aliás uma ideia espalhada pelo ‘Expresso’, não sei com que intuito, e ficaram possessos de ira quando se aperceberam que não tinham oportunidade de extravasar as suas frustrações sexuais.”

E, mais à frente, acrescenta Lourdes Féria ao relato, “Um rapaz, simpatizante de um movimento politico que se afirma o mais revolucionário (e infalível) de todos dizia, com um ar de cátedra condimentado com uma pitadinhas de moralismo: “Isto é rídiculo, vocês não conseguem nada”; “a vossa luta deve estar enquadrada na luta geral da vanguarda do proletariado contra os capitalistas”.”

Na altura, apesar de Maria Teresa Horta, uma das impulsionadoras do MLM com Isabel Barreno, ser militante do PCP, o MDM demarcou-se da manifestação, em comunicado, onde refere que  “o Movimento Democrático das Mulheres Portuguesas (M.D.M.) condenando os lamentáveis incidentes referidos no documento acima citado, dissocia-se, considerando que não se podem subestimar os objectivos e métodos utilizados pelo Movimento de Libertação das Mulheres, os quais não são estranhos aos referidos acontecimentos.”

Sobre esta manifestação e a história do MLM, numa perspectiva académica, ler a interessante tese de mestrado de Cristiana Pena, datada de fevereiro de 2008: “A REVOLUÇÃO DAS FEMINISTAS PORTUGUESAS 1972 — 1975 -  DO “PROCESSO DAS TRÊS MARIAS” À FORMAÇÃO DO MLM — MOVIMENTO DE LIBERTAÇÃO DAS MULHERES

relacionado: 

carta do MLM ao Liberation: https://memorialibertaria.blogs.sapo.pt/carta-do-mlm-publicada-no-jornal-38724

reportagem da RTP:  https://arquivos.rtp.pt/conteudos/manifestacao-do-movimento-de-libertacao-das-mulheres/

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