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Memória Libertária

Documentos e Memórias da História do Movimento Libertário, Anarquista e Anarcosindicalista em Portugal

Documentos e Memórias da História do Movimento Libertário, Anarquista e Anarcosindicalista em Portugal

Memória Libertária

23
Fev23

"A Batalha": de diário sindicalista revolucionário à clandestinidade e, depois, à transformação em jornal de "expressão anarquista"


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A 23 de fevereiro de 1919 era publicado o 1º numero do jornal sindicalista revolucionário "A Batalha", tornando-se posteriormente o orgão da CGT, anarcosindicalista, publicando-se diariamente. Sofreu sucessivas proibições e uma forte repressão que levou ao seu encerramento em 26 de maio de 1927, depois da destruição das suas instalações.
Reapareceu em 1930, como semanário, sendo suspenso, proibido pelo governo, ao fim de 13 números.
Começou depois a publicar-se de forma clandestina até Dezembro de 1949.
Reaparece depois do 25 de Abril de 1974 (em Setembro desse ano) pela mão de um conjunto de antigos e novos militantes libertários, tendo Emidio Santana como director.
O investigador do movimento anarquista João Freire traçava assim, na revista A Ideia (outono de 2019) o percuso deste "jornal centenário & com muita história":
"(...) O movimento operário de então fugia dos partidos, dos caudilhos, das eleições e dos debates parlamentares “como o diabo da cruz”. O partido socialista de Fontana e de Antero não lograra enquadrar os operários e os assalariados do campo naquele modelo de social-democracia que vingara na Alemanha, na Grã-Bretanha ou na Bélgica, entre outros países mais adiantados. O “bolchevismo” ainda estava para nascer entre nós. E a República logo desiludira as massas laboriosas com o seu “decreto burla” igualando liberalmente a greve e o lock-out, com o espingardeamento dos conserveiros de Setúbal e a desatenção às reivindicações dos trabalhadores rurais alentejanos.
Para os militantes da causa operária, além da multiplicidade de órgãos de imprensa sindicais e de grupos anarquistas ou das actividades realizadas nas (ou a partir das) suas sedes, urgia a criação de um grande veículo informativo e propagandístico das suas insatisfações, realizações e objectivos. Já o haviam tentado em 1908 com o diário A Greve, mas que muito pouco durara. Após a queda da Monarquia, o tipógrafo Alexandre Vieira conseguira pôr de pé o semanário O Sindicalista, que se aguentou razoavelmente bem, apesar das perseguições a que foi sujeito, sobretudo a partir de 1913 com o governo de Afonso Costa.
Os anos da guerra foram difíceis para o movimento sindical mas, fazendo das fraquezas forças, foi a partir daí que a acção colectiva dos trabalhadores se reacendeu, as organizações se multiplicaram, os efectivos aderentes incharam e as perspectivas de uma nova época – de Revolução Social – insuflaram de ânimo muitos activistas, também embalados pelo exemplo vindo da Rússia, que aqui ia chegando.
Foi num momento único e particularmente convergente de vontades e ideias que, a 23 de Fevereiro de 1919, saiu à rua o primeiro número de 'A Batalha', subtitulado de «diário da manhã, porta-voz da organização operária portuguesa», sob a chefia redactorial do mesmo Alexandre Vieira e referido como «diário de grande tiragem e expansão».

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Jornal A Batalha, cabeçalho desenhado por Perfeito de Carvalho.

Ocorre lembrar que o desenho gráfico do cabeçalho de A Batalha foi desenhado pelo tipógrafo Francisco Perfeito de Carvalho, um patusco estroina que (segundo contam seus contemporâneos) tendo sido designado pela CGT para ir representá-la a um congresso da Internacional Sindical Vermelha, em Moscovo, gastou boa parte do dinheiro então recebido… em Paris! E quando no Congresso Operário de 1922, na Covilhã, deu conta
dessa missão mas os delegados o pressionavam para que apresentasse o devido relatório, em papel, ele terá respondido/perguntado se queriam que o escrevesse… em verso!?
Até Maio de 1927, produzir diariamente um jornal de 4 a 8 páginas em grande formato, com base no voluntariado de quase toda a redacção, de uma parte do quadro de compositores tipográficos e da integralidade dos seus correspondentes e difusores da província, foi uma obra homérica, pode dizer-se. Chegou a afirmar-se que A Batalha atingira o terceiro posto nacional em termos de tiragem, atrás d’ O Século e do Diário de Notícias. É duvidoso que assim tenha sido, à luz do que investigou Jacinto Baptista para o seu inesquecível livro 'Surgindo vem ao longe a nova aurora…' (Bertrand, 1977) e das memórias deixadas por Manuel Joaquim de Sousa em 'Últimos Tempos de Acção Sindical Livre e do Anarquismo Militante' (Antígona, 1989). Mas, em qualquer caso, foi sempre de vários milhares – talvez dez mil, em média, quando o habitual para os “semanários de ideias” era de uns três mil – o número de exemplares postos diariamente em circulação. E nenhum outro dos seus confrades da imprensa sofreu tão largas perseguições do poder político como A Batalha, através de suspensões administrativas e de outras manobras de intromissão governamental na liberdade de opinião republicana!...
A partir de 1923, o descanso semanal dos tipógrafos ao domingo era aproveitado para que, às segundas-feiras, saísse um «Suplemento Literário e Ilustrado», composto ao longo da semana precedente e – como as edições normais – impresso em casa comercial alheia situada na Rua da Atalaia, no mesmo bairro da Calçada do Combro onde (no imponente palácio dos condes de Castro Marim e Olhão, dito do Correio Geral, que foi tomado de aluguer) funcionava a redacção do jornal e uma parte significativa dos organismos sindicalistas então existentes na capital. Mas, para se ter uma ideia do espírito militante reinante, bastará dizer que um jornalista profissional como Pinto Quartim e que ali colaborava activamente nas horas de folga, escrevia directamente os seus artigos ao componedor, o aparelho manual onde então se fazia a composição tipográfica a chumbo, na ausência das modernas e semi-automáticas máquinas “Linotype”.
Diga-se, num parêntesis, que questões laborais deste tipo – porém, dentro das conflituosas relações entre patrões e assalariados – foram as que originaram em 1927 uma cena cómica e tumultuosa entre o conceituado tipógrafo Alexandre Vieira e o cultivado dr. Fidelino de Figueiredo, então director da Biblioteca Nacional, sita ao Chiado. A uma ofensa verbal deste último, respondeu o primeiro com dois murros, levando uma chapada de resposta que lhe despejou os óculos e feriu no nariz, tudo terminando com o balanceamento do tinteiro de bronze pousado na secretária à cabeça do chefe e a chegada em força do pessoal de segurança da instituição!
Mas continuemos. O sucesso editorial do diário foi tão grande que, em breve, a sua actividade se alargou à publicação de alguns livros e brochuras (por exemplo, a colecção A Novela Vermelha) e, em 1925, à edição quinzenal de uma boa revista-magazine, intitulada Renovação. Tanto este último título como o «Suplemento» podem hoje ser visitados on line (no site http://ric.slhi.pt/)
Com isto, a editorial d’A Batalha angariou a participação graciosa de várias boas plumas, artistas gráficos e intelectuais, já que ali o único colaborador remunerado era o director, por desempenhar a função em exclusividade, e que, por prurido anti-autoritário, era apenas chamado de redactor-principal. Mas personalidades significativas do meio cultural da época como Ferreira de Castro, Assis Esperança, Eduardo Frias, Sá Pereira, Nogueira de Brito, Bento Faria, Manuel Ribeiro, Carvalhão Duarte, Francine Benoit, Rocha Martins, Arnaldo Brazão, Tomás da Fonseca, Cristiano Lima, Jaime Brasil, Julião Quintinha, Ladislau Batalha, Mário Domingues, Adelaide Cabette, Adolfo Lima, Vitorino Nemésio, Roberto Nobre ou Stuart Carvalhaes deixaram o seu nome ali gravado, contribuindo para a qualidade e reputação destas produções. 
Como todas as obras colectivas do labor humano, nem tudo foi sempre isento de querelas e conflitos intestinos. Críticas pessoais e políticas subiram por vezes até às páginas do jornal. O confronto ideológico entre anarquistas e comunistas tornou-se estrutural. E, frequentemente, houve atritos e dificuldades entre a redacção do diário e os órgãos de topo da Confederação Geral do Trabalho, de que era o “órgão oficial” na imprensa.
Já sob a Ditadura Militar e na sequência do levantamento armado de Fevereiro de 1927, a polícia política (e parece que também energúmenos seus adjuntos) desembarca em força na redacção do jornal num dia de maio seguinte, prende quem lá está e destrói mobiliário e material tipográfico. O jornal é suspenso sine die e, legalmente, só reaparecerá fugazmente em 1930 como semanário e já sem a referência da sua ligação à CGT. Mas o militantismo anarco-sindicalista sempre se empenhou em prosseguir a sua publicação, de modo clandestino. Assim aconteceu em séries sucessivas em 1934, em 1935-37 e em 1947-49. E foram várias as tipografias secretas que funcionaram para o imprimir (no Pote d’Água, na Ramada, na Rua Carvalho Araújo, na Damasceno Monteiro, numa furna de Monsanto, etc.), sempre com camaradas tipógrafos a arriscarem a sua liberdade para que fosse feito, chegando a sua inventiva à construção de prelos em madeira (para o ruído não alertar a vizinhança) e ao requinte técnico de terem conseguido uma impressão a duas cores, naturalmente o preto e o vermelho.
Após o 25 de Abril de 1974, Emídio Santana, que já fora seu responsável nos anos 30, assume claramente a iniciativa da sua republicação legal e regular, que tem prosseguido até hoje (vai no nº 283 desta VI série, creio), embora com periodicidades oscilando entre o quinzenal e o trimestral, e tiragens modestas, semelhantes às de outros jornais de pequenas minorias políticas. Inicialmente assumiu-se formalmente, no frontispício, como «Jornal sindicalista revolucionário», que em Agosto de 1975 alterou para “Jornal anarco-sindicalista”, uma designação que deixou de ostentar em Agosto de 1983, mas sempre mantendo até hoje a menção de «Antigo órgão da CGT». Em Fevereiro de 1989, na retoma de publicação depois do falecimento do seu carismático director, passou a ser «Jornal de expressão anarquista».
Apesar da dimensão grupal-associativa que a existência d’A Batalha sempre implicou, vale a pena registar os nomes dos seus sucessivos responsáveis editoriais, cuja importância bem se compreende: Alexandre Vieira, Manuel Joaquim de Sousa, Manuel da Silva Campos, José da Silva Santos Arranha, Mário dos Santos Castelhano, Emídio Santana, José Maria Carvalho Ferreira, Moisés Silva Ramos, Maria Magos Jorge, João Santiago e António da Cruz. " (João Freire, A BATALHA UM JORNAL CENTENÁRIO & COM MUITA HISTÓRIA, A Ideia, Outono de 2019, pgs. 150-154)
 

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Último número de A Batalha clandestina, dezembro de 1949

Na mesma edição da revista A Ideia, é publicado um texto de Emidio Santana com o historial de A Batalha e das várias e sucessivas séries do jornal: 
 
"DA HISTÓRIA D’ A BATALHA, segundo Emídio Santana 
Existe no Arquivo Histórico-Social da BNP (AHS 5500 Ms 1496) um impresso dactilografado não assinado mas que se sabe ser da autoria do então director do jornal A Batalha, Emídio Santana, e com o seguinte título «A vida do jornal sindicalista “A Batalha” na fase de clandestinidade durante o período do salazarismo, 1927-1974». O texto está localizado de Lisboa e tem duas datas (12 e 17 de Setembro de 1980).
Trata-se duma breve síntese da vida do jornal, desde o seu nascimento em 1919 até à data do texto, Setembro de 1980, porventura para ser divulgada junto da imprensa, de agências noticiosas ou em folha autónoma.
Destacam-se nele as violências policiais a que o jornal foi sujeito e as dificuldades impostas por que passou desde os primeiros anos, ainda durante o período republicano, muito agravadas depois, durante o período da ditadura e do autodesignado Estado Novo. Para publicação, normalizou-se a citação do título das publicações referidas no texto, passando-as de redondo para itálico e de caixa alta para caixa baixa,
desfizeram-se alguns parágrafos para melhor agrupar o texto e corrigiram-se alguns erros evidentes (concordâncias, pontuação, falta dalguma palavra) de modo a tornar o texto mais acessível ao leitor de hoje. Um agradecimento é devido a Paulo Guimarães pela descoberta e selecção do documento.
"A Batalha, jornal diário e órgão da Confederação Geral do Trabalho começou a publicar-se em Lisboa a 23 de Fevereiro de 1919, sob a direcção de Alexandre Vieira, e continuou a publicarse diariamente, sem interrupção, apenas com acidentes de apreensão policial ou assaltos da mesma polícia à sua redacção, até ao n.º 2556, de 26 de Maio de 1927, data em que foi interditado pelo governo militar e as suas instalações destruídas pela polícia. Era ao tempo seu director Mário Castelhano e editor Silvino Noronha. No ano da sua suspensão publicaram-se quatro (4) números do Boletim Operário, editados pelo Comité Confederal da CGT.
Para suprir a sua falta e contornando a arbitrariedade do governo iniciou-se no Porto, a 29 de Setembro de 1929, o semanário A Vanguarda Operária, editado pela Delegação Confederal do Norte, embora já numa certa clandestinidade, como órgão dos Trabalhadores Portugueses,
tendo como director Zacarias de Lima e depois José Augusto de Castro, e como Administrador Francisco Ferrão.
Em Setembro de 1930 reaparece A Batalha como semanário, autorizado legalmente, assim identificada: II Série, como órgão da Comissão Interfederal de Defesa dos Trabalhadores, designação pública sob a qual se ocultava a CGT.
Editor: Alberto Dias e Administrador: Domingos Afonso Ribeiro. Redacção na Calçada Castelo Branco Saraiva, nº 42, e impresso na Rua da Atalaia, n.º 114, onde sempre fora impresso quando jornal diário. Começou a publicar-se em 13 de Setembro de 1930 e publicaram-se 13 números,
interrompendo a sua publicação por interdição do governo.
III Série, já clandestina. O n.º 1 tem a data de Abril de 1934 e publicaram-se dois (2) números devido às numerosas prisões na repressão do 18 de Janeiro. Estes números tinham o fim de reconstruir o movimento fortemente atingido pelas prisões que decorreram nesta fase.
IV Série, Ano XVI, 1935. Os números 1, 2 e 3 desta série, relativos a Março, Abril e Junho, foram compostos e impressos numa tipografia montada no subsolo duma cave na Rua Carvalho Araújo, e a máquina era construída parte em madeira e outra parte, a mecânica, em ferro, no processo das máquinas de impressão rotativas. Por precaução a tipografia foi transferida para a Venda Nova, à saída de Benfica. Mas o n.º 4, da mesma série, ano XVII, não saiu numerado e destinava-se a assinalar o 1.º de Maio desse ano, 1936, e foi composto de emergência numa oficina de Campo de Ourique do companheiro Avelino.
IV Série, Ano XVIII, 1937. Os números 5, 6 e 7, correspondentes a Janeiro, Fevereiro e Abril eram impressos a preto. Os números 8, 9, 10 e 11 correspondentes, respectivamente, a Maio, Junho, Julho e Setembro saíram impressos a preto e o cabeçalho ou «en-têtes» a vermelho. Publicava-se com 4 páginas e no formato de 40 X 30 cm. Esta série foi composta e impressa numa furna de Monsanto com entrada pela Rua Feliciano de Sousa, a Alcântara, e acompanhou o período agudo da guerra de Espanha, o período de maior repressão fascista.
V Série, Ano XXIX, 1947. Publicaram-se 10 números até Agosto deste ano. Mesma série, Ano XXX, 1948. Os números 11 e 12 correspondem a Novembro e Dezembro deste ano. Mesma série, Ano XXXI, 1949. Os números 13, 14 e 15 correspondem a Janeiro, Fevereiro e Abril. Mesma série. Ano XXXI, 1949. Publicaram-se os números 16, 17, 18, 19, 20 e 21, respectivamente de Maio, Junho, Julho, Agosto, Novembro e Dezembro deste ano.
Durante a publicação de A Batalha como jornal diário registaram-se várias perseguições, atentados à sua liberdade de publicação e variadas violências registadas numa elementar estatística:
Prisão de toda a redacção, em 1919, 1920 e 1921... 3 vezes
Encerramento da redacção e tipografia, nos mesmos anos...3 vezes
Não se publicou por o seu quadro tipográfico e redactorial se ter solidarizado com greves de protesto... 2 vezes
Submetida ao regime de censura prévia... 7 vezes
Apreensão pela polícia...11 vezes
Atrasos de saída por acção policial... 4 vezes
Assaltos da polícia à redacção... 7 vezes
Suspensa por acção policial... 5 vezes
Buscas à sede... 3 vezes
Processo em tribunal... 2 vezes
Condenação em tribunal... 1 vez
A BATALHA APÓS O 25 DE ABRIL
Em Setembro de 1974, reaparece como quinzenário. Indicada como Ano 1, Quarta Série, n.º 1. Esta série corresponde à VI Série, posteriormente corrigida e [presentemente] no ano VI correspondente a esta fase. Publica-se no formato normal dos jornais. Normalmente a 4 páginas, com o cabeçalho tradicional, a vermelho. É director Emídio Santana e é redigido por um colectivo redactorial de vários componentes. Presentemente está no n.º 65." (Manuscrito de Emídio Santana, A Ideia, Outono de 2019, pgs. 155-158)
 
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Nov22

Cronologia Libertária: novembro um mês importante para a imprensa libertária e operária de Évora


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Elias Matias (1888-1990) foi um  relevante miltante anarquista em Évora na primeira metade do século XX. Foi membro do Grupo Anarquista Propaganda Livre, que editou o “Avante!” em Évora (1908-1912) e correspondente de “O Sindicalista” e  de “A Aurora” (1911-1912), sob o pseudónimo de “Marti”. Foi ainda membro do Grupo Revolucionário “Luz e Acção” (Santiago do Escoural, 1923) , filiado na União Anarquista Portuguesa. Ele e o Grupo Anarquista Propaganda Livre tiveram um papel importante no Comité de greve e de apoio aos rurais alentejanos aquando das grandes greves do início de 1912. (Foto http://mosca-servidor.xdi.uevora.pt/projecto/index.php )
 
*
Em novembro sugiram três orgãos de imprensa relacionados com o espaço libertário e sindicalista revolucionário em Évora.
 
1) Logo em novembro de 1919 sugiu a "Aurora Social", órgão e porta-voz da União dos Sindicatos Operários de Évora. Publicou-se durante vários números (pelo menos até Maio de 1920, com um número extraordinário para o 1º de Maio de 1922) , tinha a sua morada na sede da USO, na Praça Joaquim António de Aguiar, e nas suas páginas durante a sua curta existência dão-se noticias de diversas actividades das associações de classe desta cidade alentejana e textos que reflectem as questões que se colocavam aos sectores mais progressistas do movimento operário, dede o associativismo operário ou a recente revolução russa, até à criação da Escola Francisco Ferrer ou de um grupo dramático da USO com actuações no teatro Garcia de Resende. 

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2) Muito mais tarde, em novembro de 1976 aparece o jornal "Apoio Mútuo" que se publicou entre novembro de 1976 e inícios de 1977. Era um jornal combativo que juntava companheiros de Évora e outros que ali estavam deslocados por questões laborais.
 

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3) 36 anos depois, em Novembro 2012, surge o "Boletim Acção Directa", editado pelo Colectivo Libertário de Évora que se publica até junho do ano seguinte. 

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4) No entanto, nos primórdios da imprensa anarquista em Évora está o jornal "Avante!", que surge  em fevereiro de 1909, orgão e propriedade da Biblioteca do Grupo de Propaganda Livre. Jornal Anarquista. Com duas séries, num total de 8 números, que se publica até depois da implantação da Republica, em 1911. O Grupo de Propaganda Livre, de que fazia parte Elias Matias, teve uma grande relevância aquando da grande greve dos rurais alentejanos, em 1911-1912.
O Avante!, orgão e propriedade da Biblioteca do Grupo de Propaganda Livre. Jornal assumidamente anarquista. Série I e II, 8 números. 1909-1911. O primeiro número foi publicado em Fevereiro de1909, tendo como administrador Sertório Augusto Fragoso e Redactor Francisco Direitinho. A Redacção e Administração situavam-se na Rua de Santa Clara, 11, Évora. Era composto e impresso na Minerva Comercial, Rua do Paço, 73 Évora. 
O Grupo de “Propaganda Livre”, iniciou-se  em Évora em 1908 e ainda existia em 1912, pelo menos, tendo aderido em 1911 à Federação Anarquista da Região Sul. Dedica-se à propaganda, à edição do jornal “Avante”, à organização da biblioteca e de conferências.  Teve uma grande influência nas greves dos rurais alentejanos de 1911/1912 . Pertenceram a este Grupo os seguintes militantes: Elias Matias, Sertório Fragoso, Francisco Direitinho, Possidóno Mesquita, Manuel Pratas, Celestino Vale, Jerónimo Santos, António Nicolau, J. Marques Leitão. Alguns autores defendem que José Sebastião Cebola, que se destacou na organização dos trabalhadores rurais e na propaganda anarquista na região de Évora também pertencia a este grupo.

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5) O  Trabalhador Rural, órgão da Federação Nacional dos Trabalhadores Rurais, que tinha sede em Évora. O primeiro número saiu a  8 de dezembro de 1912, tendo sido publicados 16 números entre 1912 e 1914. O Director era Diogo Bernardes. Editor: José António Aragão. Administrador:  António  Marcelino. Publicação mensal. Redacção e Administração: Rua da Freiria de Cima, 21- Évora. Composto e Impresso na Tipografia Eborense, Rua Miguel Bombarda, 1 a 5. Deste jornal saiu ainda um número único a 2 de Junho de 1918.  A Federação Nacional dos Trabalhadores Rurais (vulgo Federação Rural) foi criada em 1912 e extinta em 1933, apesar de  a partir de 1927 ter funcionado numa situação de semi-clandestinidade, utilizando a designação de “Comissão Nacional de Estudos e Defesa Rural” de 1929 em diante. Na actividade organizativa dos trabalhadores rurais alentejanos destacaram-se os seguintes anarco-sindicalistas  José Joaquim Candieira, Vital José, José Cebola e Quirino José (todos chegaram a desempenhar as funções de Secretário-Geral da Federação). Sindicalistas revolucionários: Diogo Bernardes, Joaquim Fornalha, José António Aragão e Jesuíno Madeira. 
 

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6) Mais tarde, em 1921, surge em Évora um novo jornal , também com o nome de "Avante!...", "percursor da sociedade egualitária", propriedade do Grupo Editor “Avante!…”. Iniciou e terminou  a sua publicação em 1921, tendo sido publicados três números.  Tinha como editor Armando Pratas, administrador Joaquim Nogueira, redactor principal Manuel Ramos e secretário de redacção Fernando Silva Junior. Era impresso na Minerva Comercial, na Rua da República, 75, em Évora. A redacção e administração eram na Praça Joaquim António d’Aguiar, 14 (sede da União de Sindicatos Operários de Évora). Era um jornal assumidamente anarquista, embora se notem já os ecos da revolução russa, defendida inicialmente por muitos anarquistas que consideravam que o ideal dos bolcheviques era semelhante ao seu e que os sovietes eram a base de organização da nova sociedade, sem Estado nem um partido político dirigente. A pouco e pouco esta adesão aos ideais da revolução russa vai-se desvanecendo e a maior parte dos libertários adopta uma posição crítica acerca da forma como o poder do partido comunista russo se exerce sobre a sociedade e de que é exemplo o Avante nº 2, de Agosto de 1921, em que é publicado um manifesto dos anarquistas russos intitulado: “ Pela Liberdade contra a Ditadura: um apelo dos anarquistas russos ao proletariado de todos os países”.
 

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Avante 1 (Évora, 1 Agosto 1921)

Avante 2 (Évora, 14 de Agosto 1921)

Avante 3 (Évora, 28 de Agosto 1921)

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Segundo o historiador Vitor Sá, que se baseia em informações, por exemplo, de Edgar Rodrigues e Carlos da Fonseca, desde 1865 terão existido em Évora os seguintes jornais de cariz operário e mutualista: “O Clamor dos Artistas, 1865; A Ideia, 1877; O Correio Eléctrico, 1883; O Operário, 1889; A Aurora Farmacêutica, 1896; Mérito, 1900 (número único dos tipógrafos); A Alvorada, 1903; Avante!, 1909; A Voz do Caixeiro, 1909; O Trabalhador Rural, 1912; O Primeiro de Maio, 1914 (número único); Aurora Social, 1919; O Despertar, 1921”.

Ver também: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2014/11/22/memoria-libertaria-imprensa-anarquista-e-anarcosindicalista-de-evora-19091921/

 

31
Out22

Jornal Anarquista Apoio Mútuo (Évora, 1976-1977)


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Publicamos as capas e os editoriais dos dois primeiros números do jornal anarquista de Évora "Apoio Mútuo" que se publicou entre novembro de 1976 e inícios de 1977. Era um jornal combativo que juntava companheiros de Évora e outros que ali estavam deslocados por questões profissionais.
*
 
EDITORIAL DO Nº 1
 
Assiste-se hoje em dia ao reforço cada vez maior do capitalismo e do Estado. Os mecanismos estatais e o governo do partido socialista coadjuvado pelos seus parceiros políticos, tentam institucionalizar e reforçar infatigavelmente a autoridade do Estado, bastante abalada pelo 25/Abril. O restabelecimento da hierarquia - hoje alcunhada de competência - nas relações sociais; a reabilitação dos tribunais civis; o disciplinamento da produção (nomeadamente através do aumento de motivos que justificam o despedimento com "justa causa", assim como a bufaria montada pelos sindicatos no seio dos trabalhadores industriais e agrícolas (l)); o revigoramento das polícias, uma das quais (a polícia judiciaria do Porto) já propôs até a formação de uma nova PIDE em colaboração com a polícia judiciária militar (alias, já a funcionar); etc., são algumas das medidas "revolucionárias" e "socialistas" decretadas. O governo socialista cumpre a sua função de vento em popa.
Para coroar todas estas medidas de subordinação das pessoas às cadeias do Estado e do respectivo disciplinamento, aparecem as eleições. Vigarice esta, que mais uma vez tenta atrelar os oprimidos aos partidos e ao Estado, retirar-lhes a iniciativa, colocá-los à mercê dos candidatos políticos, seus "defensores" e "representantes", tudo isto, para cúmulo, numas eleições em que só; depois de realizadas e, naturalmente, consoante as tendências das votações, é que serão definidas as funções dos órgãos do Estado a preencher. Perante estes jogos miseráveis é bom recordar a participação, sem excepção, de todos os partidos políticos (2) e a sua clara apresentação como sustentáculos basilares da sociedade autoritária em que não nos e possível viver sem nos revoltarmos quotidianamente.
O que se vai passando em Portugal, nas suas linhas gerais, não e original. Já vai sendo hábito, por esse mundo fora, quando os mecanismos da dominação e da opressão da sociedade autoritária sofrem abalos e ameaçam desagregar-se, que a chamada esquerda seja chutada para o poder. Entre outros, basta citar exemplos deste século: a alternância de governos na Inglaterra (P. Trabalhista - P. Conservador), as actuais situações eleitorais na Itália e na França; os governos de frente popular no após-guerra; a Espanha de hoje; etc.
Na eminência de situações revolucionárias mudam-se os governos para preservar o Estado, substituem-se as figuras dos chefes para salvar a autoridade; altera-se a propriedade das terras e das fábricas para assegurar a exploração e a submissão do trabalho.
A esquerda não passa de uma equipa de batedores que abrem caminho a soluções autoritárias de direita ou estatais totalitárias de esquerda. Veja-se a este propósito a actualidade do texto de Kropotkine publicado neste número do "Apoio Mutuo", além da actual "situação político-militar" em Portugal e o golpe militar de extrema-direita que nos espreita.
É contra tudo isto que nós lutamos.
Não temos alternativas políticas a propor nas campanhas eleitorais, nem programas económico-sociais de governo a defender.
Lutamos, sim, pela libertação do homem de todas as opressões e alienações, sejam elas políticas, religiosas ou económicas, e pelo fim do governo do homem pelo homem.
Lutamos, sim, pela abolição do salariato e de toda e qualquer forma de venda do homem.
Lutamos, sim, pela destruição da produção mercantil à qual o homem está, actualmente subordinado e pela criação de um aparelho produtivo, descentralizado e totalmente virado para as necessidades das pessoas, contra a lógica do capital e do lucro.
Lutamos, sim, pela revolução total, pela supressão do Estado, da hierarquia social e de toda e qualquer função estatal que imponha forçadamente formas de organização. Defendemos o princípio da afinidade e a associação livre dos indivíduos.
Só assim acabaremos com todos os tipos de governo e os substituiremos pela administração das coisas pelos indivíduos livremente associados.
Só através da acção directa, da solidariedade, e do apoio mútuo conseguiremos impulsionar e participar na Revolução Social, igualitária e libertária, que instaurará o Comunismo Libertário.
E, sobretudo, no período que atravessamos impõe-se acabar de vez com as ilusões espalhadas por todo esse escol de "representantes" - "servidores" do povo. Como oprimidos e vigarizados, urge cerrar fileiras contra toda essa canalha. Mas fábricas, nos campos, nos bairros, nas escolas organizemo-nos, coordenemos as nossas acções a nível local e regional, pois a nossa libertação só poderá ser obra de nós próprios.
 
ABAIXO O ESTADO, A POLÍCIA E O CAPITAL! VIVA O COMUNISMO LIBERTÁRIO!
 
(1) - Com Vantagem, neste campo, para os sindicatos controlados pelo PCP.
(2) - Ao referirmos os partidos políticos, não esquecemos os chamados independentes, metidos até à medula no mesmo jogo. Aliás, reconheça-se, na generalidade dos casos a existência dos "independentes" está ligada apenas à falta de lugares vagos nas cúpulas dos partidos!

 

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EDITORIAL DO Nº 2

A JUDICIÁRIA 
SUBSTITUÍ A PIDE!
I
Começaram há pouco tempo os julgamentos dos famigerados agentes da pide. Julgamentos esses, que melhor se poderiam designar por represõezinhas... dada a bondade de trato dos respectivos tribunais militares. Aliás outra coisa não seria de esperar, já que nas operações militares nas colónias, a pide sempre colaborou com as forças armadas, antes e depois do 25 de Abril (lembremo-nos da Polícia de Informação Militar). Que atitude se esperaria que tomassem perante os seus antigos colaboradores?
Os protestos não param de chover perante esta escandaleira.
Desde os grupos da extrema-esquerda até à própria Assembleia da Republica e Governo, a indignação parece geral e lá se vão aprovando moções, recomendações, instruções, posições, legislações.
Logo depois do 25 de Abril, quando tiveram margem de manobra suficiente para sanearem os tribunais (todos eles afeitos ao regime fascista), ficaram-se por actuações simbólicas...mas "cheias de significado"! Salgado Zenha, xuxialista de grande quila­te e que foi responsável pela coutada da justiça durante bastante tempo, protesta agora balofamente contra um escândalo de que é co-responsável. Enfim, os homens do Estado vão-se sustentando uns aos outros, e o Estado conquista-os a todos.
 
II
Enquanto os homens do novo poder vão protestando contra as actividades de polícia dos homens do antigo poder, a nova polícia, seguindo as pisadas da antiga, vai estendendo assustadoramente os seus tentáculos.
Na verdade, a polícia judiciária civil e militar, em estreita colaboração, vão refazendo os antigos fi­cheiros, procedendo a interrogatórios arbitrários, efectuando buscas a casas, desenvolvendo actividades de vigia em ruas e cafés num frenesim perfeitamente comparável a antiga-pide contra quem tanta tinta tem gasto. A lógica do Estado é implacável.
As verbas para gastos policiais atingem somas astronómicas (a PJM tem, para já, 100 000 contos), abrem-se delegações nas principais cidades do país, reestruturam-se as suas actividades criando-se inclusivamente uma "escola de polícia" (quem não se recorda, ainda, da escola da pi­de em Sete-Rios, Lisboa?), melhoram-se os laboratórios, refinam-se os métodos com os ensinamentos legados pela famigerada pide, acrescidos com novos conhecimentos importados (e, para esta "ciência", não se conhecem restrições, nem austeridade!) de outros países de tecnologia repressiva avançada...
Em Évora, de há uns tempos a esta parte, os novos pupilos da segurança do Estado ensaiam os seus conhecimentos:
-  fazem emboscadas, de noite, a pessoas que regressam a casa, quer inquirindo ameaçadoramente de que presumível reunião vieram, quer ordenando o despejo de todos os seus bolsos;
- desenvolvem longos e insistentes interrogatórios, mesmo sem convocatórias, utilizando o hábito antigo do polícia "bom" e do polícia "mau", assumindo o polícia "bom" a figura do capitão de Abril e o "mau" a do sargento tarimbeiro (l);
- vigiam descaradamente os principais cafés da cidade, suspeitando-se que a sua "dedicação" se tenha estendido às escutas telefónicas.
Devido às ilusões espalhadas e repisadas por toda a chamada esquerda sobre os "progressistas" e "revolucionários" elementos das forças armadas eis a polícia com o seu trabalho facilitado ao colocar perante as pessoas um militar "anti-fascista" ou um polícia "socialista".
O papel das polícias é o mesmo, aqui ou na China. A vigarice da polícia popular ou socialista, assim como a charlatanice dos Estados "socialistas ou "de todo o povo", não passam de subterfúgios para iludir os oprimidos e perpetuar a dominação e a exploração com roupagens reformadas.
 
III
Contra a fantochada dos julgamentos dos pides, nós, anarquistas, protestamos também! Não no sentido da pide ter sido uma polícia execrável, violenta e não democrática. Não no sentido, também, de exigir aos tribunais maior dureza. Mas sim porque sempre protestámos e combatemos todas as polícias do mundo que, juntamente com os exércitos (esse gado patrioteiro), foram e são os pilares do Estado.
Combatemos a polícia alemã que, às ordens dos sociais-democratas (a parentes próximos dos socialistas portugueses), constroem prisões especiais para os anarquistas, assassinando-os e destruindo-os lentamente como aconteceu no caso do grupo Baader-Meinhof.
Combatemos a polícia socialista soviética que envia para campos de concentração, ou hospitais psiquiátricos, todos os que se manifestam e se revoltam contra as condições totalitárias do Estado-patrão russo.
Combatemos a polícia popular chinesa, que reprime duramente greves de operários e cria "campos de trabalho", que são verdadeiros campos de concentração, para os chamados agitadores que não amouxam as directrizes "justas" do omnipotente Partido/Estado.
Combatemos abertamente as polícias judiciárias, públicas ou de partidos, miseráveis suportes desta sociedade, que somente visam a repressão do individuo.
 
ABAIXO O ESTADO, A POLÍCIA E O CAPITAL!
VIVA O COMUNISMO LIBERTÁRIO!
 
(1) - Nesta actividade tem-se destacado o furão capitão Antunes que está autorizado, a título excepcional, a caçar também durante o "defeso"!