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Memória Libertária

Documentos e Memórias da História do Movimento Libertário, Anarquista e Anarcosindicalista em Portugal

Documentos e Memórias da História do Movimento Libertário, Anarquista e Anarcosindicalista em Portugal

Memória Libertária

24
Mar23

Mário Domingues (Ilha do Príncipe, 3 de julho de 1899 — Costa da Caparica, 24 de março de 1977)


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Mário Domingues e Alexandre Vieira, em casa do primeiro (c.1954). (aqui)

Mário Domingues foi um escritor talentoso e prolixo, um jornalista muito activo e um militante libertário, desde muito cedo empenhado na denuncia do racismo que grassava na sociedade portuguesa e nas colónias ultramarinas, em que a cor da pele era uma das condições básicas para o sucesso social e económico. Jornalista do diário anarco-sindicalista, A Batalha, ficaram famosos alguns dos seus artigos e crónicas recentemente reunidos em livro (“Mário Domingues – A afirmação Negra e a Questão Colonial”, ensaio e selecção de José Luís Garcia, Edições Tinta da China, Lisboa 2022)

Mário Domingues nasceu na ilha do Príncipe, na roça Infante D. Henrique, propriedade da firma Casa Lima & Gama, com sede e escritório em Lisboa, filho de mãe angolana natural de Malanje, de nome Kongola ou Munga, que tinha ido para a ilha do Príncipe como contratada (à força) com quinze anos de idade, e de António Alexandre José Domingues, oriundo de famílias liberais de Lisboa. Com dezoito meses de idade foi enviado para Lisboa, sendo educado pela avó paterna.

Aos dezanove anos de idade aderiu ao ideário do anarquismo e iniciou colaboração no diário anarco-sindicalista A Batalha e, posteriormente, no jornal anarquista A Comuna, da cidade do Porto. Nesse período participou nas atividades de um grupo libertário que, entre outros, integrava Cristiano Lima e David de Carvalho. Fez parte da redação da revista Renovação (1925-1926) e colaborou na organização do congresso anarquista da União Anarquista Portuguesa (UAP).

Após o golpe fascista de 28 de Maio de 1926, e a proibição da imprensa anarquista e anarco-sindicalista,  dedicou-se ao jornalismo e tornou-se escritor profissional. Voltou-se para a história e para os romances policiais, escrevendo mais de uma centena de livros, com os mais diversos pseudónimos..

Sem nunca abandonar o ideário anarquista, deixou a militância activa durante largos anos. Apesar disso quando em 1975 surgiu o jornal “ Voz Anarquista”, escreveu uma carta ao seu diretor e amigo, Francisco Quintal, onde dizia : “Agora, mais do que nunca, é preciso proclamar bem alto que o anarquismo não é a desordem, a violência e o crime, como as forças reacionárias têm querido qualificá-lo. Urge desfazer essa lenda tenebrosa e demonstrar ao grande público, enganado por essas torpes mentiras, que o anarquista ama e defende o ideal supremo da ordem, exercida numa Sociedade edificada na Liberdade, na Fraternidade e na Justiça Social. À Voz Anarquista cabe essa sublime tarefa, recordando o exemplo de homens superiormente lúcidos como foram Proudhon, Eliseu Reclus, Sébastien Faure, Bakunine, Kropotkine, Neno Vasco, Pinto Quartin, Campos Lima, Cristiano Lima, Aurélio Quintanilha e outros propositadamente esquecidos, que abriram aos homens o Caminho da Liberdade.”

relacionado:

https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2022/01/11/a-liberdade-nao-se-concede-conquista-se-que-a-conquistem-os-negros-artigo-sobre-mario-domingues-no-publico-suplemento-ipsilon-de-30-3-2018/

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23
Fev23

"A Batalha": de diário sindicalista revolucionário à clandestinidade e, depois, à transformação em jornal de "expressão anarquista"


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A 23 de fevereiro de 1919 era publicado o 1º numero do jornal sindicalista revolucionário "A Batalha", tornando-se posteriormente o orgão da CGT, anarcosindicalista, publicando-se diariamente. Sofreu sucessivas proibições e uma forte repressão que levou ao seu encerramento em 26 de maio de 1927, depois da destruição das suas instalações.
Reapareceu em 1930, como semanário, sendo suspenso, proibido pelo governo, ao fim de 13 números.
Começou depois a publicar-se de forma clandestina até Dezembro de 1949.
Reaparece depois do 25 de Abril de 1974 (em Setembro desse ano) pela mão de um conjunto de antigos e novos militantes libertários, tendo Emidio Santana como director.
O investigador do movimento anarquista João Freire traçava assim, na revista A Ideia (outono de 2019) o percuso deste "jornal centenário & com muita história":
"(...) O movimento operário de então fugia dos partidos, dos caudilhos, das eleições e dos debates parlamentares “como o diabo da cruz”. O partido socialista de Fontana e de Antero não lograra enquadrar os operários e os assalariados do campo naquele modelo de social-democracia que vingara na Alemanha, na Grã-Bretanha ou na Bélgica, entre outros países mais adiantados. O “bolchevismo” ainda estava para nascer entre nós. E a República logo desiludira as massas laboriosas com o seu “decreto burla” igualando liberalmente a greve e o lock-out, com o espingardeamento dos conserveiros de Setúbal e a desatenção às reivindicações dos trabalhadores rurais alentejanos.
Para os militantes da causa operária, além da multiplicidade de órgãos de imprensa sindicais e de grupos anarquistas ou das actividades realizadas nas (ou a partir das) suas sedes, urgia a criação de um grande veículo informativo e propagandístico das suas insatisfações, realizações e objectivos. Já o haviam tentado em 1908 com o diário A Greve, mas que muito pouco durara. Após a queda da Monarquia, o tipógrafo Alexandre Vieira conseguira pôr de pé o semanário O Sindicalista, que se aguentou razoavelmente bem, apesar das perseguições a que foi sujeito, sobretudo a partir de 1913 com o governo de Afonso Costa.
Os anos da guerra foram difíceis para o movimento sindical mas, fazendo das fraquezas forças, foi a partir daí que a acção colectiva dos trabalhadores se reacendeu, as organizações se multiplicaram, os efectivos aderentes incharam e as perspectivas de uma nova época – de Revolução Social – insuflaram de ânimo muitos activistas, também embalados pelo exemplo vindo da Rússia, que aqui ia chegando.
Foi num momento único e particularmente convergente de vontades e ideias que, a 23 de Fevereiro de 1919, saiu à rua o primeiro número de 'A Batalha', subtitulado de «diário da manhã, porta-voz da organização operária portuguesa», sob a chefia redactorial do mesmo Alexandre Vieira e referido como «diário de grande tiragem e expansão».

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Jornal A Batalha, cabeçalho desenhado por Perfeito de Carvalho.

Ocorre lembrar que o desenho gráfico do cabeçalho de A Batalha foi desenhado pelo tipógrafo Francisco Perfeito de Carvalho, um patusco estroina que (segundo contam seus contemporâneos) tendo sido designado pela CGT para ir representá-la a um congresso da Internacional Sindical Vermelha, em Moscovo, gastou boa parte do dinheiro então recebido… em Paris! E quando no Congresso Operário de 1922, na Covilhã, deu conta
dessa missão mas os delegados o pressionavam para que apresentasse o devido relatório, em papel, ele terá respondido/perguntado se queriam que o escrevesse… em verso!?
Até Maio de 1927, produzir diariamente um jornal de 4 a 8 páginas em grande formato, com base no voluntariado de quase toda a redacção, de uma parte do quadro de compositores tipográficos e da integralidade dos seus correspondentes e difusores da província, foi uma obra homérica, pode dizer-se. Chegou a afirmar-se que A Batalha atingira o terceiro posto nacional em termos de tiragem, atrás d’ O Século e do Diário de Notícias. É duvidoso que assim tenha sido, à luz do que investigou Jacinto Baptista para o seu inesquecível livro 'Surgindo vem ao longe a nova aurora…' (Bertrand, 1977) e das memórias deixadas por Manuel Joaquim de Sousa em 'Últimos Tempos de Acção Sindical Livre e do Anarquismo Militante' (Antígona, 1989). Mas, em qualquer caso, foi sempre de vários milhares – talvez dez mil, em média, quando o habitual para os “semanários de ideias” era de uns três mil – o número de exemplares postos diariamente em circulação. E nenhum outro dos seus confrades da imprensa sofreu tão largas perseguições do poder político como A Batalha, através de suspensões administrativas e de outras manobras de intromissão governamental na liberdade de opinião republicana!...
A partir de 1923, o descanso semanal dos tipógrafos ao domingo era aproveitado para que, às segundas-feiras, saísse um «Suplemento Literário e Ilustrado», composto ao longo da semana precedente e – como as edições normais – impresso em casa comercial alheia situada na Rua da Atalaia, no mesmo bairro da Calçada do Combro onde (no imponente palácio dos condes de Castro Marim e Olhão, dito do Correio Geral, que foi tomado de aluguer) funcionava a redacção do jornal e uma parte significativa dos organismos sindicalistas então existentes na capital. Mas, para se ter uma ideia do espírito militante reinante, bastará dizer que um jornalista profissional como Pinto Quartim e que ali colaborava activamente nas horas de folga, escrevia directamente os seus artigos ao componedor, o aparelho manual onde então se fazia a composição tipográfica a chumbo, na ausência das modernas e semi-automáticas máquinas “Linotype”.
Diga-se, num parêntesis, que questões laborais deste tipo – porém, dentro das conflituosas relações entre patrões e assalariados – foram as que originaram em 1927 uma cena cómica e tumultuosa entre o conceituado tipógrafo Alexandre Vieira e o cultivado dr. Fidelino de Figueiredo, então director da Biblioteca Nacional, sita ao Chiado. A uma ofensa verbal deste último, respondeu o primeiro com dois murros, levando uma chapada de resposta que lhe despejou os óculos e feriu no nariz, tudo terminando com o balanceamento do tinteiro de bronze pousado na secretária à cabeça do chefe e a chegada em força do pessoal de segurança da instituição!
Mas continuemos. O sucesso editorial do diário foi tão grande que, em breve, a sua actividade se alargou à publicação de alguns livros e brochuras (por exemplo, a colecção A Novela Vermelha) e, em 1925, à edição quinzenal de uma boa revista-magazine, intitulada Renovação. Tanto este último título como o «Suplemento» podem hoje ser visitados on line (no site http://ric.slhi.pt/)
Com isto, a editorial d’A Batalha angariou a participação graciosa de várias boas plumas, artistas gráficos e intelectuais, já que ali o único colaborador remunerado era o director, por desempenhar a função em exclusividade, e que, por prurido anti-autoritário, era apenas chamado de redactor-principal. Mas personalidades significativas do meio cultural da época como Ferreira de Castro, Assis Esperança, Eduardo Frias, Sá Pereira, Nogueira de Brito, Bento Faria, Manuel Ribeiro, Carvalhão Duarte, Francine Benoit, Rocha Martins, Arnaldo Brazão, Tomás da Fonseca, Cristiano Lima, Jaime Brasil, Julião Quintinha, Ladislau Batalha, Mário Domingues, Adelaide Cabette, Adolfo Lima, Vitorino Nemésio, Roberto Nobre ou Stuart Carvalhaes deixaram o seu nome ali gravado, contribuindo para a qualidade e reputação destas produções. 
Como todas as obras colectivas do labor humano, nem tudo foi sempre isento de querelas e conflitos intestinos. Críticas pessoais e políticas subiram por vezes até às páginas do jornal. O confronto ideológico entre anarquistas e comunistas tornou-se estrutural. E, frequentemente, houve atritos e dificuldades entre a redacção do diário e os órgãos de topo da Confederação Geral do Trabalho, de que era o “órgão oficial” na imprensa.
Já sob a Ditadura Militar e na sequência do levantamento armado de Fevereiro de 1927, a polícia política (e parece que também energúmenos seus adjuntos) desembarca em força na redacção do jornal num dia de maio seguinte, prende quem lá está e destrói mobiliário e material tipográfico. O jornal é suspenso sine die e, legalmente, só reaparecerá fugazmente em 1930 como semanário e já sem a referência da sua ligação à CGT. Mas o militantismo anarco-sindicalista sempre se empenhou em prosseguir a sua publicação, de modo clandestino. Assim aconteceu em séries sucessivas em 1934, em 1935-37 e em 1947-49. E foram várias as tipografias secretas que funcionaram para o imprimir (no Pote d’Água, na Ramada, na Rua Carvalho Araújo, na Damasceno Monteiro, numa furna de Monsanto, etc.), sempre com camaradas tipógrafos a arriscarem a sua liberdade para que fosse feito, chegando a sua inventiva à construção de prelos em madeira (para o ruído não alertar a vizinhança) e ao requinte técnico de terem conseguido uma impressão a duas cores, naturalmente o preto e o vermelho.
Após o 25 de Abril de 1974, Emídio Santana, que já fora seu responsável nos anos 30, assume claramente a iniciativa da sua republicação legal e regular, que tem prosseguido até hoje (vai no nº 283 desta VI série, creio), embora com periodicidades oscilando entre o quinzenal e o trimestral, e tiragens modestas, semelhantes às de outros jornais de pequenas minorias políticas. Inicialmente assumiu-se formalmente, no frontispício, como «Jornal sindicalista revolucionário», que em Agosto de 1975 alterou para “Jornal anarco-sindicalista”, uma designação que deixou de ostentar em Agosto de 1983, mas sempre mantendo até hoje a menção de «Antigo órgão da CGT». Em Fevereiro de 1989, na retoma de publicação depois do falecimento do seu carismático director, passou a ser «Jornal de expressão anarquista».
Apesar da dimensão grupal-associativa que a existência d’A Batalha sempre implicou, vale a pena registar os nomes dos seus sucessivos responsáveis editoriais, cuja importância bem se compreende: Alexandre Vieira, Manuel Joaquim de Sousa, Manuel da Silva Campos, José da Silva Santos Arranha, Mário dos Santos Castelhano, Emídio Santana, José Maria Carvalho Ferreira, Moisés Silva Ramos, Maria Magos Jorge, João Santiago e António da Cruz. " (João Freire, A BATALHA UM JORNAL CENTENÁRIO & COM MUITA HISTÓRIA, A Ideia, Outono de 2019, pgs. 150-154)
 

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Último número de A Batalha clandestina, dezembro de 1949

Na mesma edição da revista A Ideia, é publicado um texto de Emidio Santana com o historial de A Batalha e das várias e sucessivas séries do jornal: 
 
"DA HISTÓRIA D’ A BATALHA, segundo Emídio Santana 
Existe no Arquivo Histórico-Social da BNP (AHS 5500 Ms 1496) um impresso dactilografado não assinado mas que se sabe ser da autoria do então director do jornal A Batalha, Emídio Santana, e com o seguinte título «A vida do jornal sindicalista “A Batalha” na fase de clandestinidade durante o período do salazarismo, 1927-1974». O texto está localizado de Lisboa e tem duas datas (12 e 17 de Setembro de 1980).
Trata-se duma breve síntese da vida do jornal, desde o seu nascimento em 1919 até à data do texto, Setembro de 1980, porventura para ser divulgada junto da imprensa, de agências noticiosas ou em folha autónoma.
Destacam-se nele as violências policiais a que o jornal foi sujeito e as dificuldades impostas por que passou desde os primeiros anos, ainda durante o período republicano, muito agravadas depois, durante o período da ditadura e do autodesignado Estado Novo. Para publicação, normalizou-se a citação do título das publicações referidas no texto, passando-as de redondo para itálico e de caixa alta para caixa baixa,
desfizeram-se alguns parágrafos para melhor agrupar o texto e corrigiram-se alguns erros evidentes (concordâncias, pontuação, falta dalguma palavra) de modo a tornar o texto mais acessível ao leitor de hoje. Um agradecimento é devido a Paulo Guimarães pela descoberta e selecção do documento.
"A Batalha, jornal diário e órgão da Confederação Geral do Trabalho começou a publicar-se em Lisboa a 23 de Fevereiro de 1919, sob a direcção de Alexandre Vieira, e continuou a publicarse diariamente, sem interrupção, apenas com acidentes de apreensão policial ou assaltos da mesma polícia à sua redacção, até ao n.º 2556, de 26 de Maio de 1927, data em que foi interditado pelo governo militar e as suas instalações destruídas pela polícia. Era ao tempo seu director Mário Castelhano e editor Silvino Noronha. No ano da sua suspensão publicaram-se quatro (4) números do Boletim Operário, editados pelo Comité Confederal da CGT.
Para suprir a sua falta e contornando a arbitrariedade do governo iniciou-se no Porto, a 29 de Setembro de 1929, o semanário A Vanguarda Operária, editado pela Delegação Confederal do Norte, embora já numa certa clandestinidade, como órgão dos Trabalhadores Portugueses,
tendo como director Zacarias de Lima e depois José Augusto de Castro, e como Administrador Francisco Ferrão.
Em Setembro de 1930 reaparece A Batalha como semanário, autorizado legalmente, assim identificada: II Série, como órgão da Comissão Interfederal de Defesa dos Trabalhadores, designação pública sob a qual se ocultava a CGT.
Editor: Alberto Dias e Administrador: Domingos Afonso Ribeiro. Redacção na Calçada Castelo Branco Saraiva, nº 42, e impresso na Rua da Atalaia, n.º 114, onde sempre fora impresso quando jornal diário. Começou a publicar-se em 13 de Setembro de 1930 e publicaram-se 13 números,
interrompendo a sua publicação por interdição do governo.
III Série, já clandestina. O n.º 1 tem a data de Abril de 1934 e publicaram-se dois (2) números devido às numerosas prisões na repressão do 18 de Janeiro. Estes números tinham o fim de reconstruir o movimento fortemente atingido pelas prisões que decorreram nesta fase.
IV Série, Ano XVI, 1935. Os números 1, 2 e 3 desta série, relativos a Março, Abril e Junho, foram compostos e impressos numa tipografia montada no subsolo duma cave na Rua Carvalho Araújo, e a máquina era construída parte em madeira e outra parte, a mecânica, em ferro, no processo das máquinas de impressão rotativas. Por precaução a tipografia foi transferida para a Venda Nova, à saída de Benfica. Mas o n.º 4, da mesma série, ano XVII, não saiu numerado e destinava-se a assinalar o 1.º de Maio desse ano, 1936, e foi composto de emergência numa oficina de Campo de Ourique do companheiro Avelino.
IV Série, Ano XVIII, 1937. Os números 5, 6 e 7, correspondentes a Janeiro, Fevereiro e Abril eram impressos a preto. Os números 8, 9, 10 e 11 correspondentes, respectivamente, a Maio, Junho, Julho e Setembro saíram impressos a preto e o cabeçalho ou «en-têtes» a vermelho. Publicava-se com 4 páginas e no formato de 40 X 30 cm. Esta série foi composta e impressa numa furna de Monsanto com entrada pela Rua Feliciano de Sousa, a Alcântara, e acompanhou o período agudo da guerra de Espanha, o período de maior repressão fascista.
V Série, Ano XXIX, 1947. Publicaram-se 10 números até Agosto deste ano. Mesma série, Ano XXX, 1948. Os números 11 e 12 correspondem a Novembro e Dezembro deste ano. Mesma série, Ano XXXI, 1949. Os números 13, 14 e 15 correspondem a Janeiro, Fevereiro e Abril. Mesma série. Ano XXXI, 1949. Publicaram-se os números 16, 17, 18, 19, 20 e 21, respectivamente de Maio, Junho, Julho, Agosto, Novembro e Dezembro deste ano.
Durante a publicação de A Batalha como jornal diário registaram-se várias perseguições, atentados à sua liberdade de publicação e variadas violências registadas numa elementar estatística:
Prisão de toda a redacção, em 1919, 1920 e 1921... 3 vezes
Encerramento da redacção e tipografia, nos mesmos anos...3 vezes
Não se publicou por o seu quadro tipográfico e redactorial se ter solidarizado com greves de protesto... 2 vezes
Submetida ao regime de censura prévia... 7 vezes
Apreensão pela polícia...11 vezes
Atrasos de saída por acção policial... 4 vezes
Assaltos da polícia à redacção... 7 vezes
Suspensa por acção policial... 5 vezes
Buscas à sede... 3 vezes
Processo em tribunal... 2 vezes
Condenação em tribunal... 1 vez
A BATALHA APÓS O 25 DE ABRIL
Em Setembro de 1974, reaparece como quinzenário. Indicada como Ano 1, Quarta Série, n.º 1. Esta série corresponde à VI Série, posteriormente corrigida e [presentemente] no ano VI correspondente a esta fase. Publica-se no formato normal dos jornais. Normalmente a 4 páginas, com o cabeçalho tradicional, a vermelho. É director Emídio Santana e é redigido por um colectivo redactorial de vários componentes. Presentemente está no n.º 65." (Manuscrito de Emídio Santana, A Ideia, Outono de 2019, pgs. 155-158)
 
19
Out21

18 DE JANEIRO DE 1934: DEPOIMENTO COLECTIVO DE DIVERSOS MILITANTES CONFEDERAIS LIGADOS À SUA ORGANIZAÇÃO


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Em mais um aniversário do levantamento dos trabalhadores portugueses contra o fascismo, a 18 de Janeiro de 1934, organizado pela CGT anarcosindicalista e por outros elementos ligados ao movimento sindical, reproduzimos um texto da autoria de um grupo de militantes confederais com responsabilidades no movimento e que, na sua maioria, foram por isso deportados para o Tarrafal. O texto foi escrito e publicado já depois do 25 de Abril de 1974, numa altura em que o PCP tentou recuperar para si a organização deste movimento que teve dimensão nacional, mas em que a insurreição operária apenas teve visibilidade nalguns locais mais circunscritos: Silves, Almada, Sines, Marinha Grande, etc.. (colectivo libertário de évora)

Como a verdade ressalta

Com a prisão, julgamentos e deportação para o Tarrafal dos elementos que participaram no 18 de Janeiro e o período de intensa repressão que se seguiu e veio a agravar-se com a eclosão da guerra civil de Espanha, o acontecimento cobriu-se de esquecimento que se prolongou por quarenta anos.

Na altura o 18 de Janeiro veio a público apenas na versão dos comunicados oficiais e com os ataques da Imprensa. A verdade dos acontecimentos, dos seus objectivos e da sua organização e preparação ficou oculta.

Algum tempo mais tarde, de vez em quando, o partido comunista foi insinuando as suas versões do 18 de Janeiro, apropriando-as com a sua técnica stalinista de história controlada e pré-fabricada ao modo conveniente, à formação da auréola de «partido da resistência» que foram criando, até muito especialmente coma ajuda da propaganda reaccionária, do seu «papão comunista», ou na costumada expressão de Salazar insistindo no «perigo do comunismo internacional».

Necessariamente, para criar credibilidade e como base técnica da sua habitual propaganda, teriam de eliminar, denegrindo e insultando com o seu indispensável apodo de traidores, os homens e as organizações não comunistas que na verdade organizaram e sustentaram a luta, cujos méritos e feitos ainda não foram devidamente apreciados.

Bento Gonçalves, que nessa altura era o secretário-geral do partido comunista, construiu esse processo de adulteração histórica, anos depois e já na deportação, escrevendo um folheto intitulado «Duas Palavras», partindo dum ataque demolidor dos objectivos e acções do movimento, mistificando os factos e disfarçando uma acção reformista por certo calculada, embora numa aparência perfeitamente infantil, terminando por demegrir o movimento classificando-o de «pura anarqueirada».

O partido comunista sob a sua chefia opunha-se ao 18 de Janeiro como movimento de greve geral revolucionária, como acção personalizada da organização sindical, porque afinal queriam converter todas as manifestações ao domínio do partido. Todavia, nessa altura, o partido não estava apto a exercer esse liderismo pois atravessava uma crise interna bastante profunda e confessa.

É Bento Gonçalves que nos diz:«No Partido o ambiente geral era de fuga para as acções isoladas. A maior parte dos camaradas de base do Partido, aliás cheios de denodo revolucionário e cuja sinceridade proletariana ninguém ainda pôs em dúvida, eram novos e desprovidos da mínima experiência sobre a actividade sindical e sobre os métodos sãos da táctica do movimento operário. No Comité Regional de Lisboa se criou a tendência geral para a acção directa. Em quase todos os outros sítios a situação era idêntica (…) E entretanto era absolutamente necessário vir a público para resolver a questão no interior do Partido, todas em quase todos os escalões pro essa duplicidade de táctica».

Ao escrever as «Duas Palavras» Bento Gonçalves teria de fazer derivar o imperativo da luta para hipóteses diferentes da greve geral que cobrissem a debilidade que estavam sofrendo, mas não só, para aproveitarem uma passagem suave a um sindicalismo corporativista no qual se instalassem sem dificuldades introduzindo a influência do partido. E define a posição: «Colocámo-nos no terreno da utilização das condições legais. Qualquer forma de luta ilegal ainda aí nem sequer era frisada, nem mesmo subentendidamente. Dizíamos, em substância, que os sindicatos ainda se regiam pelo velho alvará (1). Era portanto necessário lutar sobre essa base. Convocar reuniões de assembleias gerais com o fim de levar os trabalhadores a votar contra o Estatuto do Trabalho Nacional. O que era preciso patentear bem alto e bem publicamente que os trabalhadores estavam contra a fascização dos Sindicatos, que continuavam a dispor do direito de organização independente»`.

Até ao 18 de Janeiro ninguém teve a idiotia de propor a realização de assembleias para impedir a fascização dos sindicatos; a ideia é divulgada mais tarde para dar a justificação da tal  utilização das condições legais. Tal intenção seria simplesmente inexequível, porque seria para a polícia a melhor forma de poder identificar quem se opunha à legislação fascista e de poder conhecer a movimentação em preparação.

Ao partido interessava a esterilização dos sindicatos enraizados nas tradições de luta dos trabalhadores e experimentados na sua autonomia em relação ao Estado, aos partidos e ao jogo parlamentarista. O estrangulamento e a subalternização dos sindicatos permitiria, como veio a permitir depois do 25 de Abril, que qualquer partido marxista ou similar pudesse liderar as classes trabalhadoras e integrá-las no sistema político e económico.

Noutro passo podemos ainda ler: “Dum modo geral, desde Setembro de 1933 até à data da eclosão do movimento, os militantes sindicais cristalizam-se em volta da preparação do movimento grevístico e sedicioso, mandando ao diabo a questão das assembleias e das formas de protesto público de massas contra as medidas eminentes».

Conclui-se que na cúpula do partido se optava por uma forma de protesto simbólica abrindo passagem à adaptação sindical. E prossegue: «Entre os trabalhadores do Estado parece que só o Sindicato do Pessoal do Arsenal de Marinha efectuou uma assembleia, aliás largamente assistida de reprovação do ENT. Porém, mesmo neste sindicato, ainda nos recordamos do trabalho e das imposições a militantes que foi necessário fazer para conseguir a convocação da tal assembleia.»

Bento Gonçalves foi operário do Arsenal da Marinha; é estranho que diga parece que só o Sindicato do Pessoal da Marinha (o sublinhado é nosso) e por outro lado recorde das imposições a militantes (o sublinhado é nosso) para conseguir a convocação. O que não é de crer que a assembleia fosse para reprovar o ENT. A polícia estava pronta para reprimir manifestações desse género, e o pessoal não arrostaria a desencadear ordens cominatórias da direcção militar do arsenal. Tentaria a direcção do sindicato evitar que lhe fosse aplicada a supressão do direito de sindicalização prevista para os funcionários do Estado?

Deduz-se das declarações de Bento Gonçalves:

a) Que o partido estava na altura desorganizado e que nas bases se optava de preferência por uma acção revolucionária que a chfia condenava;

b) Que a cúpula do partido optava por uma acção legal que seria, naturalmente, pela aceitação da estatização dos sindicatos onde os quadros do partido se infiltrariam, facilmente acomodados ao estilo burocrático e centralista das direcções sindicais;

c) Que o partido estava em oposição a toda e qualquer acção revolucionária, preparando-se para a infiltração.

Confirma o que noutro passo escreveu: “Sobre a base desta dupla apreciação nós trazíamos todas as condições para empreender uma viragem de harmonia com o VII Congresso (2): a) os efectivos dos sindicatos ilegais deviam ser incorporados no partido; b)o centro do trabalho sindical devia deslocar-se para dentro dos sindicatos nacionais c) a unidade sindical (…) sobre a base da utilização de todas as possibilidades legais, interiores e exteriores ao sindicato nacional».

Confrontando as declarações de José Gregório num relatório tantas vezes evocado pelas várias seitas marxistas com as declarações de Bento Gonçalves, torna-se evidente a contradição.

Escreve José Gregório: «O Partido nomeou um comité para preparar e dirigir o movimento debaixo da seguinte orientação: Para que os operários pudessem alcançar a satisfação das suas aspirações precisavam de se apoderar das armas que estavam na posse duma força da GNR (…).»

O que vigorava no partido. a acção legalista ou a acção revolucionária? Como é que o partido nuns lados optava por uma acção de infiltração e na Marinha Grande o partido nomeava um comité para dirigir uma acção que depois viria a ser considerada putschista?

Se o partido, segundo a afirmação de José Gregório, nomeou um comité para preparar e dirigir o movimento, pode concluir-se que o 18 de Janeiro foi exclusivamente da sua iniciativa? Mas Bento Gonçalves, secretário-geral do partido, nessa altura, escreveu (3): «Esta questão (o 18 de Janeiro) não pode dizer-se que tenha entre nós uma análise completamente virgem. No «Avante!», logo após a eclosão deste movimento, conduzimos uma crítica ao caminho terrorista que, em vários sítios (por certo incluindo a Marinha Grande), se constatou nessa jornada e à táctica dominante, por vezes, no movimento sindical português que consistia em elaborar as acções muito para além das condições concretas e do estado das forças da organização operária.

«Se em vários aspectos, essa crítica foi deficiente, isso deve-se, em primeiro lugar, à deficiência dos nossos meios de informação. Por exemplo, o caso da Marinha Grande foi apresentado como um «modelo» de boa táctica. Só em Angra viemos a verificar que o feito ali, também, nem por isso tinha sido menos putchista.”

Não se compreende que tendo o partido nomeado o comité do movimento na Marinha Grande, segundo José Gregório, Bento Gonçalves venha considerar o movimento terrorista, negando-lhe a qualidade de «modelo» de boa táctica, e, o que é pior ainda, só se tivesse dado conta disso depois, já em Angra, e por deficiência de meios de informação. Esta deficiência só se pode aceitar em duas condições: ou estar afastado dos acontecimentos ou se se tivesse dado o caso de nomear o comité e tê-lo deixado desamparado.

De resto Bento Gonçalves acentua que acções daquele género (o 18 de Janeiro) de caminho terrorista era táctica dominante, por vezes, no movimento sindical português, assinalando deste modo qual era na verdade a autêntica origem do movimento e que o partido, pela boca autorizada de Bento Gonçalves, recusava e condenava.

José Gregório, presidente do Sindicato dos Vidreiros e pelo que entrou na preparação e condução do movimento na Marinha Grande, veio depois com o seu relatório dar uma contribuição falsa para a história pré-fabricada atribuindo ao partido o que fora iniciativa do sindicato. E é Bento Gonçalves que o desmente, mas por outro lado o pode acusar de pior.

Ouçamos ainda Bento Gonçalves, referindo-se à Marinha Grande: «Não estamos em presença duma acção do proletariado local, dum movimento grevista de protesto contra o Estatuto do Trabalho Nacional, que as massas alargam, em virtude da sua efervescência revolucionária, mas sim ante uma acção estruturalmente de vanguarda de membros do Partido e de comunistas sem partido, convencidos de que uma greve geral eclodiria em todo o país, à qual se junatria o reviralho» (o sublinhado é nosso).

Se José Gregório actuou como membro do partido, a sua acção, segundo Bento Gonçalves, foi uma acção estruturalmente de vanguarda e à espera do «reviralho», e não escapou à acusação de «anarqueirada».

Se Bento desmente o Gregório, este desmente ainda aquele. Se o movimento foi organizado pelo partido, segundo José Gregório, o Bento reconhece a origem sindical do movimento, que a greve geral preconizada pela CGT fora aceite, contrariamente ao que pensava o partido, que preconizava um «movimento de massas» através de assembleias gerais e pela utilização das condições legais, isto é, pela disfarçada aceitação dos «sindicatos nacionais» para neles se introduzirem, atribuindo a derrota do 18 de Janeiro ao «provincianismo anarco-sindicalista».

Todavia, apesar destas contradições, existe um nexo notável que interessa analisar.

«Duas Palavras» de Bento Gonçalves foi escrito em 1941 quando se encontrava deportado no Tarrafal, um ano antes da sua morte; o relatório Alberto, de José Gregório, está datado de Agosto de 1955.

Em 1941 tinham decorrido já 15 anos de regime ditatorial, a panóplia do partido estava vazia de qualquer acção contra o regime, pois até o 29 de Fevereiro de 1932, de que  nunca se fala, se cifrou num fracasso como organização e dos seus objectivos, pois uma das suas reivindicações, o subsídio de desemprego, foi aproveitada pelo governo para impor um desconto de 2% que nem o 25 de Abril nem a Intersindical contestaram. Era necessário adaptar a história, distorcer a verdade do 18 de Janeiro e pregá-los com alfinetes na panóplia vazia. O seu autor lançava assim as bases do seu culto de personalidade.

Em 1955, José Gregório, depois de ter em 1942 aparelhado com Cunhal no secretariado do partido, teria de ajudar a mistificar a história do 18 de Janeiro, aproveitando o seu título de presidente do Sindicato dos Vidreiros nessa altura para depôr com «autoridade».

Como toda a mistificação deixa sempre qualquer coisa de fora, que pode vir desmentir, assistiremos agora a José Gregório desmentir-se a si próprio.

No relatório «Alberto», José Gregório afirmou que «o partido nomeou um comité para preparar e dirigir o movimento…» faltando todavia esclarecer se isso foi a nível local ou nacional.

No mesmo relatório, referindo-se à organização e actuação do partido, faz certas análises das experiências recolhidas e tira algumas conclusões.

Analisemo-las tal como nos diz José Gregório.

«1º- A organização do Partido que foi montada em 1932 só passou a funcionar de um modo um pouco mais regular em princípios de 1933. Na prática não havia mais que um núcleo de camaradas a que se poderia dar o nome de organização local. Nas fábricas não havia organismos. Por outro lado o contacto com a direcção do Partido fazia-se muito raramente. Nestas condições os camaradas do Partido não reuniam numa base de Partido, não actuavam dentro das normas de disciplina de Partido, não se sentiam obrigados a prestar-lhe contas da sua acção. Por outro lado não era utilizada a  crítica nem a autocrítica. Criou-se o hábito de ver as coisas não sob o ponto de vista do Partido, mas sim na base individual, na base da legalidade sindical, crendo-se não poucas vezes na burocracia sindicalista (4). Tudo isso se tornou muito inconveniente para a formação e desenvolvimento dos quadros do Partido. Tudo isso contribuiu para que não fossem recrutados para o Partido bons operários de vanguarda homens e mulheres cheios de qualidade e de possibilidades para virem a ser um precioso material do Partido».

Com este quadro do partido como crer que ele fosse o organizador do 18 de Janeiro, que teve a extensão que teve. Quase temos vontade de dizer: que grande «anarquia» havia então dentro do Partido!

Esta desconformidade entre a organização interna do partido na ocasião e as proporções do 18 de Janeiro, confirma que este decorreu à margem daquele, embora elementos comunistas tivessem actuado, mas por via sindical. De resto, no mesmo relatório e ao terminar, José Gregório confessa: «O movimento de 18 de Janeiro também teve a participação dos anarquistas locais e de operários que influenciavam (certamente, dizemos nós, não orientados pelo partido). Deste modo se pode afirmar haver nesta data a  mesma característica de unidade que sempre existiu na nossa organização sindical desde 1931 até então». (O sublinhado é nosso).

1ª conclusão: «Ao elaborar o plano de acção para o 18 de Janeiro o Partido e o Comité Revolucionário, deixaram-se levar pela ideia feita de que a vitória era certa, que o fascismo seria derrubado sucedendo-lhe um regime de tipo proletário. Partindo-se deste princípio não se considerou a necessidade de encarar uma retirada de modo ordenado. Esta orientação é errada de nem sequer admitir revezes parciais…».

Deve prestar-se justiça ao José Gregório. Se ele se apropriou da organização do 18 de Janeiro para o Partido é justo que reivindique para ele os insucessos e os erros. A mesma coerência não a teve Bento Gonçalves quando apelidou o 18 de Janeiro de «pura anarqueirada».Não sabemos se José Gregório reivindicou para si e para o seu partido o insulto soez de Bento Gonçalves que por essa altura deportado no Tarrafal, lá mesmo no campo de concentração se prestou a fundir em bronze dois escudos evocativos da passagem do Carmona, manequim do regime fascista, por Cabo Verde na sua viagem a África, e ao deflagrar a guerra, ele em pessoa, foi apresentar ao director do acampamento, o sinistro capitão João Silva, a «colaboração do PC na defesa da pátria contra o imperialismo».

Conhecemos sempre o partido comunista como o modelo e o manual do perfeito oportunismo, do impudor das afirmações e das acusações torpes, além do exercício do mais completo reformismo embora besuntado de revolucionarismo, mas também o reconhecemos camaleónico, dizendo hoje o que ontem terá negado.

Se a CGT e os anarco-sindicalistas «traíram» o 18 de Janeiro, como também afirmam os trabalhadores, porquê o seu órgão «O Avante» de Maio de 1937, portanto 3 anos depois, com o Bento Gonçalves vivo e à frente do partido, publicava uma notícia, aliás falsa e simplesmente arquitectada, na primeira página e intitulada «Viva a Frente Única Proletária» aplaudindo a «unidade com a CGT»?

Começa a notícia assim redigida: «Pede-nos a CIS a publicação do documento que a seguir inserimos.»

«Fazemo-lo com a máxima alegria por este documento dar notícia de um acontecimento importante da vida do movimento operário português. Por ele se vê que a Frente Única Proletária está em via da sua imediata realização». E a CIS (a célebre Comissão Intersindical) dá a seguir a notícia de a CGT ter acedido às suas propostas para a constituição de um Comité de Frente Única Proletária, acrescentando: «No que se refere aos problemas de orientação da CGT nós pensamos que só a neutralidade em questões de tendência pode permitir a Unificação».

«Uma CGT comunista não contaria, com certeza com o apoio dos camaradas anarquistas, da mesma maneira uma CGT anarquista dificilmente encontraria apoio nos partidários da Ditadura do Proletariado” (5)

Além desta notícia ser totalmente desprovida de qualquer resquício de verdade é de pôr em evidência o impudor de afirmar a «máxima alegria» em quererem fazer uma união com aqueles que acusaram de traidores, de admitirem em emparceirar com os que têm denegrido.

Nunca a CGT teve qualquer contacto com o partido comunista e com a Comissão Inter-Sindical, apenas estabeleceu os contactos para o 18 de Janeiro cuja experiência e resultados deixámos já descritos.

O comportamento da CIS, toda a campanha posterior, tornaram evidente que não é possível qualquer colaboração com os comunistas como partido ou como qualquer agrupação, mesmo sindical, em que preponderem. O amoralismo dos seus processos, o desrespeito pelos compromissos assumidos produz-se logo que lhes seja oportuno.

A experiência do 18 de Janeiro não poderia voltar a permitir qualquer acercamento. Apertam a mão que não podem cortar e os acordos que estabelecerem hão-de resultar em seu benefício. Se não colherem o resultado total acusarão os outros de traidores.

(“Como a verdade ressalta”, capítulo do livro “O 18 de Janeiro de 1934 e alguns antecedentes”, um depoimento colectivo de Acácio Tomaz de Aquino, Américo Martins, Custódio da Costa, José Francisco, Marcelino Mesquista e Emídio Santana, que coligiu. Regra do Jogo, 1978.)

Notas

(1) O itálico é nosso para assinalar a declarada posição reformista. Não se compreende a relação entendida entre o alvará e a forma de actuação dos sindicatos de então. O alvará era o certificado do governo civil que reconhecia a legalidade dos sindicatos mas que não tinha qualquer relação com a sua orgânica e orientação.

(2) Ver «SEARA NOVA» nº 1513 – Março 1975, Movimento das Ideias; de Fernando Guerreiro.

(3) «Duas Palavras», de que vimos fazendo citações. O sublinhado é nosso.

(4) É surpreendente que, sendo José Gregório Presidente do Sindicato, ele não se queira responsabilizar pela «burocracia sindicalista».

(5) O Avante, Série II – 35 da 3ª semana de Maio de 1937

aqui: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2013/01/17/18-de-janeiro-de-1934-depoimento-colectivo-de-diversos-militantes-confederais-ligados-a-sua-organizacao/

19
Out21

18 DE JANEIRO DE 1934 ASSINALADO NO PORTO 79 ANOS DEPOIS


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Alguns textos: Irene Pimentel: 18 de Janeiro de 1934

 Paulo Guimarães:  Cercados e Perseguidos: a Confederação Geral do  Trabalho (CGT) nos últimos anos do sindicalismo  revolucionário em Portugal (1926-1938)

 Maria de Fátima Patriarca: O «18 de Janeiro»: uma proposta de releitura

18Forças de infantaria ocupam a Marinha Grande

11 (1)Largo da Marinha Grande ocupado pelas  forças repressivas

12 (2)Alguns dos operários detidos na Marinha Grande

embarquePresos  do 18 de Janeiro, a caminho da prisão em Angra do Heroísmo (a bordo do Carvalho Araújo).

CarvAraujoEmbarque dos insurrectos do 18 de Janeiro (entre os quais muitos anarquistas e anarco-sindicalistas, nomeadamente o coordenador da CGT e director da “Batalha”, Mário Castelhano) com  destino aos Açores (Angra do Heroísmo)

familiaFamilias dos presos da Marinha Grande numa manifestação junto ao Governo Civil de Leiria, em 1935, pedindo a sua libertação

aqui: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2013/01/14/movimento-de-18-de-janeiro-de-1934-assinalado-no-porto-esta-sexta-feira/

 

19
Out21

ANIVERSÁRIO DOS 91 ANOS DA AIT ASSINALADO NO PORTO A 5 E 6 DE JANEIRO DE 2013


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Os 91 anos da Associação internacional de Trabalhadores (AIT) vão ser assinalado no Porto este fim de semana. A iniciativa é do Sindicato de Oficios Vários, da Secção Portuguesa da AIT.

No sábado, dia 5 de Janeiro  haverá na Casa Viva , às 15h. uma “Perfomance Tecnorevolucionária” e no domingo, 6 de Janeiro, no Terra Viva, às 15h. – “Palestra: AIT, história e actualidade”.