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Memória Libertária

Documentos e Memórias da História do Movimento Libertário, Anarquista e Anarcosindicalista em Portugal

Documentos e Memórias da História do Movimento Libertário, Anarquista e Anarcosindicalista em Portugal

Memória Libertária

21
Jun24

Há cem anos em Silves. Os disparos da GNR contra a população desarmada


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Há cem anos em Silves - depois de uma greve de mais de mês e meio dos corticeiros, que tiveram que mandar os filhos para outras localidades, entregues aos cuidados de outros operários, quando celebravam o regresso dos seus familiares - a multidão foi dispersada a tiro pela GNR. Houve um morto, o corticeiro Francisco Gonçalves, pai de 6 filhos, e mais de uma dezena de feridos.
"A Batalha" o grande diário operário, porta-voz da CGT anarco-sindicalista, que integrava o sindicato dos corticeiros de Silves, publica, dois dias depois, em manchete a toda a primeira página: "República atascada em sangue!
Um crime mais bárbaro, mais repugnante e ignomioso do que o dos Olivais!
Na cidade de Silves, a guarda republicana, comandada pelo tenente Vinhas, recebe a tiro os filhos dos grevistas corticeiros que regressavam aos seus lares, assassinando um operário, pai de seis filhos, ferindo muitos operários e crianças e, entre elas, uma no rosto e outra numa orelha!
Eis o trágico resultado da política de incitamento ao crime feita pelo ministro do interior.
Sr. Ministro: mande condecorar os assassinos!"
Era o tempo de um sindicalismo de combate, revolucionário, que nada tem a ver com as atuais burocracias sindicais, meras correias de transmissão dos partidos políticos (nomeadamente do PCP) que se aproveitam dos sindicatos para dar trabalho à sua máfia política e os sujeitar às estratégias partidárias - e que, por isso, pouco mais são do que cadáveres adiados.
Fica a 1º página de "A Batalha", de 24 de junho de 1924, com a verdadeira crónica de mais um episódio negro da República contra o movimento operário organizado na CGT anarcosindicalista e que fez de Silves uma das localidades no Algarve e no país com maior peso na luta contra o fascismo.
 
24
Mar23

Mário Domingues (Ilha do Príncipe, 3 de julho de 1899 — Costa da Caparica, 24 de março de 1977)


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Mário Domingues e Alexandre Vieira, em casa do primeiro (c.1954). (aqui)

Mário Domingues foi um escritor talentoso e prolixo, um jornalista muito activo e um militante libertário, desde muito cedo empenhado na denuncia do racismo que grassava na sociedade portuguesa e nas colónias ultramarinas, em que a cor da pele era uma das condições básicas para o sucesso social e económico. Jornalista do diário anarco-sindicalista, A Batalha, ficaram famosos alguns dos seus artigos e crónicas recentemente reunidos em livro (“Mário Domingues – A afirmação Negra e a Questão Colonial”, ensaio e selecção de José Luís Garcia, Edições Tinta da China, Lisboa 2022)

Mário Domingues nasceu na ilha do Príncipe, na roça Infante D. Henrique, propriedade da firma Casa Lima & Gama, com sede e escritório em Lisboa, filho de mãe angolana natural de Malanje, de nome Kongola ou Munga, que tinha ido para a ilha do Príncipe como contratada (à força) com quinze anos de idade, e de António Alexandre José Domingues, oriundo de famílias liberais de Lisboa. Com dezoito meses de idade foi enviado para Lisboa, sendo educado pela avó paterna.

Aos dezanove anos de idade aderiu ao ideário do anarquismo e iniciou colaboração no diário anarco-sindicalista A Batalha e, posteriormente, no jornal anarquista A Comuna, da cidade do Porto. Nesse período participou nas atividades de um grupo libertário que, entre outros, integrava Cristiano Lima e David de Carvalho. Fez parte da redação da revista Renovação (1925-1926) e colaborou na organização do congresso anarquista da União Anarquista Portuguesa (UAP).

Após o golpe fascista de 28 de Maio de 1926, e a proibição da imprensa anarquista e anarco-sindicalista,  dedicou-se ao jornalismo e tornou-se escritor profissional. Voltou-se para a história e para os romances policiais, escrevendo mais de uma centena de livros, com os mais diversos pseudónimos..

Sem nunca abandonar o ideário anarquista, deixou a militância activa durante largos anos. Apesar disso quando em 1975 surgiu o jornal “ Voz Anarquista”, escreveu uma carta ao seu diretor e amigo, Francisco Quintal, onde dizia : “Agora, mais do que nunca, é preciso proclamar bem alto que o anarquismo não é a desordem, a violência e o crime, como as forças reacionárias têm querido qualificá-lo. Urge desfazer essa lenda tenebrosa e demonstrar ao grande público, enganado por essas torpes mentiras, que o anarquista ama e defende o ideal supremo da ordem, exercida numa Sociedade edificada na Liberdade, na Fraternidade e na Justiça Social. À Voz Anarquista cabe essa sublime tarefa, recordando o exemplo de homens superiormente lúcidos como foram Proudhon, Eliseu Reclus, Sébastien Faure, Bakunine, Kropotkine, Neno Vasco, Pinto Quartin, Campos Lima, Cristiano Lima, Aurélio Quintanilha e outros propositadamente esquecidos, que abriram aos homens o Caminho da Liberdade.”

relacionado:

https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2022/01/11/a-liberdade-nao-se-concede-conquista-se-que-a-conquistem-os-negros-artigo-sobre-mario-domingues-no-publico-suplemento-ipsilon-de-30-3-2018/

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07
Mar23

(memória libertária) O I Forum Ibérico “Sem Fronteiras nem Bandeiras”, na Guarda, e a tentativa de criação da Associação de Classe Interprofissional


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Num momento em que tanto se fala de sindicalismo alternativo, combativo, de base, convém referir uma das iniciativas que pretenderam, no campo libertário,  furar o cerco que o sindicalismo partidarizado, hierárquico e reformista criou em torno do movimento dos trabalhadores.

Apesar do anarcosindicalismo, após o 25 de Abril, nunca se ter conseguido constituir como corrente alternativa, em Portugal, aos sindicatos oficiais, controlados pelo PCP, pelo PS ou pelo PSD, por várias vezes existiram tentativas para criar um movimento social de acção directa e um sindicalismo de base. Nas primeiras duas décadas do século XXI, foram criadas a secção portuguesa da AIT, formada por um pequeno núcleo de militantes, com especial incidência em Lisboa e no Porto,  e um colectivo, mais centrado nas questões da educação, e que editou um pequeno boletim intitulado “Luta Social”, mantendo contactos com organizações de base assemblearia e libertária de vários países europeus. 

Alguns dos seus membros integraram a secção portuguesa da Federação Europeia de Sindicalismo Alternativo – Educação, que reunia federações de ramo da CGT-Espanha (CGT-Enseñanza), UNICOBAS de Itália (UNICOBAS L'Altra Scuola), os sindicatos franceses SUD (Solidaires-Unitaires-Démocratiques) da Educação de Paris e de Grenoble; o sindicato SIP e o sindicato de estudantes (SISA), da Suiça Italiana, bem como outros colectivos (na Eslovénia, em Portugal, em Itália, em França).

A FESAL-E é apresentada em Abril de 2004 na sede de A Batalha  e, posteriormente, realizam-se várias reuniões internacionais desta organização em Lisboa.

A mais importante terá sido  na Guarda, em 2006, nos dias 4 e 5 de Março, com a realização do I FORUM IBÉRICO “SEM FRONTEIRAS SEM BANDEIRAS”, organizado pelo Núcleo Português da FESAL-E, com a colaboração do Coordenador Europeu da FESAL-E; e com a participação de colectivos da CGT-E; da CNT-AIT ; de “Ecologistas en Acción” e da Associação Ambientalista “Quercus”, conforme se pode ler nos materiais que publicitaram o encontro.

Há também uma descrição da forma como a reunião decorreu, feita por Davide Rossi, responsável das relações internacionais de UNICOBAS Itália, e publicada no nº 13 do boletim "Luta Social". 

O colectivo  era integrado por diversos companheiros de diversos pontos do pais e em Julho de 2006, realizou-se uma assembleia geral da secção portuguesa da FESAL-E em que foi criado um sindicato denominado Associação de Classe Interprofissional, que passou a ter o boletim “Luta Social”, como órgão informativo. Nesta mesma reunião foram aprovados os estatutos, regulamento interno e eleitos os corpos gerentes. (aqui

No entanto, o processo de legalização posterior foi sabotado pelo próprio Estado: mal a associação foi legalizada, o ministério público recorreu, obrigando à sua dissolução, supostamente pelo referido sindicato violar a lei, nos seus próprios estatutos, que haviam sido registados meses antes sem quaisquer problemas. (aqui)

A militância destes companheiros manteve-se durante alguns anos, tendo mesmo dado origem aos Cadernos de "Luta Social", temáticos, de que terão saído quatro números, extinguindo-se por volta de 2009.

Relacionado: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2016/09/11/memoria-libertaria-ac-interpro-a-tentativa-de-construcao-de-uma-associacao-de-base-anarco-sindicalista-em-portugal-no-inicio-do-seculo-xxi/

Boletim Luta Social (até ao 15) : https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/imprensa-libertaria/

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23
Fev23

"A Batalha": de diário sindicalista revolucionário à clandestinidade e, depois, à transformação em jornal de "expressão anarquista"


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A 23 de fevereiro de 1919 era publicado o 1º numero do jornal sindicalista revolucionário "A Batalha", tornando-se posteriormente o orgão da CGT, anarcosindicalista, publicando-se diariamente. Sofreu sucessivas proibições e uma forte repressão que levou ao seu encerramento em 26 de maio de 1927, depois da destruição das suas instalações.
Reapareceu em 1930, como semanário, sendo suspenso, proibido pelo governo, ao fim de 13 números.
Começou depois a publicar-se de forma clandestina até Dezembro de 1949.
Reaparece depois do 25 de Abril de 1974 (em Setembro desse ano) pela mão de um conjunto de antigos e novos militantes libertários, tendo Emidio Santana como director.
O investigador do movimento anarquista João Freire traçava assim, na revista A Ideia (outono de 2019) o percuso deste "jornal centenário & com muita história":
"(...) O movimento operário de então fugia dos partidos, dos caudilhos, das eleições e dos debates parlamentares “como o diabo da cruz”. O partido socialista de Fontana e de Antero não lograra enquadrar os operários e os assalariados do campo naquele modelo de social-democracia que vingara na Alemanha, na Grã-Bretanha ou na Bélgica, entre outros países mais adiantados. O “bolchevismo” ainda estava para nascer entre nós. E a República logo desiludira as massas laboriosas com o seu “decreto burla” igualando liberalmente a greve e o lock-out, com o espingardeamento dos conserveiros de Setúbal e a desatenção às reivindicações dos trabalhadores rurais alentejanos.
Para os militantes da causa operária, além da multiplicidade de órgãos de imprensa sindicais e de grupos anarquistas ou das actividades realizadas nas (ou a partir das) suas sedes, urgia a criação de um grande veículo informativo e propagandístico das suas insatisfações, realizações e objectivos. Já o haviam tentado em 1908 com o diário A Greve, mas que muito pouco durara. Após a queda da Monarquia, o tipógrafo Alexandre Vieira conseguira pôr de pé o semanário O Sindicalista, que se aguentou razoavelmente bem, apesar das perseguições a que foi sujeito, sobretudo a partir de 1913 com o governo de Afonso Costa.
Os anos da guerra foram difíceis para o movimento sindical mas, fazendo das fraquezas forças, foi a partir daí que a acção colectiva dos trabalhadores se reacendeu, as organizações se multiplicaram, os efectivos aderentes incharam e as perspectivas de uma nova época – de Revolução Social – insuflaram de ânimo muitos activistas, também embalados pelo exemplo vindo da Rússia, que aqui ia chegando.
Foi num momento único e particularmente convergente de vontades e ideias que, a 23 de Fevereiro de 1919, saiu à rua o primeiro número de 'A Batalha', subtitulado de «diário da manhã, porta-voz da organização operária portuguesa», sob a chefia redactorial do mesmo Alexandre Vieira e referido como «diário de grande tiragem e expansão».

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Jornal A Batalha, cabeçalho desenhado por Perfeito de Carvalho.

Ocorre lembrar que o desenho gráfico do cabeçalho de A Batalha foi desenhado pelo tipógrafo Francisco Perfeito de Carvalho, um patusco estroina que (segundo contam seus contemporâneos) tendo sido designado pela CGT para ir representá-la a um congresso da Internacional Sindical Vermelha, em Moscovo, gastou boa parte do dinheiro então recebido… em Paris! E quando no Congresso Operário de 1922, na Covilhã, deu conta
dessa missão mas os delegados o pressionavam para que apresentasse o devido relatório, em papel, ele terá respondido/perguntado se queriam que o escrevesse… em verso!?
Até Maio de 1927, produzir diariamente um jornal de 4 a 8 páginas em grande formato, com base no voluntariado de quase toda a redacção, de uma parte do quadro de compositores tipográficos e da integralidade dos seus correspondentes e difusores da província, foi uma obra homérica, pode dizer-se. Chegou a afirmar-se que A Batalha atingira o terceiro posto nacional em termos de tiragem, atrás d’ O Século e do Diário de Notícias. É duvidoso que assim tenha sido, à luz do que investigou Jacinto Baptista para o seu inesquecível livro 'Surgindo vem ao longe a nova aurora…' (Bertrand, 1977) e das memórias deixadas por Manuel Joaquim de Sousa em 'Últimos Tempos de Acção Sindical Livre e do Anarquismo Militante' (Antígona, 1989). Mas, em qualquer caso, foi sempre de vários milhares – talvez dez mil, em média, quando o habitual para os “semanários de ideias” era de uns três mil – o número de exemplares postos diariamente em circulação. E nenhum outro dos seus confrades da imprensa sofreu tão largas perseguições do poder político como A Batalha, através de suspensões administrativas e de outras manobras de intromissão governamental na liberdade de opinião republicana!...
A partir de 1923, o descanso semanal dos tipógrafos ao domingo era aproveitado para que, às segundas-feiras, saísse um «Suplemento Literário e Ilustrado», composto ao longo da semana precedente e – como as edições normais – impresso em casa comercial alheia situada na Rua da Atalaia, no mesmo bairro da Calçada do Combro onde (no imponente palácio dos condes de Castro Marim e Olhão, dito do Correio Geral, que foi tomado de aluguer) funcionava a redacção do jornal e uma parte significativa dos organismos sindicalistas então existentes na capital. Mas, para se ter uma ideia do espírito militante reinante, bastará dizer que um jornalista profissional como Pinto Quartim e que ali colaborava activamente nas horas de folga, escrevia directamente os seus artigos ao componedor, o aparelho manual onde então se fazia a composição tipográfica a chumbo, na ausência das modernas e semi-automáticas máquinas “Linotype”.
Diga-se, num parêntesis, que questões laborais deste tipo – porém, dentro das conflituosas relações entre patrões e assalariados – foram as que originaram em 1927 uma cena cómica e tumultuosa entre o conceituado tipógrafo Alexandre Vieira e o cultivado dr. Fidelino de Figueiredo, então director da Biblioteca Nacional, sita ao Chiado. A uma ofensa verbal deste último, respondeu o primeiro com dois murros, levando uma chapada de resposta que lhe despejou os óculos e feriu no nariz, tudo terminando com o balanceamento do tinteiro de bronze pousado na secretária à cabeça do chefe e a chegada em força do pessoal de segurança da instituição!
Mas continuemos. O sucesso editorial do diário foi tão grande que, em breve, a sua actividade se alargou à publicação de alguns livros e brochuras (por exemplo, a colecção A Novela Vermelha) e, em 1925, à edição quinzenal de uma boa revista-magazine, intitulada Renovação. Tanto este último título como o «Suplemento» podem hoje ser visitados on line (no site http://ric.slhi.pt/)
Com isto, a editorial d’A Batalha angariou a participação graciosa de várias boas plumas, artistas gráficos e intelectuais, já que ali o único colaborador remunerado era o director, por desempenhar a função em exclusividade, e que, por prurido anti-autoritário, era apenas chamado de redactor-principal. Mas personalidades significativas do meio cultural da época como Ferreira de Castro, Assis Esperança, Eduardo Frias, Sá Pereira, Nogueira de Brito, Bento Faria, Manuel Ribeiro, Carvalhão Duarte, Francine Benoit, Rocha Martins, Arnaldo Brazão, Tomás da Fonseca, Cristiano Lima, Jaime Brasil, Julião Quintinha, Ladislau Batalha, Mário Domingues, Adelaide Cabette, Adolfo Lima, Vitorino Nemésio, Roberto Nobre ou Stuart Carvalhaes deixaram o seu nome ali gravado, contribuindo para a qualidade e reputação destas produções. 
Como todas as obras colectivas do labor humano, nem tudo foi sempre isento de querelas e conflitos intestinos. Críticas pessoais e políticas subiram por vezes até às páginas do jornal. O confronto ideológico entre anarquistas e comunistas tornou-se estrutural. E, frequentemente, houve atritos e dificuldades entre a redacção do diário e os órgãos de topo da Confederação Geral do Trabalho, de que era o “órgão oficial” na imprensa.
Já sob a Ditadura Militar e na sequência do levantamento armado de Fevereiro de 1927, a polícia política (e parece que também energúmenos seus adjuntos) desembarca em força na redacção do jornal num dia de maio seguinte, prende quem lá está e destrói mobiliário e material tipográfico. O jornal é suspenso sine die e, legalmente, só reaparecerá fugazmente em 1930 como semanário e já sem a referência da sua ligação à CGT. Mas o militantismo anarco-sindicalista sempre se empenhou em prosseguir a sua publicação, de modo clandestino. Assim aconteceu em séries sucessivas em 1934, em 1935-37 e em 1947-49. E foram várias as tipografias secretas que funcionaram para o imprimir (no Pote d’Água, na Ramada, na Rua Carvalho Araújo, na Damasceno Monteiro, numa furna de Monsanto, etc.), sempre com camaradas tipógrafos a arriscarem a sua liberdade para que fosse feito, chegando a sua inventiva à construção de prelos em madeira (para o ruído não alertar a vizinhança) e ao requinte técnico de terem conseguido uma impressão a duas cores, naturalmente o preto e o vermelho.
Após o 25 de Abril de 1974, Emídio Santana, que já fora seu responsável nos anos 30, assume claramente a iniciativa da sua republicação legal e regular, que tem prosseguido até hoje (vai no nº 283 desta VI série, creio), embora com periodicidades oscilando entre o quinzenal e o trimestral, e tiragens modestas, semelhantes às de outros jornais de pequenas minorias políticas. Inicialmente assumiu-se formalmente, no frontispício, como «Jornal sindicalista revolucionário», que em Agosto de 1975 alterou para “Jornal anarco-sindicalista”, uma designação que deixou de ostentar em Agosto de 1983, mas sempre mantendo até hoje a menção de «Antigo órgão da CGT». Em Fevereiro de 1989, na retoma de publicação depois do falecimento do seu carismático director, passou a ser «Jornal de expressão anarquista».
Apesar da dimensão grupal-associativa que a existência d’A Batalha sempre implicou, vale a pena registar os nomes dos seus sucessivos responsáveis editoriais, cuja importância bem se compreende: Alexandre Vieira, Manuel Joaquim de Sousa, Manuel da Silva Campos, José da Silva Santos Arranha, Mário dos Santos Castelhano, Emídio Santana, José Maria Carvalho Ferreira, Moisés Silva Ramos, Maria Magos Jorge, João Santiago e António da Cruz. " (João Freire, A BATALHA UM JORNAL CENTENÁRIO & COM MUITA HISTÓRIA, A Ideia, Outono de 2019, pgs. 150-154)
 

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Último número de A Batalha clandestina, dezembro de 1949

Na mesma edição da revista A Ideia, é publicado um texto de Emidio Santana com o historial de A Batalha e das várias e sucessivas séries do jornal: 
 
"DA HISTÓRIA D’ A BATALHA, segundo Emídio Santana 
Existe no Arquivo Histórico-Social da BNP (AHS 5500 Ms 1496) um impresso dactilografado não assinado mas que se sabe ser da autoria do então director do jornal A Batalha, Emídio Santana, e com o seguinte título «A vida do jornal sindicalista “A Batalha” na fase de clandestinidade durante o período do salazarismo, 1927-1974». O texto está localizado de Lisboa e tem duas datas (12 e 17 de Setembro de 1980).
Trata-se duma breve síntese da vida do jornal, desde o seu nascimento em 1919 até à data do texto, Setembro de 1980, porventura para ser divulgada junto da imprensa, de agências noticiosas ou em folha autónoma.
Destacam-se nele as violências policiais a que o jornal foi sujeito e as dificuldades impostas por que passou desde os primeiros anos, ainda durante o período republicano, muito agravadas depois, durante o período da ditadura e do autodesignado Estado Novo. Para publicação, normalizou-se a citação do título das publicações referidas no texto, passando-as de redondo para itálico e de caixa alta para caixa baixa,
desfizeram-se alguns parágrafos para melhor agrupar o texto e corrigiram-se alguns erros evidentes (concordâncias, pontuação, falta dalguma palavra) de modo a tornar o texto mais acessível ao leitor de hoje. Um agradecimento é devido a Paulo Guimarães pela descoberta e selecção do documento.
"A Batalha, jornal diário e órgão da Confederação Geral do Trabalho começou a publicar-se em Lisboa a 23 de Fevereiro de 1919, sob a direcção de Alexandre Vieira, e continuou a publicarse diariamente, sem interrupção, apenas com acidentes de apreensão policial ou assaltos da mesma polícia à sua redacção, até ao n.º 2556, de 26 de Maio de 1927, data em que foi interditado pelo governo militar e as suas instalações destruídas pela polícia. Era ao tempo seu director Mário Castelhano e editor Silvino Noronha. No ano da sua suspensão publicaram-se quatro (4) números do Boletim Operário, editados pelo Comité Confederal da CGT.
Para suprir a sua falta e contornando a arbitrariedade do governo iniciou-se no Porto, a 29 de Setembro de 1929, o semanário A Vanguarda Operária, editado pela Delegação Confederal do Norte, embora já numa certa clandestinidade, como órgão dos Trabalhadores Portugueses,
tendo como director Zacarias de Lima e depois José Augusto de Castro, e como Administrador Francisco Ferrão.
Em Setembro de 1930 reaparece A Batalha como semanário, autorizado legalmente, assim identificada: II Série, como órgão da Comissão Interfederal de Defesa dos Trabalhadores, designação pública sob a qual se ocultava a CGT.
Editor: Alberto Dias e Administrador: Domingos Afonso Ribeiro. Redacção na Calçada Castelo Branco Saraiva, nº 42, e impresso na Rua da Atalaia, n.º 114, onde sempre fora impresso quando jornal diário. Começou a publicar-se em 13 de Setembro de 1930 e publicaram-se 13 números,
interrompendo a sua publicação por interdição do governo.
III Série, já clandestina. O n.º 1 tem a data de Abril de 1934 e publicaram-se dois (2) números devido às numerosas prisões na repressão do 18 de Janeiro. Estes números tinham o fim de reconstruir o movimento fortemente atingido pelas prisões que decorreram nesta fase.
IV Série, Ano XVI, 1935. Os números 1, 2 e 3 desta série, relativos a Março, Abril e Junho, foram compostos e impressos numa tipografia montada no subsolo duma cave na Rua Carvalho Araújo, e a máquina era construída parte em madeira e outra parte, a mecânica, em ferro, no processo das máquinas de impressão rotativas. Por precaução a tipografia foi transferida para a Venda Nova, à saída de Benfica. Mas o n.º 4, da mesma série, ano XVII, não saiu numerado e destinava-se a assinalar o 1.º de Maio desse ano, 1936, e foi composto de emergência numa oficina de Campo de Ourique do companheiro Avelino.
IV Série, Ano XVIII, 1937. Os números 5, 6 e 7, correspondentes a Janeiro, Fevereiro e Abril eram impressos a preto. Os números 8, 9, 10 e 11 correspondentes, respectivamente, a Maio, Junho, Julho e Setembro saíram impressos a preto e o cabeçalho ou «en-têtes» a vermelho. Publicava-se com 4 páginas e no formato de 40 X 30 cm. Esta série foi composta e impressa numa furna de Monsanto com entrada pela Rua Feliciano de Sousa, a Alcântara, e acompanhou o período agudo da guerra de Espanha, o período de maior repressão fascista.
V Série, Ano XXIX, 1947. Publicaram-se 10 números até Agosto deste ano. Mesma série, Ano XXX, 1948. Os números 11 e 12 correspondem a Novembro e Dezembro deste ano. Mesma série, Ano XXXI, 1949. Os números 13, 14 e 15 correspondem a Janeiro, Fevereiro e Abril. Mesma série. Ano XXXI, 1949. Publicaram-se os números 16, 17, 18, 19, 20 e 21, respectivamente de Maio, Junho, Julho, Agosto, Novembro e Dezembro deste ano.
Durante a publicação de A Batalha como jornal diário registaram-se várias perseguições, atentados à sua liberdade de publicação e variadas violências registadas numa elementar estatística:
Prisão de toda a redacção, em 1919, 1920 e 1921... 3 vezes
Encerramento da redacção e tipografia, nos mesmos anos...3 vezes
Não se publicou por o seu quadro tipográfico e redactorial se ter solidarizado com greves de protesto... 2 vezes
Submetida ao regime de censura prévia... 7 vezes
Apreensão pela polícia...11 vezes
Atrasos de saída por acção policial... 4 vezes
Assaltos da polícia à redacção... 7 vezes
Suspensa por acção policial... 5 vezes
Buscas à sede... 3 vezes
Processo em tribunal... 2 vezes
Condenação em tribunal... 1 vez
A BATALHA APÓS O 25 DE ABRIL
Em Setembro de 1974, reaparece como quinzenário. Indicada como Ano 1, Quarta Série, n.º 1. Esta série corresponde à VI Série, posteriormente corrigida e [presentemente] no ano VI correspondente a esta fase. Publica-se no formato normal dos jornais. Normalmente a 4 páginas, com o cabeçalho tradicional, a vermelho. É director Emídio Santana e é redigido por um colectivo redactorial de vários componentes. Presentemente está no n.º 65." (Manuscrito de Emídio Santana, A Ideia, Outono de 2019, pgs. 155-158)
 
24
Dez22

No final de 2014 a AIT-SP publicou o último número do Boletim Anarco-Sindicalista


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Em finais de 2014 saía aquele que seria o último número do boletim trimestral da Secção Portuguesa da Associação Internacional dosTrabalhadores constituída no final dos anos 90/início de 2000. O Boletim Anarco-Sindicalista nº 47, com 12 páginas, divulgava seis endereços electrónicos relativos a núcleos ou contactos locais da AIT-SP em Lisboa, Porto, Guimarães, Coimbra, Algarve e Setúbal, bem como uma série de lutas em todo o país. Anunciava também a realização no Porto, a 5 e 6 de Dezembro desse ano, de um Congresso Extraordinário da AIT (já em processo de convulsão interna, que levaria mais tarde à saída de diversas organizações da AIT e à constituição da CIT - Confederação Internacional do Trabalho, em 2018).

Embora este seja o último número do Boletim Anarco-Sindicalista, a AIT-SP manteve-se em actividade até ao inicio de 2017, com presença em diversas lutas e também nas redes sociais (aqui) e (aqui).

Para além do Boletim Anarco-Sindicalista, a AIT-SP publicou também dois números da revista teórica Apoio Mútuo, com artigos mais desenvolvidos sobre o anarco-sindicalismo.

Seria bastante útil que companheiros que estiveram ligados à AIT-SP fizessem um pequeno historial desta organização (fundação, principais actividade e núcleos, processo de extinção, etc.) que, durante os anos da sua existência, foi muito activa e que desenvolveu um trabalho importante na divulgação do anarco-sindicalismo e da auto-organização dos trabalhadores, através da acção directa e sem mediadores. Teve também um papel relevante nos contactos internacionais com as principais organizações anarco-sindicalistas do continente europeu.

07
Nov22

A greve dos lanifícios da Covilhã, em 1941: a última grande greve influenciada pelos militantes anarco-sindicalistas da CGT


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A greve dos trabalhadores dos lanifícios da Covilhã, em 1941, já depois de destruídos os sindicatos livres e com uma parte grande dos activistas sindicais  presos, fosse no Tarrafal ou noutras prisões do fascismo, foi a última grande greve influenciada e participada  por elementos anarco-sindicalistas  da antiga CGT.

A greve iniciou-se a 5 de novembro e teve como causa imediata a carestia de vida e os racionamentos provocados pela II Guerra Mundial.

Ferreira de Castro, o escritor anarquista, antigo colaborador de "A Batalha", proibida pelo regime fascista, escolhe a greve de 1941 e o ambiente social e operário da industria têxtil como a matéria-prima para construir o seu romance “A lã e a Neve”, cuja 1ª edição é publicada em 1947.

Descrevendo os momentos mais marcantes desta greve,  o Jornal do Fundão de 4/11/2021 refere que:

"Naquele dia 5 de Novembro de 1941, pelas 8 horas da manhã, cerca de cinco mil operários dos lanifícios da Covilhã e arredores iniciavam uma greve e punham-se em marcha a caminho do Pelourinho.  O comandante Ramos Paulo, da GNR da Covilhã, está no largo do município às 8,30h da manhã e pouco depois (como escreveu no relatório enviado ao ministro do interior) vê “uma grande multidão de operários de ambos os sexos a vir pela rua Direita em grande algazarra e atitude hostil…”  Já havia patrulhas policiais desde manhã cedo nas imediações das fábricas, junto às ribeiras da Carpinteira e da Goldra.

Com a lei do Estado Novo, Salazar proibira a greve e a oposição política, controlava os sindicatos numa estrutura nacional e encarava a paralisação do trabalho como um crime a punir severamente, o que abafava as tensões sociais e as reivindicações dos operários. A miséria vai-se agravando e, naquele mês de Novembro de 1941, a tampa salta com estrondo na cidade-fábrica onde laboravam mais de 130 empresas de lanifícios.

O escritor Ferreira de Castro, no seu livro “A Lã e a Neve” havia de escrever depois que “os operários viviam em casebres insalubres: homens de faces ocultas nas golas dos velhos sobretudos, mulheres embrulhadas nos xailes escuros e garotos de 12, 14 anos vestidos com remendadas roupas”.

 Os operários vinham reclamando aumentos de salário e, no mês anterior, uma comissão de operários das maiores fábricas apresentou ao sindicato um pedido para que houvesse um aumento de salários… Sem respostas, na noite de 4 de Novembro vão ao sindicato algumas centenas de trabalhadores que se mantiveram concentrados enquanto a comissão voltava a falar com a direcção do sindicato… Perdida a confiança na intermediação do sindicato, terá ficado ali combinado a greve para o dia seguinte.

As fábricas são patrulhadas e uma dezena e meia de operários são presos e levados para os calabouços que ficam na base do edifício dos paços do concelho (levados depois para cadeia política de Caxias). É para o Pelourinho que se dirige  “uma enorme multidão de mulheres e crianças, seguidas de perto pelos homens” exigindo a libertação dos presos. Chegam reforços policiais e um pelotão militar do quartel de Caçadores 2. Alguns feridos são levados para o hospital e um dos operários fica com uma perna amputada.

É a vigilância das fábricas e dos edifícios públicos. Uma equipa da PVDE, incluindo o subdirector Pessoa Amorim, deslocou-se para a Covilhã e começa a fazer interrogatórios.  Alguns operários influentes são convocados para demoverem os grevistas. O trabalho é retomado no dia 8 de Novembro, com promessas de que a situação seria remediada…

Porém, nada foi remediado e a 6 de Dezembro as fábricas voltam a parar.   Face a nova greve, o próprio Grémio dos Industriais de Lanifícios reúne em assembleia geral e, perante as “perturbações graves da vida social e económica da Covilhã”, envia a Salazar um telegrama a favor de uma melhoria salarial. Mas nada muda.

O governador civil, António Pinto Castelo Branco, manda a seguir publicar um comunicado ameaçando com pena de prisão e degredo aos grevistas. Os industriais são intimados a apresentarem listas de operários presentes e ausentes. Nem todos retomam o trabalho, mas a greve dilui-se.

O Notícias da Covilhã, dois meses mais tarde, refere-se à penúria que alastra na cidade e aos “bandos famélicos cobertos de farrapos”, apelando a  uma união das instituições de beneficência para “dar comida a quem tem fome e vestir os desenrpoupados”…

Só em 1943, viria a verificar-se uma aumento salarial, com um novo contrato colectivo para os lanifícios. Em 1946  as greves nos lanifícios  voltarão a agitar a Covilhã, com muitas dezenas de presos, incluindo mulheres, mas a ditadura acabaria por resistir e endurecer ainda mais a repressão.  Os alvos da “PVDE – Polícia de Vigilância e Defesa do Estado” (em 1945 passa para PIDE e em 1969 para DGS – Direcção-Geral de Segurança), não eram só as organizações políticas forçadas à clandestinidade, mas também o próprio movimento operário, no qual o salazarismo procurava extinguir qualquer cultura de protesto e acção colectiva, enraizada na Covilhã.

Entre os operários presos e levados para Caxias, a polícia do regime procurava ligações a organizações políticas, mas não as encontrou. Os 15 operários quase todos jovens estiveram sete semanas em Caxias, com passagens pela sede da PIDE e pela prisão do Aljube. Um deles, Felisberto Fernandes, casado, com 28 anos de idade e analfabeto, após mais um interrogatório, viria a morrer no hospital de S. José.

Após anos e anos de controlo e repressão laboral em todo o país, o operariado da Covilhã, põe fim à resignação e surpreende o regime. “É o que vai desencadear os movimentos grevistas até 1946. Os operários dos lanifícios estiveram na vanguarda” – conclui o historiador António Rodrigues Assunção." (aqui)

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“E, então, pôs-se a olhar para os outros homens, vestidos de negro, que passavam na sua frente, caras que lhe eram familiares, operários da Aldeia do Carvalho, e da Covilhã, que ele conhecia da hora da saída das fábricas, dos diálogos no Pelourinho, das próprias ruas onde habitavam. À medida que iam passando, ele evocava as ideias, as embrionárias ansiedades que tinha ouvido a cada um deles, desde que deixara o cajado de pastor e viera trabalhar para as fábricas. E cada vez ele se sentia mais confortado, mais confortado cada vez, por verificar que quase todos os que passavam na sua frente pensavam como Marreta e como ele próprio pensava agora.

Viu Tramagal, Ricardo e João Ribeiro a descerem a calçada – e juntando-se a eles, Ricardo disse-lhe:

- No sábado à noite, vamos fazer uma reunião, aqui, na Covilhã, em casa do Ildefonso. Precisamos de continuar...Compreendes? Precisamos de continuar...Não faltes!

- Lá irei – respondeu. E voltou a sentir-se menos abandonado do que quando vira, momentos antes, enterrar Marreta e muito menos do que quando há anos, entrara para a fábrica. Parecia-lhe que uma secreta força, que ele desconhecia quando viera para ali, partia dos outros para ele e dele para os outros – ligando-os a todos e dando-lhes, com novas energias, uma nova esperança. Ao chegarem ao começo da Rua Azedo Gneco, onde ele vivia, Horácio despediu-se.

Mesmo ao andar sozinho na viela solitária, parecia-lhe que não ia sozinho." (*)

(*) Castro, Ferreira de, "A Lã e a Neve", citado por Cátia Sofia Ferreira Teixeira, na Dissertação de Mestrado em História Contemporânea "As greves dos operários de lanifícios da Covilhã no Inverno de 1941 -O início da agitação operária em Portugal durante a Segunda Guerra Mundial", FCSH, Lisboa, Novembro de 2012

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Nesta greve é preso, entre outros operários, Felisberto Fernandes Berto, conhecido como "O Boga", a 7 de novembro, dois dias depois da paralização ter começado. Felisberto morrerá dias depois, ainda detido, no Hospital de S. José, em Lisboa.

Tendo nascido em S. Martinho, concelho da Covilhã a 18 de setembro de 1913, filho de António Fernandes Berto e Maria dos Santos da Piedade, operário têxtil, toma parte ativa nas greves das fábricas de lanifícios, participando, designadamente, na invasão da Fábrica Alçada, no dia 5 de novembro de 1941, pelas 14 horas, concretizada por uma multidão de operários e operárias.
Inicialmente, a exigência de melhoria salarial estava restrita a um sector da indústria de lanifícios – o sector de estambres – mas rapidamente alastra à totalidade do operariado da região.
Dez operários foram presos à saída da Fábrica Alçada. Os restantes serão presos como consequência de denúncias e um outro, nas manifestações de rua.
Segundo a PVDE, que destaca para a Covilhã o inspetor José Maria Branquinho, para proceder aos interrogatórios, na invasão da Fábrica Alçada destacam-se Gilberto Duarte, que então estava a prestar serviço militar e que será levado a julgamento no tribunal Militar Especial, e Felisberto Fernandes Berto.
Este operário foi entregue à PVDE pela PSP da Covilhã em 7 de novembro de 1941 e enviado para o Depósito de Presos de Caxias, sendo transferido, logo no dia 18, para a Cadeia do Aljube. Regressou a Caxias no dia seguinte e, no dia 1 de dezembro baixou ao Hospital de S. José, falecendo no Hospital do Desterro no dia 20 de dezembro de 1941, alegadamente com uma úlcera. Tinha 28 anos de idade. (aqui)

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04
Fev22

A Confederação Geral do Trabalho (1919-1927)


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Título: A Confederação Geral do Trabalho (1919-1927)
Autor: Teodoro, José Miguel
Orientador: Ventura, António, 1953-
Palavras-chave: Confederação Geral do Trabalho - História
Sindicalismo - Portugal - 1919-1927
Sindicalismo revolucionário - Portugal - 1919-1927
Sindicatos - Portugal - séc.20
Teses de doutoramento - 2014
Data de Defesa: 2014

 

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Este documento dá conta dos resultados do trabalho de investigação sobre a Confederação Geral do Trabalho (CGT), o organismo de cúpula do sindicalismo português, nos anos de 1919 a 1927. Formada em 1919, no II Congresso Operário Nacional de Coimbra, foi determinada a sua dissolução pelas autoridades após a tentativa de golpe de estado de Fevereiro de 1927. Apresentam-se os antecedentes imediatos da organização, o modelo organizativo que adoptou, o funcionamento dos principais órgãos confederais e a relação com os organismos confederados, o essencial da vida interna destes e a sua participação na actividade confederal; identificam-se organismos, militantes e activistas de referência, a geografia do sindicalismo português, o papel determinante do jornal A Batalha, e os principais eventos, como os três congressos nacionais de sindicatos. Surpreende-se o ambiente social e laboral no país, as principais determinantes da acção sindical e confederal, a militância e a participação; mas também as insuficiências e dificuldades, a repressão e os seus efeitos, os grandes temas fracturantes – as Internacionais sindicalistas, a orientação do sindicalismo (libertário, à margem dos partidos políticos ou irmanado com o Partido Comunista), a táctica sindical e a capacidade e autosuficiência do sindicalismo, ou a participação da CGT em acções e estruturas frentistas unitárias defendidas pelos sindicalistas comunistas. Analisam-se pontos críticos da organização, como a escassez de recursos humanos e financeiros, a redução do efectivo sindicalizado, e apresentam-se momentos graves da organização – a atitude face ao “18 de Abril” e ao “28 de Maio”, o confronto interno entre militantes/activistas sindicais das sensibilidades anarquista e comunista, a expulsão de dirigentes sindicalistas comunistas da CGT em 1921, a saída de sindicatos importantes em 1925, a crise protagonizada por Santos Arranha e Manuel Joaquim de Sousa em 1926, que levou várias Federações a abandonar a organização, o “3-7 de Fevereiro de 1927”.

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04
Fev22

O centenário do jornal operário A Batalha [1919-2019]


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Sede do jornal A Batalha na Calçada do Combro, nº38 A

António Cândido Franco

No final da primeira Grande Guerra a comissão administrativa da União Operária Nacional (UON) – central sindical nascida no congresso de Tomar em 1914 e que, fruto das circunstâncias da guerra, do revês que foi a greve geral de Novembro de 1918 e do desencontro estratégico das suas duas grandes correntes internas, a socialista e a libertária, atravessava então um momento difícil – aceitou o projecto dum jornal diário, porta-voz da organização e dos seus interesses de classe. Para estudar o assunto e pôr de pé a ideia nomeou uma roda de sindicalistas ligados ao livro, às artes gráficas, ao jornalismo e ao comércio. Compunham-no Augusto Carlos Rodrigues, Carlos José de Sousa, Perfeito de Carvalho, Raul Neves Dias e António Pinto Quartim, a que se juntaram logo após Eduardo de Freitas, Hilário Marques, Francisco Cristo, Manuel Afonso, Gil Gonçalves, José António de Almeida, Sá Pereira, Joaquim Cardoso e Alexandre Vieira, este último um experiente tipógrafo e sindicalista que estivera ligado desde 1903 a quase todas as experiências de imprensa sindical em Portugal e fora já responsável de vários periódicos operários como A Greve (1908) e O Sindicalista (1911-1915). Foi este grupo que definiu as linhas orientadoras do jornal, estabeleceu o tipo de relação entre ele e a central sindical e angariou os meios necessários à sua edição, através duma subscrição pública de mil quotas de um escudo amortizáveis. Deste grupo saíram a redacção do novo periódico (Sá Pereira, Francisco Perfeito de Carvalho e Pinto Quartim), a administração (Hilário Marques, Eduardo de Freitas e Francisco Cristo), a equipa de publicitação e propaganda (Gil Gonçalves, Manuel Afonso, Quartim), o quadro tipográfico (coordenado por Carlos José de Sousa) e o responsável e primeiro director (Alexandre Vieira). O título, A Batalha, já com alguma tradição no meio sindical português – existira em 1913 um jornal chamado A Batalha sindicalista –, foi sugerido pelo tipógrafo e jornalista Perfeito de Carvalho, que também desenhou e compôs o característico cabeçalho.

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Suplemento ilustrado Abril 1925

Surgiu assim a 23 de Fevereiro de 1919 o primeiro número deste novo diário da manhã, “porta-voz da organização operária”. Em Setembro desse ano teve lugar em Coimbra o segundo Congresso Nacional Operário – o primeiro, em Tomar, fundara a UON – que marcou o decisivo ascendente da corrente libertária ou anarco-sindicalista sobre a socialista e que, com a presença de 119 sindicatos com cerca de 130 mil afiliados (informação de Edgar Rodrigues), fundou a Confederação Geral do Trabalho (CGT), de que A Batalha, diário da manhã, se tornou estatutariamente o órgão. Quer a CGT, quer a administração e a redacção do seu porta-voz ficaram instalados no antigo palácio dos condes de Castro Marim e Olhão, na Calçada do Combro, 38-A, onde aliás funcionara já a redacção do jornal no tempo da UON.

Durante mais de oito anos, até 26 de Maio de 1927 (n.º 2 556), o jornal publicou-se com pontualidade – não saía ao domingo para garantir o descanso semanal dos tipógrafos – e impôs-se como um prestigiado órgão de informação e de cultura, capaz de competir com a imprensa burguesa da época.

Tornou-se num diário de grande expansão e chegou a ser o segundo ou terceiro jornal mais lido, depois do Diário de Notícias e d’ O Século. No seu apogeu, em 1920 e 1921, o jornal tirava cerca de 25 mil cópias diárias (informação de Emídio Santana), embora em Fevereiro de 1919 tenha começado por uma tiragem muito mais modesta e cautelosa. Como quer que seja, já em Abril desse ano o jornal se intitulava “o terceiro jornal de maior venda em Lisboa”. A expansão e a consolidação do jornal deveram-se antes de mais à argúcia dos seus redactores principais, que nunca deixaram que o jornal se limitasse aos interesses das classes envolvidas, ou se fechasse nos seus aspectos doutrinários, preferindo um tipo de informação crítica atenta aos casos do presente e aos assuntos do dia. Isto levou a uma diversificação de publicações associadas ao jornal, como a edição dum Suplemento literário e ilustrado, que saía às segundas-feiras e se publicou de 1923 a 1927, e onde colaboraram grandes nomes da arte e da literatura de então e que nada tinham a ver com a CGT, como José Régio e Vitorino Nemésio, e a edição duma revista quinzenal, Renovação, que saiu em 1925 e 1926. A editorial do jornal publicou ainda um acervo importante de livros e de brochuras, onde se destaca a série Novela Vermelha, que arregimentou escritores e jornalistas empenhados no sindicalismo libertário (Campos Lima, Manuel Ribeiro, Mário Domingues, Ferreira de Castro).

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A Batalha, 1930

Nada disto impediu que o jornal não dedicasse o grosso da sua atenção ao problema do trabalho – que era a sua razão de ser e foi o crivo com que peneirou sempre os casos do dia na política e na sociedade – e não abrisse as suas páginas a polémicas fortemente doutrinárias que só ao movimento operário e às suas estratégias podiam interessar. Foi o caso da evolução da revolução russa de Outubro de 1917 que mereceu sempre ampla cobertura e debate no diário operário, de início com vasta, generosa e empenhada simpatia e depois com reservas críticas e progressivo desencanto. Como quer que seja, a informação prestada pelo órgão da CGT sobre este facto histórico serviu sempre de contrapeso à campanha de contra-informação activa que a restante imprensa dele fazia.

A revolução russa acabou por dar lugar a divergências no seio do anarco-sindicalismo e na própria CGT, com o surgimento duma corrente bolchevista, da qual saiu em 1919 a Federação Maximalista e dois anos depois o Partido Comunista Português (PCP), que advogava as estratégias da revolução russa.

O diferendo só foi sanado no terceiro Congresso Operário Nacional, que teve lugar na Covilhã, no início de Outubro de 1922, com a recusa da CGT em aderir à Internacional Sindical Vermelha (Moscovo), optando por votação maioritária por permanecer fiel à orientação libertária sindical da Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), com sede em Berlim. Um referendo em 1924 ratificou por maioria ainda mais expressiva essa ligação internacional, delineada desde há muito por ideólogos operários tão preparados quanto Manuel Joaquim de Sousa, um operário do calçado que foi o redactor dos estatutos da CGT e seu primeiro secretário-geral, Hilário Marques, um arsenalista que foi o responsável por uma das editoras que mais se notabilizaram na propaganda operária desde o final da monarquia, A Sementeira, e Neno Vasco, um militante falecido em 1920, que pela intransigência da sua actuação moral e pelo alcance teórico das suas ideias concitou a admiração unânime das duas correntes operárias da época – a libertária e a maximalista.

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Tomaz de Aquino, Reis Sequeira e Emídio Santana – militantes da antiga CGT

A ditadura militar em 1926 criou novas dificuldades ao jornal, que nunca até aí tivera vida fácil. Entre 1919 e 1926 foi encerrado três vezes pela polícia e toda a sua redacção presa, foi submetido a censura prévia sete vezes, suspenso cinco, processado e levado a tribunal duas e condenado uma.

A situação piorou muito com a ditadura militar, que assaltou, destruiu e ocupou as instalações do jornal em 26 de Maio de 1927 em virtude da CGT ter secundado no Porto e em Lisboa o movimento de Fevereiro contra a ditadura.

São ilegalizadas de imediato as federações de indústrias, as uniões locais de sindicatos, o comité confederal da CGT e o seu porta-voz. Salvo uma breve fase em 1930, em que A Batalha reapareceu como hebdomadário legal, numa segunda série que fez 13 números, a história do jornal confunde-se depois disso com a clandestinidade, em que tirou três séries (1934; 1935-1937; 1947-1949), a primeira no quadro da greve geral do 18 de Janeiro de 1934 e a última no rescaldo da segunda Grande Guerra com 21 números. Dirigido por um antigo militante da CGT, Emídio Santana, que fora um dos protagonistas do atentado a Salazar em 1937, o jornal reapareceu logo depois da Revolução dos Cravos, dando início à sua sexta série, ainda hoje em curso de publicação e que comemorou, em Fevereiro de 2019, o seu centenário com um número especial.

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A Batalha, primeiro número da VI Série (Setembro, 1974)

Uma nota final para as relações entre A Batalha e a revista Seara Nova. António Sérgio foi o primeiro intelectual português que o jornal se preocupou em entrevistar, o que sucedeu no número de estreia, mostrando indisfarçável simpatia pelos propósitos sociais e pedagógicos do pensador. Fundada a Seara Nova em 1921 as relações entre as duas publicações logo se estabeleceram. Fez-se vulgar a ida de seareiros – um exemplo é Câmara Reys – à sede da CGT ou às uniões sindicais fazer palestras de interesse associativo, científico e cultural, o que não impediu as críticas da central operária sempre que os seareiros apareceram associados ao governo. Seja como for, a revista tomou inúmeras posições a favor do diário operário, quer nos momentos em que este sofreu os atropelos da polícia, dos tribunais e da censura, quer quando se viu descriminado ao não ser convidado para o Congresso da Imprensa Latina (v. Seara Nova, n.º 32, 1-3-1924).

Bibliografia

  • Baião, António, I cento anni di A Batalha, in Bolletino Archivo G. Pinelli, n.º 53, Milão, Centro Studi Libertari, 2019.
  • Baptista, Jacinto, Surgindo vem ao longe a nova aurora… Para a História do diário sindicalista A Batalha 1919-1927, Lisboa, Bertrand, 1978; 2.ª ed., pref. António Ventura, Lisboa, Livraria Letra Livre/ A Batalha, 2019.
  • Rodrigues, Edgar, Os anarquistas e os sindicatos em Portugal 1911-1922, Lisboa, Editora Sementeira, 1981.
  • A oposição libertária em Portugal 1934-1979, Lisboa, Editora Sementeira, 1982.
  • Santana, Emídio, Intervista com E.S., in Rivista Anarchica, ano IV, n.º 6, Milão, Agosto-Setembro, 1974.
  • Vieira, Alexandre, Para a história do sindicalismo em Portugal, Lisboa, Editora Seara Nova, 1970.

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04
Fev22

O sindicalista José Santos Arranha (1891-1962)


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Santos Arranha foi uma figura cimeira na história do sindicalismo português, apesar de, por diversas vezes, ter estado envolto em polémica. Secretário-geral da CGT e, depois, director do jornal diário "A Batalha" por ocasião do golpe militar de 28 de maio de 1926 foi responsabilizado por alguma tibieza que se terá verificado na reacção ao golpe por parte do diário confederal. Já antes fora acusado por alguns sectores libertários e anarco-sindicalistas de, através de uma série de artigos no jornal, contestar a direcção da central sindical e permitir a publicação de artigos discordantes da linha oficial da CGT. Apesar das polémicas, Emídio Santana define-o nas suas "Memórias...." "como um militante inconfundivelmente anarco-sindicalista".

*

No dia 24 de Fevereiro de 1962, falecia em Lisboa uma figura cimeira do sindicalismo português.

Sob o peso da censura de uma ditadura de tipo fascista, os jornais do dia seguinte não disseram nada.

Mas quem ia a enterrar era um antigo secretário-geral da CGT (Confederação Geral do Trabalho). E antigo director do diário sindicalista A Batalha.

Era um homem que havia sido preso político pelo menos seis vezes, mas que permaneceu fiel aos seus ideais até ao final da vida. Era anarquista. Ou “socialista-libertário”, como gostava de dizer.

E tinha sido também colaborador da A Voz do Operário.

Operário marceneiro

Filho de um ferroviário, José da Silva Santos Arranha nasceu a 3 de janeiro de 1891, na então vila de Caldas da Rainha.

Tornou-se operário marceneiro e rumou a viver para Lisboa, onde viria a casar com uma operária tabaqueira.

E aqui se salientou nas lutas sindicais, no período da 1ª Guerra Mundial. Foi aliás nessa altura, em 1916 e 1917, que colaborou no principal jornal operário que existia em Portugal: A Voz do Operário, então com edição semanal de 60 mil exemplares.

Neste jornal, Santos Arranha expôs duas lutas concretas do seu sector profissional. A primeira em torno do horário de trabalho, procurando conquistar um limite diário de 9 horas. A segunda por questões salariais, tentando recuperar poder de compra face à elevada inflação que se registava à época.

Os sindicato únicos

Alguns anos depois, em 1920, Santos Arranha destacou-se num processo de reorganização sindical que passou pela criação dos então chamados “sindicatos únicos”. Tratava-se de reunir trabalhadores do mesmo ramo de actividade que anteriormente estavam divididos em diferentes sindicatos de ofícios especializados.

No caso de Santos Arranha, a sua antiga Associação de Classe dos Operários Marceneiros de Lisboa aderiu ao novo Sindicato Único da Indústria Mobiliária de Lisboa. Santos Arranha foi um dos fundadores deste novo sindicato e um dos seus primeiros dirigentes, responsável pela “caixa de solidariedade e Bolsa de Trabalho”.

No final desse ano de 1920, ele foi também um dos fundadores da Federação Nacional dos Operários da Indústria de Mobiliário. 

A CGT

No congresso operário realizado em Outubro de 1922, na Covilhã, Santos Arranha foi eleito secretário-geral da central sindical CGT. E exerceu esse cargo durante um ano.

Uma preocupação central da CGT nesse período foi o agravamento do custo de vida. Para se ter uma ideia, até o governo republicano dizia que “a carestia dos géneros de primeira necessidade” atingia preços “exorbitantes” e que era “verdadeiramente aflitiva a situação de milhares de consumidores”. Mais reconhecia que existiam muitos “casos de exploração intensamente gananciosa” e de lucros “excessivos” que estavam “semeando a miséria” [Diário do Governo (1ª série), 21/10/1922].

Neste contexto, foi prioritária a luta pela recuperação de salários. Mas essa luta viu-se confrontada com outro problema, a repressão política sobre a classe trabalhadora: activistas presos, imprensa apreendida, sindicatos temporariamente encerrados, reuniões dissolvidas… Só no período em que Santos Arranha foi secretário-geral da CGT, ele próprio foi duas vezes preso, ambas quando participava em pacíficas reuniões sindicais.

Na acção da CGT nesse período é de salientar o trabalho de solidariedade com trabalhadores em luta. “Em Outubro de 1922 os mineiros de Aljustrel declaram-se em greve, reclamando melhores salários, luta que sustentaram ininterruptamente até Janeiro seguinte”. A CGT organizou então o acolhimento temporário dos filhos destes trabalhadores em famílias de Beja e Lisboa, “para subtraí-los à fome e ajudar os pais na sua luta”.

O processo repetiu-se em Lisboa e no Porto para apoiar trabalhadores em greve na Covilhã e S. Pedro da Cova. Acolhendo no total algumas centenas de crianças.

Como sublinharia Emídio Santana, estes “foram actos de solidariedade de um grande significado e demonstrativos das energias morais do movimento” [Santana (1987), Memórias de um militante anarco-sindicalista].

Em Outubro de 1923, Santos Arranha demitiu-se da liderança da CGT, no quadro das discórdias que à época dividiram o movimento sindical português. Discórdias sobretudo entre a corrente anarquista e a corrente comunista, mas também a nível interno da corrente anarquista.

No verão de 1925, Santos Arranha voltou à linha da frente como director do ‘órgão central’ da CGT, o jornal A Batalha. Cargo do qual de novo acabou por se demitir ao fim de um ano e pelas mesmas razões.

Fascismo

Na fase que Santos Arranha dirigiu A Batalha, esse jornal marcou posição na denúncia e no apelo à luta contra a ameaça de uma ditadura militar e do fascismo. Uma ameaça bem real, que se concretizou com o golpe militar de 28 de Maio de 1926.

Em 1927, A Batalha foi encerrada, a CGT foi forçada à clandestinidade e Santos Arranha foi mais uma vez preso político. Viu-se depois constrangido a sair do país. Na década de 1930 viveu na Bélgica, onde integrou um sindicato de operários da construção civil.

Terá regressado a Portugal em 1939, para escapar à invasão nazi [segundo João Freire/Maria Alexandre Lousada (2013), Roteiros da memória urbana – Lisboa: marcas deixadas por libertários e afins ao longo do século XX].

Na década de 40, Santos Arranha foi militante de um grupo anarco-sindicalista clandestino: o grupo «Esperança». E quando faleceu ainda participava numa “tertúlia” que reunia velhos sindicalistas.

(aqui)

16
Nov21

Participação anarquista e anarco-sindicalista na manifestação do 1º de Maio de 1974


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Os anarquistas e membros da antiga CGT anarco-sindicalista, José Francisco e Acácio Tomás Aquino, na manifestação do 1º de Maio de 1974, na Avenida Almirante Reis, transportando a bandeira do Sindicato Único das Classes Metalúrgicas de Lisboa (a que também pertenceu Emidio Santana), aderente à CGT, e que Aquino conservou e guardou durante várias dezenas de anos, apesar da fúria repressiva das forças policiais do Estado fascista que apreendeu o mais diverso material dos sindicatos anarquistas, para além do roubo das suas sedes e da prisão dos seus principais dirigentes e militantes.

21
Out21

VALENTIM ADOLFO JOÃO: “NÃO TENHO VAGAR AMOR”


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Esta fotografia pessoal de Valentim Adolfo João foi conservada por Emídio Santana, que a entregou ao Arquivo Histórico-Social (AQUI)

Valentim Adolfo João (30 de Março de 1902-29 de Janeiro de 1970) foi um destacado dirigente do Sindicato dos Mineiros (primeiro da Mina de São Domingos, depois de Aljustrel). Anarcosindicalista, participou em 1932 na última grande greve dos mineiros da Mina de São Domingos, , tendo sido o último destes a ser libertado das prisões políticas da ditadura, nos anos 60, neste caso, do forte de Peniche. Preso em 1924 por lançamento de bomba. Delegado ao Congresso Operário de 1925. Membro do Grupo de Propaganda e Estudos Sociais da Mina de S. Domingos (1923/33). Participa na Conferência Anarquista do Sul de 1925 – UAP (AQUI)

Relativamente a Valentim Adolfo João há uma referência em José Correia Pires, no livro ““Memórias de um prisioneiro do Tarrafal” (1975), em que este anarquista conta a sua fuga do Algarve, nas vésperas do 18 de Janeiro de 1934, a caminho de Espanha. De Beja passa à Mina de São Domingos e à fronteira. “Na fronteira descalcei-me, arregacei as calças e com a companhia de um camarada de nome António Patrício, irmão do velho militante anarquista Valentino Adolfo João, excelente camarada e envolvido mais tarde no atentado a Salazar, esteve preso mais de uma dezena de anos e faleceu há cerca de três. Valentim Adolfo João estava fixado a umas dezenas de quilómetros da fronteira e fui dirigido a ele. Ali o encontrei feito agricultor, vivia com a mulher e filhos numa barraca de vime. Já nos conhecíamos por correspondência, mas quando o vi, cabeleira ao alto e desenvolta, lembrei-me da «Cabana do Pai Tomás», e Valentim dava na verdade uma excelente figura de romance. Fazia a sua sementeira e era um autêntico camponês. Fiquei ali um dia e uma noite e recordo-me que ele gozava ali de bom ambiente, nessa noite fomos visitados por uma patrulha da guarda fiscal ou os chamados «carabineiros», que decerto modo me vieram a ser úteis para a minha introdução em Espanha!… (aqui)

Também o escritor Modesto Navarro que encontrou o irmão, Patrício, em Aljustrel, já na década de 70, escreve sobre Valentim Adolfo João no seu livro “Poetas Populares Alentejanos”. Apesar de várias inexactidões (o atentado a Salazar foi em 1937 e não em 1933 como refere Modesto Navarro. Valentim Adolfo João morreu em Janeiro de 1970 e não em 1971), eis o texto de Modesto Navarro com umas “quadras” atribuidas a Valentim Adolfo João.

“Quando do atentado contra Salazar, em 1933, [esta data não está correcta. O atentado a Salazar, levado a cabo por um conjunto de anarquistas e de outros antifascistas deu-se  a 4 de Julho de 1937 – nota de Portal Anarquista] Valentim Adolfo João, na altura presidente do Sindicato dos Mineiros de Aljustrel, foi acusado pela PVDE (aquela que viria a ser a PIDE) de ter fornecido o dinamite. Sabe-se hoje que os fascistas aproveitaram esse acontecimento para perseguirem e prenderem muitos democratas. A partir daí, Valentim Adolfo João andou com um nome suposto (José Dias) até 1946, data em que foi reconhecido em Setúbal. Condenado a 28  anos de prisão, foi libertado quase no fim da década de 1960/1970,  já completamente destruído. Veio a morrer por volta de 1971.  É seu irmão, o sr. Patrício, que nos diz estas décimas em Aljustrel, explicando que, na  altura em que Valentim Adolfo João as fez, organizava o sindicato com outros mineiros.

Namorava uma moça com a sua idade, dezanove anos, e um dia ela queixou-se da pouca  atenção que lhe dedicava: – «Passa-se uma noite, passa-se outra, e tu sem apareceres…»  Ao que Valentim Adolfo João respondeu:

Não tenho vagar amor
para te dar atenção
tenho muito que fazer
na minha Associação

É meu desejo transformar
esta pobre sociedade
que semeia a iniquidade
para nos escravizar
temos muito que lutar
com força audácia e valor
para extinguirmos a dor
a miséria e o sofrimento
e por isso neste momento
não tenho vagar amor

Se a vida fosse a sorrir
se de encantos fosse o viver
e se num breve alvorecer
a luta nos redimir
então poder-te-ei garantir
imorredoira afeição
mas enquanto a escravidão
produzir mal e desgosto
não posso fugir do posto
para te dar atenção

Olha para todo o mundo
verás tanta dor tanta desgraça
eu amo a beleza, amo a graça
amo o bem-estar profundo
o capital iracundo
procura nos perverter
mas nós havemos de vencer
apeando os comodistas
e amando os idealistas
tenho muito que fazer

Sociedade corrompida
teus erros são vis e sicários
aleivosos, argentários
que nos negam o direito à vida
e eis porque minha querida
distraio a atenção
e para acabar a escravidão
eu prego por toda a parte
construindo um baluarte
a minha associação”

(Texto retirado da obra “Fado Operário no Alentejo, séculos XIX – XX” de Paulo Lima, 2004, ed. Tradisom, Vila Verde, pp. 90 e 91. 2)

aqui: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2013/02/02/valentim-adolfo-joao-nao-tenho-vagar-amor/

21
Out21

“AIT E ANARCO-SINDICALISMO: ALTERNATIVA ATUAL E RAÍZES HISTÓRICAS” EM DEBATE NA UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR (COVILHÃ)


Realiza-se hoje, dia 6 de dezembro de 2012, às 14h30, no Anfiteatro 7.22 – Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade da Beira Interior (Covilhã).

José Rocha Paiva, da Associação Internacional de Trabalhadores – Secção Portuguesa (AIT-SP), profere, dia 6 de dezembro, às 14H30, no anfiteatro 7.22 da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da UBI, a conferência “AIT e Anarco-sindicalismo: alternativa atual e raízes históricas”.
A génese ideológica do anarco-sindicalismo, a história do mesmo em Portugal e seu impacto, o percurso histórico da AIT e as perspetivas futuras são os temas a tratar na iniciativa organizada pelo Grupo de Estudos Políticos da UBI.
Entrada livre.

Fonte: Grupo de Estudos Políticos e Faculdade de Ciências Sociais e Humanas e AIT/SP

aqui:https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2012/12/06/ait-e-anarco-sindicalismo-alternativa-atual-e-raizes-historicas-hoje-em-debate-na-universidade-da-beira-interior-covilha/

21
Out21

AIT/SP: SOBRE A CARGA POLICIAL EM SÃO BENTO DURANTE A GREVE GERAL


No dia 14 de Novembro, na maior manifestação em dia de greve geral, os chefes da polícia, o ministro da administração interna e outros políticos tentaram justificar a carga policial sobre os manifestantes em São Bento, dizendo que as “forças de segurança” tinham sido muito tolerantes porque durante mais de uma hora “com serenidade e firmeza” levaram com pedras e garrafas atiradas por “meia dúzia de profissionais da provocação”.

Houve várias pessoas a atirar pedras e outros objectos ao cordão policial que defendia o Parlamento e não só eram bem mais do que meia dúzia, como muitos outros permaneceram por ali bastante tempo, sem arredar pé.

Também é verdade que houve uma carga violentíssima sobre os manifestantes, homens, mulheres, idosos, crianças, tudo o que se mexia foi varrido, atirado ao chão, ameaçado com gritos e balas de borracha. Houve ainda uma perseguição por várias ruas, onde se prenderam pessoas indiscriminadamente. Dezenas de pessoas foram identificadas sem saberem porquê. Nas esquadras não lhes foi dada a possibilidade de falar com um advogado, ir ao wc ou até de receber assistência médica.

Sobre a repressão policial temos apenas a dizer o seguinte: violência não é atirar pedras contra o corpo de intervenção, protegido com os seus fatos especiais, capacetes, escudos, cassetetes e armas. Violência não é a revolta de quem trabalha e não tem dinheiro suficiente para viver, de quem nem trabalho tem e desespera à procura, de quem passa fome, dos idosos que vêem as suas pensões reduzidas, de quem não explora ninguém e vive uma vida inteira a ser explorado pelos mesmos de sempre: políticos, banqueiros e empresários. Violência não é atacar a polícia quando esta defende o sistema ao qual pertence: o Estado, esse mesmo Estado que concedeu um aumento salarial de 10% para as forças de intervenção enquanto milhares de pessoas vivem em pobreza e outros para lá caminham.

Violência não é gritar palavrões contra os agentes policiais quando eles escolheram estar ali, especialmente os do corpo de intervenção. A polícia só existe para manter a ordem pública. E manter a ordem pública não é mais que evitar quaisquer acções que possam perturbar o sono dos ricos e poderosos.

Para nós violência é passar fome. Violência é 561 postos de trabalho serem destruídos todos os dias e 500 mil pessoas não terem qualquer apoio social. Violência é os 25 mais ricos de Portugal crescerem 17,8% em 2011 face ao ano anterior. Violência é passar toda a vida a trabalhar por um salário, apenas para sobreviver. Violência é ter de cumprir ordens sem nunca podermos ser nós a decidir como queremos viver. Violência são os ataques diários da polícia nos bairros sociais, violência é a detenção de imigrantes que procuram uma vida melhor, violência é prender pessoas por roubar algo para comer, violência é não poderes ir por ali porque está a Merkel a passar, não poderes ir por acolá porque é o parlamento onde se encontram seguros os governantes, não poderes passar porque simplesmente os polícias te gritam que tens de te ir embora se não queres levar um tiro. Violência foi a morte à queima roupa do Kuku na Amadora, os ataques da polícia contra os piquetes de greve, as balas de borracha numa manifestação no 1º de Maio em Setúbal, a carga brutal ontem em São Bento como em tantas outras situações. Que se desiludam aqueles que pensam que são as “pedradas” que causam alguma coisa, a violência policial em manifestações é uma constante, sobretudo se não houver televisões por perto a filmar.

A violência policial é a violência ordenada pelo sistema em que vivemos, em que uns têm tudo e outros sofrem na miséria. É a violência do Estado e do Capital. É a violência que irá crescer aqui em Portugal e em todos os lugares onde os governantes e os ricos tenham medo da revolta dos pobres.

Mas eles que não se esqueçam que não nos podem matar a todos. Não nos podem prender a todos. Haverá sempre quem resista. Quem volte. Com pedras ou sem pedras, haverá sempre quem lute contra os polícias armados, pois onde houver luta pela justiça e igualdade, haverá sempre cães de guarda a defender o dono.

Levamos um mundo novo nos nossos corações, e os golpes que nos desferem só nos fazem acreditar mais na justeza dos ideais e das formas de luta que defendemos.

Contra a repressão, solidariedade! Contra a exploração, acção directa!
Unidos e auto-organizados, nós damos-lhes a crise!

16/11/2012
Associação Internacional dos Trabalhadores – Secção Portuguesa
Núcleo de Lisboa
 
 
21
Out21

ANARQUISTAS PELA GREVE GERAL DE 14 DE NOVEMBRO


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(recebido com pedido de publicação)

A Greve Geral sempre foi considerada pelos anarquistas como um poderoso instrumento de luta e de combate. Numa altura em que todos nós, trabalhadores, desempregados, precários, estudantes, reformados, homens e mulheres de todas as idades, somos alvo de uma violenta afronta aos nossos direitos (dos salários aos subsídios sociais, da saúde ao corte nos direitos laborais, da educação à cultura) impõem-se, com renovada actualidade, formas de luta alargadas que mobilizem o maior número de explorados.

Apesar de críticos relativamente aos sindicatos do sistema – reformistas e colaboracionistas com o sistema político-partidário, sentados à mesa da concertação social, inundados de funcionários e de burocratas sindicais  –  e ao facto da greve geral do próximo dia 14 de Novembro estar a ser convocada mais como “um grito de protesto” do que uma afirmação clara de luta, consideramos que a alternativa aos cortes , à diminuição dos direitos laborais e à miséria só pode estar nas empresas, nas fábricas, nas ruas, no combate determinado de todos os explorados e oprimidos.

Por outro lado, ainda que os sindicatos da concertação social pretendam que esta greve assuma uma “dimensão nacional”, o facto de ter sido convocada simultaneamente em Portugal, Espanha e Itália faz com que a sua importância seja redobrada: a Europa dos explorados tem que se unir e fazer frente à Europa dos exploradores. Este é um primeiro sinal de que as palavras de ordem de protesto podem ser comuns e atravessar as fronteiras, encurralando o nacionalismo, que é o fomentador de todos os tipos de fascismo

Por isso, apesar de reconhecermos os limites e o carácter restrito desta Greve Geral, julgamos que dada a insatisfação reinante ela irá mobilizar muitas centenas de milhares de portugueses – e milhões de europeus – indignados e revoltados com a degradação das suas condições de vida e aspirando a uma nova organização social.

Nós preconizamos e lutamos por uma outra sociedade, de homens e mulheres livres e iguais, sem exploração nem opressão e sabemos qual o nosso lugar na sociedade: junto dos que sofrem e lutam.

Partimos, por isso, para esta Greve Geral com a convicção de que é nas empresas e nas ruas, nos bairros, que os anarquistas devem estar, divulgando as suas ideias, os seus modos de luta, a forma como se organizam.

Combatendo, de rosto aberto, as iniquidades, as injustiças, o medo e, ao mesmo tempo, denunciando os que, em nome dos trabalhadores, apenas pretendem criar-lhes novos jugos e novas submissões.

A acção directa, a sabotagem, a greve e a greve geral sempre foram os nossos instrumentos de luta. Ontem como hoje. Hoje como sempre.

Um grupo de anarquistas

Região Portuguesa,  Novembro de 2012

aqui; https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2012/11/09/anarquistas-pela-greve-geral-de-14-de-novembro/

21
Out21

GREVE GERAL IBÉRICA DE 14 DE NOVEMBRO: O SINDICALISMO NÃO É TODO O MESMO DE UM E DE OUTRO LADO DA FRONTEIRA


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“Levamos um mundo novo nos nossos corações” (Buenaventura Durruti)

A menos de duas semanas da greve geral ibérica (a que se juntou também uma das confederações sindicais italianas) é preciso salientar a diferença entre a organização sindical em Portugal e no Estado Espanhol. Em Portugal, por pressão do PCP e de sectores ligados à CGTP, logo a seguir ao 25 de Abril foi proibida a existência de outras centrais sindicais, por força da chamada “lei da unicidade sindical”. A própria UGT, criada por sindicalistas do PS e do PSD, tardou em aparecer – porque a existência de mais do que uma central sindical era ilegal. A lei foi alterada, mas o mal estava feito e o sindicalismo desacreditado e servindo de mera correia de transmissão dos partidos políticos. (Veja-se a promiscuidade da CGTP relativamente ao PCP ou da UGT em relação também ao PSD, mas sobretudo ao PS).

Em Espanha deu-se exactamente o contrário. O sindicalismo, que tinha sido uma das forças motoras da Revolução de 1936, com a CNT e a UGT, persistiu na clandestinidade e reforçou-se com o aparecimento das Comissiones Obreras, surgidas nas Astúrias após as greves mineiras dos anos 60. As CCOO foram inicialmente controladas pelo PCE, mas com a perda de influência deste partido transformaram-se numa central sindical heterogenea, cujas movimentações vão quase sempre a par e passo com as da UGT, ainda muito ligada ao PSOE. Este é o chamado “sindicalismo oficial”, mas para além dele existem várias centrais sindicais por todo o Estado Espanhol, sejam de âmbito estatal ou de âmbito regional.

No campo anarcosindicalista existem três centrais, cada uma delas com a sua especificidade. A CNT, a CGT, e a Solidaridad Obrera.

Em Espanha, a lei que rege os comités de empresa assenta numa espécie de parlamentarismo com eleição, nas empresas, dos representantes dos sindicatos, em listas próprias, um pouco como os deputados são eleitos para os vários parlamentos em listas partidárias.

A CNT, na altura, contestou este procedimento, dizendo que ele levava o parlamentarismo burguês para o mundo do trabalho e recusou-se a participar. Esta decisão motivou em 1979 uma cisão na CNT e alguns milhares de  militantes abandonaram a central sindical para formarem a CGT, que se transformou na terceira central sindical do país (depois das CCOO e da UGT,e que apresentou em conjunto com estas o pré-aviso para a greve de 14 de Novembro), com mais de 50 mil militantes e centenas de representantes sindicais por todo o país. Na actualidade as duas centrais sindicais – que se reclamam do anarcosindicalismo – têm efectuado diversas acções em comum e o seu relacionamento tem vindo a estreitar-se.

Solidaridad Obrerafoi fundada em 1990, e é uma pequena central sindical, reunindo alguns sindicatos, sediada sobretudo na Catalunha, em Alicante e na região de Madrid, com influência nalguns sectores como os transportes e que tem realizado diversas acções em comum com sindicatos alternativos de várias regiões do Estado Espanhol. Reclama-se igualmente do anarcosindicalismo.

No campo do sindicalismo revolucionário merece ainda destaque o Sindicato Andaluz de Trabalhadores (SAT), que reúne trabalhadores de diversas correntes, mas que utiliza métodos e práticas anarcosindicalistas, como a prática assemblearia, a acção directa, etc., confluindo muitas vezes em acções com a CNT, a CGT e a SO. Esta influência é mais visível ainda no seu sindicato agrícola – o SOC (Sindicato dos Operários do Campo) – onde as referências e a militância anarcosindicalista são muito fortes.(O SOC ocupou há alguns meses uma grande propriedade na Andaluzia – a Somonte – onde está a ser posta em prática uma experiência de cooperativismo agrícola interessante). Neste momento – entre 1 e 4 de Novembro –  decorre uma visita à Andaluzia em que cerca de duas dezenas de portugueses, alguns deles libertários, outros ligados a colectivos alternativos, vão conhecer, no terreno, algumas das experiências mais importantes lideradas pelo SAT (Marinaleda, Somonte, etc.).

São estes sindicatos que, na sua diversidade, fazem com que o movimento sindical seja forte e expressivo do outro lado da fronteira, enquanto que em Portugal o reformismo das práticas sindicais – com centenas de funcionários e burocratas sindicais a viverem dos descontos dos trabalhadores – e a falta de alternativas ao bipolarismo sindical têm  levado à perda de influência do movimento sindical e ao seu mero papel de instrumento das estratégias partidárias – sejam elas do PCP (CGTP), ou do PS/PSD (UGT).

aqui: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2012/11/02/greve-geral-iberica-de-14-de-novembro-o-sindicalismo-nao-e-todo-o-mesmo-de-um-e-de-outro-lado-da-fronteira/

19
Out21

18 DE JANEIRO DE 1934: DEPOIMENTO COLECTIVO DE DIVERSOS MILITANTES CONFEDERAIS LIGADOS À SUA ORGANIZAÇÃO


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Em mais um aniversário do levantamento dos trabalhadores portugueses contra o fascismo, a 18 de Janeiro de 1934, organizado pela CGT anarcosindicalista e por outros elementos ligados ao movimento sindical, reproduzimos um texto da autoria de um grupo de militantes confederais com responsabilidades no movimento e que, na sua maioria, foram por isso deportados para o Tarrafal. O texto foi escrito e publicado já depois do 25 de Abril de 1974, numa altura em que o PCP tentou recuperar para si a organização deste movimento que teve dimensão nacional, mas em que a insurreição operária apenas teve visibilidade nalguns locais mais circunscritos: Silves, Almada, Sines, Marinha Grande, etc.. (colectivo libertário de évora)

Como a verdade ressalta

Com a prisão, julgamentos e deportação para o Tarrafal dos elementos que participaram no 18 de Janeiro e o período de intensa repressão que se seguiu e veio a agravar-se com a eclosão da guerra civil de Espanha, o acontecimento cobriu-se de esquecimento que se prolongou por quarenta anos.

Na altura o 18 de Janeiro veio a público apenas na versão dos comunicados oficiais e com os ataques da Imprensa. A verdade dos acontecimentos, dos seus objectivos e da sua organização e preparação ficou oculta.

Algum tempo mais tarde, de vez em quando, o partido comunista foi insinuando as suas versões do 18 de Janeiro, apropriando-as com a sua técnica stalinista de história controlada e pré-fabricada ao modo conveniente, à formação da auréola de «partido da resistência» que foram criando, até muito especialmente coma ajuda da propaganda reaccionária, do seu «papão comunista», ou na costumada expressão de Salazar insistindo no «perigo do comunismo internacional».

Necessariamente, para criar credibilidade e como base técnica da sua habitual propaganda, teriam de eliminar, denegrindo e insultando com o seu indispensável apodo de traidores, os homens e as organizações não comunistas que na verdade organizaram e sustentaram a luta, cujos méritos e feitos ainda não foram devidamente apreciados.

Bento Gonçalves, que nessa altura era o secretário-geral do partido comunista, construiu esse processo de adulteração histórica, anos depois e já na deportação, escrevendo um folheto intitulado «Duas Palavras», partindo dum ataque demolidor dos objectivos e acções do movimento, mistificando os factos e disfarçando uma acção reformista por certo calculada, embora numa aparência perfeitamente infantil, terminando por demegrir o movimento classificando-o de «pura anarqueirada».

O partido comunista sob a sua chefia opunha-se ao 18 de Janeiro como movimento de greve geral revolucionária, como acção personalizada da organização sindical, porque afinal queriam converter todas as manifestações ao domínio do partido. Todavia, nessa altura, o partido não estava apto a exercer esse liderismo pois atravessava uma crise interna bastante profunda e confessa.

É Bento Gonçalves que nos diz:«No Partido o ambiente geral era de fuga para as acções isoladas. A maior parte dos camaradas de base do Partido, aliás cheios de denodo revolucionário e cuja sinceridade proletariana ninguém ainda pôs em dúvida, eram novos e desprovidos da mínima experiência sobre a actividade sindical e sobre os métodos sãos da táctica do movimento operário. No Comité Regional de Lisboa se criou a tendência geral para a acção directa. Em quase todos os outros sítios a situação era idêntica (…) E entretanto era absolutamente necessário vir a público para resolver a questão no interior do Partido, todas em quase todos os escalões pro essa duplicidade de táctica».

Ao escrever as «Duas Palavras» Bento Gonçalves teria de fazer derivar o imperativo da luta para hipóteses diferentes da greve geral que cobrissem a debilidade que estavam sofrendo, mas não só, para aproveitarem uma passagem suave a um sindicalismo corporativista no qual se instalassem sem dificuldades introduzindo a influência do partido. E define a posição: «Colocámo-nos no terreno da utilização das condições legais. Qualquer forma de luta ilegal ainda aí nem sequer era frisada, nem mesmo subentendidamente. Dizíamos, em substância, que os sindicatos ainda se regiam pelo velho alvará (1). Era portanto necessário lutar sobre essa base. Convocar reuniões de assembleias gerais com o fim de levar os trabalhadores a votar contra o Estatuto do Trabalho Nacional. O que era preciso patentear bem alto e bem publicamente que os trabalhadores estavam contra a fascização dos Sindicatos, que continuavam a dispor do direito de organização independente»`.

Até ao 18 de Janeiro ninguém teve a idiotia de propor a realização de assembleias para impedir a fascização dos sindicatos; a ideia é divulgada mais tarde para dar a justificação da tal  utilização das condições legais. Tal intenção seria simplesmente inexequível, porque seria para a polícia a melhor forma de poder identificar quem se opunha à legislação fascista e de poder conhecer a movimentação em preparação.

Ao partido interessava a esterilização dos sindicatos enraizados nas tradições de luta dos trabalhadores e experimentados na sua autonomia em relação ao Estado, aos partidos e ao jogo parlamentarista. O estrangulamento e a subalternização dos sindicatos permitiria, como veio a permitir depois do 25 de Abril, que qualquer partido marxista ou similar pudesse liderar as classes trabalhadoras e integrá-las no sistema político e económico.

Noutro passo podemos ainda ler: “Dum modo geral, desde Setembro de 1933 até à data da eclosão do movimento, os militantes sindicais cristalizam-se em volta da preparação do movimento grevístico e sedicioso, mandando ao diabo a questão das assembleias e das formas de protesto público de massas contra as medidas eminentes».

Conclui-se que na cúpula do partido se optava por uma forma de protesto simbólica abrindo passagem à adaptação sindical. E prossegue: «Entre os trabalhadores do Estado parece que só o Sindicato do Pessoal do Arsenal de Marinha efectuou uma assembleia, aliás largamente assistida de reprovação do ENT. Porém, mesmo neste sindicato, ainda nos recordamos do trabalho e das imposições a militantes que foi necessário fazer para conseguir a convocação da tal assembleia.»

Bento Gonçalves foi operário do Arsenal da Marinha; é estranho que diga parece que só o Sindicato do Pessoal da Marinha (o sublinhado é nosso) e por outro lado recorde das imposições a militantes (o sublinhado é nosso) para conseguir a convocação. O que não é de crer que a assembleia fosse para reprovar o ENT. A polícia estava pronta para reprimir manifestações desse género, e o pessoal não arrostaria a desencadear ordens cominatórias da direcção militar do arsenal. Tentaria a direcção do sindicato evitar que lhe fosse aplicada a supressão do direito de sindicalização prevista para os funcionários do Estado?

Deduz-se das declarações de Bento Gonçalves:

a) Que o partido estava na altura desorganizado e que nas bases se optava de preferência por uma acção revolucionária que a chfia condenava;

b) Que a cúpula do partido optava por uma acção legal que seria, naturalmente, pela aceitação da estatização dos sindicatos onde os quadros do partido se infiltrariam, facilmente acomodados ao estilo burocrático e centralista das direcções sindicais;

c) Que o partido estava em oposição a toda e qualquer acção revolucionária, preparando-se para a infiltração.

Confirma o que noutro passo escreveu: “Sobre a base desta dupla apreciação nós trazíamos todas as condições para empreender uma viragem de harmonia com o VII Congresso (2): a) os efectivos dos sindicatos ilegais deviam ser incorporados no partido; b)o centro do trabalho sindical devia deslocar-se para dentro dos sindicatos nacionais c) a unidade sindical (…) sobre a base da utilização de todas as possibilidades legais, interiores e exteriores ao sindicato nacional».

Confrontando as declarações de José Gregório num relatório tantas vezes evocado pelas várias seitas marxistas com as declarações de Bento Gonçalves, torna-se evidente a contradição.

Escreve José Gregório: «O Partido nomeou um comité para preparar e dirigir o movimento debaixo da seguinte orientação: Para que os operários pudessem alcançar a satisfação das suas aspirações precisavam de se apoderar das armas que estavam na posse duma força da GNR (…).»

O que vigorava no partido. a acção legalista ou a acção revolucionária? Como é que o partido nuns lados optava por uma acção de infiltração e na Marinha Grande o partido nomeava um comité para dirigir uma acção que depois viria a ser considerada putschista?

Se o partido, segundo a afirmação de José Gregório, nomeou um comité para preparar e dirigir o movimento, pode concluir-se que o 18 de Janeiro foi exclusivamente da sua iniciativa? Mas Bento Gonçalves, secretário-geral do partido, nessa altura, escreveu (3): «Esta questão (o 18 de Janeiro) não pode dizer-se que tenha entre nós uma análise completamente virgem. No «Avante!», logo após a eclosão deste movimento, conduzimos uma crítica ao caminho terrorista que, em vários sítios (por certo incluindo a Marinha Grande), se constatou nessa jornada e à táctica dominante, por vezes, no movimento sindical português que consistia em elaborar as acções muito para além das condições concretas e do estado das forças da organização operária.

«Se em vários aspectos, essa crítica foi deficiente, isso deve-se, em primeiro lugar, à deficiência dos nossos meios de informação. Por exemplo, o caso da Marinha Grande foi apresentado como um «modelo» de boa táctica. Só em Angra viemos a verificar que o feito ali, também, nem por isso tinha sido menos putchista.”

Não se compreende que tendo o partido nomeado o comité do movimento na Marinha Grande, segundo José Gregório, Bento Gonçalves venha considerar o movimento terrorista, negando-lhe a qualidade de «modelo» de boa táctica, e, o que é pior ainda, só se tivesse dado conta disso depois, já em Angra, e por deficiência de meios de informação. Esta deficiência só se pode aceitar em duas condições: ou estar afastado dos acontecimentos ou se se tivesse dado o caso de nomear o comité e tê-lo deixado desamparado.

De resto Bento Gonçalves acentua que acções daquele género (o 18 de Janeiro) de caminho terrorista era táctica dominante, por vezes, no movimento sindical português, assinalando deste modo qual era na verdade a autêntica origem do movimento e que o partido, pela boca autorizada de Bento Gonçalves, recusava e condenava.

José Gregório, presidente do Sindicato dos Vidreiros e pelo que entrou na preparação e condução do movimento na Marinha Grande, veio depois com o seu relatório dar uma contribuição falsa para a história pré-fabricada atribuindo ao partido o que fora iniciativa do sindicato. E é Bento Gonçalves que o desmente, mas por outro lado o pode acusar de pior.

Ouçamos ainda Bento Gonçalves, referindo-se à Marinha Grande: «Não estamos em presença duma acção do proletariado local, dum movimento grevista de protesto contra o Estatuto do Trabalho Nacional, que as massas alargam, em virtude da sua efervescência revolucionária, mas sim ante uma acção estruturalmente de vanguarda de membros do Partido e de comunistas sem partido, convencidos de que uma greve geral eclodiria em todo o país, à qual se junatria o reviralho» (o sublinhado é nosso).

Se José Gregório actuou como membro do partido, a sua acção, segundo Bento Gonçalves, foi uma acção estruturalmente de vanguarda e à espera do «reviralho», e não escapou à acusação de «anarqueirada».

Se Bento desmente o Gregório, este desmente ainda aquele. Se o movimento foi organizado pelo partido, segundo José Gregório, o Bento reconhece a origem sindical do movimento, que a greve geral preconizada pela CGT fora aceite, contrariamente ao que pensava o partido, que preconizava um «movimento de massas» através de assembleias gerais e pela utilização das condições legais, isto é, pela disfarçada aceitação dos «sindicatos nacionais» para neles se introduzirem, atribuindo a derrota do 18 de Janeiro ao «provincianismo anarco-sindicalista».

Todavia, apesar destas contradições, existe um nexo notável que interessa analisar.

«Duas Palavras» de Bento Gonçalves foi escrito em 1941 quando se encontrava deportado no Tarrafal, um ano antes da sua morte; o relatório Alberto, de José Gregório, está datado de Agosto de 1955.

Em 1941 tinham decorrido já 15 anos de regime ditatorial, a panóplia do partido estava vazia de qualquer acção contra o regime, pois até o 29 de Fevereiro de 1932, de que  nunca se fala, se cifrou num fracasso como organização e dos seus objectivos, pois uma das suas reivindicações, o subsídio de desemprego, foi aproveitada pelo governo para impor um desconto de 2% que nem o 25 de Abril nem a Intersindical contestaram. Era necessário adaptar a história, distorcer a verdade do 18 de Janeiro e pregá-los com alfinetes na panóplia vazia. O seu autor lançava assim as bases do seu culto de personalidade.

Em 1955, José Gregório, depois de ter em 1942 aparelhado com Cunhal no secretariado do partido, teria de ajudar a mistificar a história do 18 de Janeiro, aproveitando o seu título de presidente do Sindicato dos Vidreiros nessa altura para depôr com «autoridade».

Como toda a mistificação deixa sempre qualquer coisa de fora, que pode vir desmentir, assistiremos agora a José Gregório desmentir-se a si próprio.

No relatório «Alberto», José Gregório afirmou que «o partido nomeou um comité para preparar e dirigir o movimento…» faltando todavia esclarecer se isso foi a nível local ou nacional.

No mesmo relatório, referindo-se à organização e actuação do partido, faz certas análises das experiências recolhidas e tira algumas conclusões.

Analisemo-las tal como nos diz José Gregório.

«1º- A organização do Partido que foi montada em 1932 só passou a funcionar de um modo um pouco mais regular em princípios de 1933. Na prática não havia mais que um núcleo de camaradas a que se poderia dar o nome de organização local. Nas fábricas não havia organismos. Por outro lado o contacto com a direcção do Partido fazia-se muito raramente. Nestas condições os camaradas do Partido não reuniam numa base de Partido, não actuavam dentro das normas de disciplina de Partido, não se sentiam obrigados a prestar-lhe contas da sua acção. Por outro lado não era utilizada a  crítica nem a autocrítica. Criou-se o hábito de ver as coisas não sob o ponto de vista do Partido, mas sim na base individual, na base da legalidade sindical, crendo-se não poucas vezes na burocracia sindicalista (4). Tudo isso se tornou muito inconveniente para a formação e desenvolvimento dos quadros do Partido. Tudo isso contribuiu para que não fossem recrutados para o Partido bons operários de vanguarda homens e mulheres cheios de qualidade e de possibilidades para virem a ser um precioso material do Partido».

Com este quadro do partido como crer que ele fosse o organizador do 18 de Janeiro, que teve a extensão que teve. Quase temos vontade de dizer: que grande «anarquia» havia então dentro do Partido!

Esta desconformidade entre a organização interna do partido na ocasião e as proporções do 18 de Janeiro, confirma que este decorreu à margem daquele, embora elementos comunistas tivessem actuado, mas por via sindical. De resto, no mesmo relatório e ao terminar, José Gregório confessa: «O movimento de 18 de Janeiro também teve a participação dos anarquistas locais e de operários que influenciavam (certamente, dizemos nós, não orientados pelo partido). Deste modo se pode afirmar haver nesta data a  mesma característica de unidade que sempre existiu na nossa organização sindical desde 1931 até então». (O sublinhado é nosso).

1ª conclusão: «Ao elaborar o plano de acção para o 18 de Janeiro o Partido e o Comité Revolucionário, deixaram-se levar pela ideia feita de que a vitória era certa, que o fascismo seria derrubado sucedendo-lhe um regime de tipo proletário. Partindo-se deste princípio não se considerou a necessidade de encarar uma retirada de modo ordenado. Esta orientação é errada de nem sequer admitir revezes parciais…».

Deve prestar-se justiça ao José Gregório. Se ele se apropriou da organização do 18 de Janeiro para o Partido é justo que reivindique para ele os insucessos e os erros. A mesma coerência não a teve Bento Gonçalves quando apelidou o 18 de Janeiro de «pura anarqueirada».Não sabemos se José Gregório reivindicou para si e para o seu partido o insulto soez de Bento Gonçalves que por essa altura deportado no Tarrafal, lá mesmo no campo de concentração se prestou a fundir em bronze dois escudos evocativos da passagem do Carmona, manequim do regime fascista, por Cabo Verde na sua viagem a África, e ao deflagrar a guerra, ele em pessoa, foi apresentar ao director do acampamento, o sinistro capitão João Silva, a «colaboração do PC na defesa da pátria contra o imperialismo».

Conhecemos sempre o partido comunista como o modelo e o manual do perfeito oportunismo, do impudor das afirmações e das acusações torpes, além do exercício do mais completo reformismo embora besuntado de revolucionarismo, mas também o reconhecemos camaleónico, dizendo hoje o que ontem terá negado.

Se a CGT e os anarco-sindicalistas «traíram» o 18 de Janeiro, como também afirmam os trabalhadores, porquê o seu órgão «O Avante» de Maio de 1937, portanto 3 anos depois, com o Bento Gonçalves vivo e à frente do partido, publicava uma notícia, aliás falsa e simplesmente arquitectada, na primeira página e intitulada «Viva a Frente Única Proletária» aplaudindo a «unidade com a CGT»?

Começa a notícia assim redigida: «Pede-nos a CIS a publicação do documento que a seguir inserimos.»

«Fazemo-lo com a máxima alegria por este documento dar notícia de um acontecimento importante da vida do movimento operário português. Por ele se vê que a Frente Única Proletária está em via da sua imediata realização». E a CIS (a célebre Comissão Intersindical) dá a seguir a notícia de a CGT ter acedido às suas propostas para a constituição de um Comité de Frente Única Proletária, acrescentando: «No que se refere aos problemas de orientação da CGT nós pensamos que só a neutralidade em questões de tendência pode permitir a Unificação».

«Uma CGT comunista não contaria, com certeza com o apoio dos camaradas anarquistas, da mesma maneira uma CGT anarquista dificilmente encontraria apoio nos partidários da Ditadura do Proletariado” (5)

Além desta notícia ser totalmente desprovida de qualquer resquício de verdade é de pôr em evidência o impudor de afirmar a «máxima alegria» em quererem fazer uma união com aqueles que acusaram de traidores, de admitirem em emparceirar com os que têm denegrido.

Nunca a CGT teve qualquer contacto com o partido comunista e com a Comissão Inter-Sindical, apenas estabeleceu os contactos para o 18 de Janeiro cuja experiência e resultados deixámos já descritos.

O comportamento da CIS, toda a campanha posterior, tornaram evidente que não é possível qualquer colaboração com os comunistas como partido ou como qualquer agrupação, mesmo sindical, em que preponderem. O amoralismo dos seus processos, o desrespeito pelos compromissos assumidos produz-se logo que lhes seja oportuno.

A experiência do 18 de Janeiro não poderia voltar a permitir qualquer acercamento. Apertam a mão que não podem cortar e os acordos que estabelecerem hão-de resultar em seu benefício. Se não colherem o resultado total acusarão os outros de traidores.

(“Como a verdade ressalta”, capítulo do livro “O 18 de Janeiro de 1934 e alguns antecedentes”, um depoimento colectivo de Acácio Tomaz de Aquino, Américo Martins, Custódio da Costa, José Francisco, Marcelino Mesquista e Emídio Santana, que coligiu. Regra do Jogo, 1978.)

Notas

(1) O itálico é nosso para assinalar a declarada posição reformista. Não se compreende a relação entendida entre o alvará e a forma de actuação dos sindicatos de então. O alvará era o certificado do governo civil que reconhecia a legalidade dos sindicatos mas que não tinha qualquer relação com a sua orgânica e orientação.

(2) Ver «SEARA NOVA» nº 1513 – Março 1975, Movimento das Ideias; de Fernando Guerreiro.

(3) «Duas Palavras», de que vimos fazendo citações. O sublinhado é nosso.

(4) É surpreendente que, sendo José Gregório Presidente do Sindicato, ele não se queira responsabilizar pela «burocracia sindicalista».

(5) O Avante, Série II – 35 da 3ª semana de Maio de 1937

aqui: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2013/01/17/18-de-janeiro-de-1934-depoimento-colectivo-de-diversos-militantes-confederais-ligados-a-sua-organizacao/

19
Out21

REVISTA "APOIO MÚTUO", nº2, DA AIT-SP


Imagempara descarregar: AQUI

19 de Janeiro (sábado)
no Centro de Cultura Libertária em Cacilhas/Almada17h30
Apresentação da Revista Apoio Mútuo
Segundo número desta publicação da Secção Portuguesa da Associação Internacional dos Trabalhadores.

20h
Jantar vegetariano – Celebração do 90º Aniversário da Associação Internacional dos Trabalhadores

Nº 1 da Revista “Apoio Mútuo”

Centro de Cultura Libertária
Rua Cândido dos Reis, 121, 1º Dto. – Cacilhas – Almada
http://culturalibertaria.blogspot.pt/

Associação Internacional dos Trabalhadores – Secção Portuguesa
Apartado 50029 / 1701-001 Lisboa / Portugal
http://ait-sp.blogspot.pt/

aqui: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2013/01/16/no-2-da-revista-apoio-mutuo-aitsp-e-apresentada-no-centro-de-cultura-libertaria-cacilhasalmada/

19
Out21

18 DE JANEIRO DE 1934 ASSINALADO NO PORTO 79 ANOS DEPOIS


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Alguns textos: Irene Pimentel: 18 de Janeiro de 1934

 Paulo Guimarães:  Cercados e Perseguidos: a Confederação Geral do  Trabalho (CGT) nos últimos anos do sindicalismo  revolucionário em Portugal (1926-1938)

 Maria de Fátima Patriarca: O «18 de Janeiro»: uma proposta de releitura

18Forças de infantaria ocupam a Marinha Grande

11 (1)Largo da Marinha Grande ocupado pelas  forças repressivas

12 (2)Alguns dos operários detidos na Marinha Grande

embarquePresos  do 18 de Janeiro, a caminho da prisão em Angra do Heroísmo (a bordo do Carvalho Araújo).

CarvAraujoEmbarque dos insurrectos do 18 de Janeiro (entre os quais muitos anarquistas e anarco-sindicalistas, nomeadamente o coordenador da CGT e director da “Batalha”, Mário Castelhano) com  destino aos Açores (Angra do Heroísmo)

familiaFamilias dos presos da Marinha Grande numa manifestação junto ao Governo Civil de Leiria, em 1935, pedindo a sua libertação

aqui: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2013/01/14/movimento-de-18-de-janeiro-de-1934-assinalado-no-porto-esta-sexta-feira/

 

19
Out21

ANIVERSÁRIO DOS 91 ANOS DA AIT ASSINALADO NO PORTO A 5 E 6 DE JANEIRO DE 2013


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Os 91 anos da Associação internacional de Trabalhadores (AIT) vão ser assinalado no Porto este fim de semana. A iniciativa é do Sindicato de Oficios Vários, da Secção Portuguesa da AIT.

No sábado, dia 5 de Janeiro  haverá na Casa Viva , às 15h. uma “Perfomance Tecnorevolucionária” e no domingo, 6 de Janeiro, no Terra Viva, às 15h. – “Palestra: AIT, história e actualidade”.