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Memória Libertária

Documentos e Memórias da História do Movimento Libertário, Anarquista e Anarcosindicalista em Portugal

Documentos e Memórias da História do Movimento Libertário, Anarquista e Anarcosindicalista em Portugal

Memória Libertária

26
Fev23

Encontro de Informação Alternativa em Coimbra: consolidar relacionamentos entre vários projectos informativos alternativos no espaço ibérico


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Há 7 anos, nos dias 25 e 26 de fevereiro de 2016, realizava-se em Coimbra um Encontro de Informação Alternativa promovido pela Rede de Informação Alternativa, constituída em Portugal em Outubro de 2015, num encontro realizado no Alentejo, e que juntava o Indymedia Portugal, o Jornal Mapa, o Portal Anarquista e a Guilhotina.info, e para o qual foram convidados os órgãos de informação alternativos do Estado Espanhol  La Directa, Periódico Diagonal (agora El Salto) e Radio Vallekas.

O encontro teve o apoio de várias repúblicas estudantis ( Ninho dos Matulões, Solar dos Kapangas e Rosa Luxemburgo, bem como do Ateneu de Coimbra) e permitiu abordar diversas questões como a da arquitectura financeira destes canais de informação, a criação de uma rádio e a definição de formas de colaboração mais específicas do que até então.

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A Rede Portuguesa de Informação Alternativa funcionou durante vários anos, existindo ainda hoje uma relação próxima entre estas plataformas informativas. O Indymedia cessou a partilha de informações há alguns anos e serve hoje de plataforma para a Radio Paralelo, que utiliza o seu endereço electrónico; a Guilhotina.info viu reduzida a sua actividade após o seu sítio no Facebook (com cerca de 30 mil seguidores) ter sido clonado e é hoje um sítio de jogos, obrigando a guilhotina a criar outra página; o jornal MAPA e o Portal Anarquista mantêm-se praticamente inalterados. Foi (é) uma experiência interessante de partilha de experiências e procura de novos paradigmas comunicacionais ao nível ibérico.

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Reunião onde foi criada a Rede de Informação Alternativa (Alentejo, outubro de 2015)

No mês de Outubro de 2015 tinha-se realizado  uma primeira reunião no Alentejo, em que participou uma companheira de Madrid que abordou a questão das ferramentas informáticas ao dispor dos projectos de informação alternativos, Nessa mesma reunião, foi decidido  criar a Rede de Informação Alternativa – de que o Portal Anarquista faz parte desde a primeira hora – e realizar. meses depois, o encontro em Coimbra.  

No verão de 2016 o Portal Anarquista entrevistou os diversos colectivos que integravam a Rede de Informação Alternativa. Eis as respostas:

jornal MAPA: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2016/08/26/jornal-mapa-a-comunicacao-social-alternativa-deve-ter-a-capacidade-de-por-em-contacto-as-diferentes-formas-de-lutar-e-criar/

pt.Indymedia: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2016/08/28/pt-indymedia-a-social-democracia-da-troika-costa-catarina-jeronimo-e-ainda-um-momento-do-capitalismo/

guilhotina.info: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2016/08/27/guilhotina-info-de-nada-vale-ser-um-puritano-conceptual-e-um-inutil-na-pratica/

portal anarquista: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2016/08/29/portal-anarquistaa-desilusao-com-o-actual-sistema-politico-vai-trazer-mais-gente-para-o-campo-libertario/

Foi uma experiência interessante, em que estes projetos de informação alternativa colaboraram de forma diversa, mas empenhada, e em que a colaboração ainda hoje, em muitos casos, se mantém.

relacionado: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2016/02/17/coimbra-encontro-de-informacao-alternativa-a-25-e-26-de-fevereiro/

https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2016/02/27/informacao-alternativa-portuguesa-e-do-estado-espanhol-reunida-em-coimbra/

25
Jan23

(MEMÓRIA LIBERTÁRIA) COMÍCIOS ANARQUISTAS EM BEJA NO PÓS-25 DE ABRIL DE 1974


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O Alentejo sempre foi um terreno fértil para o anarquismo e para o anarco-sindicalismo enquanto instrumentos de luta para uma sociedade sem explorados nem exploradores. Na 1ª República o movimento libertário e anarco-sindicalista  teve uma forte presença em toda a região, sobretudo no seio dos trabalhadores agrícolas, dos artesãos (sapateiros, por exemplo), dos mineiros de São Domingos e de Aljustrel, dos corticeiros e dos pescadores da costa alentejana. Violentamente reprimido durante o fascismo, o movimento anarquista e anarco-sindicalista resistiu até onde pôde, vendo os seus melhores filhos, mortos, deportados ou presos.  Após o 25 de Abril de 1974 houve várias tentativas para recuperar essa tradição no Alentejo, tendo-se constituído grupos em Beja, Évora, Portalegre e noutras localidades. Em Beja, realizou-se no dia 25 de Janeiro de 1975 um comício que praticamente encheu o Ginásio do Liceu de Beja, em que estiveram presentes militantes e simpatizantes de todo o Alentejo. Este comício foi promovido pelos Grupos Anarquistas Autónomos. Alguns anos mais tarde, a 28 de Abril de 1979 realizou-se também em Beja uma outra sessão de esclarecimento promovida pelo jornal “A Batalha”, desta vez realizada na Sociedade Capricho Bejense. Ficam aqui, como registo, os cartazes e os panfletos distribuídos nessa altura na cidade de Beja.

aqui: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2014/08/08/memoria-libertaria-comicios-anarquistas-em-beja-no-pos-25-de-abril-de-1974/

25
Out22

(1979) Um comunicado anarquista a propósito do assassinato pela GNR de dois trabalhadores agrícolas em Montemor-o-Novo


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No dia 27 de setembro de 1979,  dois trabalhadores agrícolas, Casquinha, de 17 anos, e "Caravela",  de 57 anos, foram mortos pela GNR durante a entrega de uma reserva que fora retirada à Cooperativa Bento Gonçalves, na Herdade Vale do Nobre, no Escoural, Montemor-o-Novo. De todos os quadrantes situados à esquerda o crime da GNR foi alvo de crítica e de denúncia.

Os anarquistas também juntaram a sua voz aos protestos e a revista "Acção Directa" publicou na sua edição nº 15, de novembro de 1979, um comunicado assinado por "um grupo de anarquistas" exortando os trabalhadores alentejanos a organizarem-se e a passarem à ofensiva, através da violência revolucionária, não se deixando anestesiar pelo discuros das cúpulas partidárias e sindicais.

21
Out21

NA UNIVERSIDADE DE ÉVORA,MESA REDONDA: “GONÇALVES CORREIA: A UTOPIA DE UM CIDADÃO”


Vai realizar-se na Universidade de Évora uma Mesa redonda, subordinada ao tema “Gonçalves Correia: a utopia de um cidadão” (nome da exposição que pode ser vista na UE até ao fim do mês sobre a vida e obra do anarquista alentejano Gonçalves Correia)

A mesa redonda vai ter lugar esta terça-feira, 20 de novembro de 2012, pelas 16 horas, na sala 124 do Colégio do Espírito Santo da Universidade de Évora.

Participantes:

Prof. António Cândido Franco (DLL-UE)
Prof. Paulo Guimarães (DH-UE)
Dr.ª Paula Santos (Diretora da Biblioteca Municipal de Beja)
Dr.ª Francisca Bicho (responsável pela exposição Gonçalves Correia: a utopia de um cidadão)
Prof.ª Sara Marques Pereira (Diretora da Biblioteca Geral da Universidade de Évora)

Informação aqui: http://www.ueline.uevora.pt/agenda/(item)/5085

21
Out21

MANIFESTO DO COLECTIVO LIBERTÁRIO DE ÉVORA


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Um grupo de cidadãs e de cidadãos, homens e mulheres, reunidos em Évora, decidiu constituir-se em colectivo de reflexão e de acção como resposta à constante violação e limitação dos seus direitos e liberdades individuais e colectivas, bem como à constante diminuição da qualidade de vida e de perspectivas de futuro que a maioria dos trabalhadores, estudantes, desempregados, reformados ou simplesmente desocupados hoje enfrentamos.

Face à crise generalizada do capitalismo, e depois de morto o modelo das “democracias populares”, que mais não foi do que uma outra forma do capitalismo sobreviver ancorado na ideologia do Estado todo poderoso, é preciso reencontrar alternativas que, aliás, estiveram desde sempre na prática e na teoria dos sectores mais interventivos do movimento social e operário em todo o mundo.

As experiências autogestionárias, de acção directa, baseadas nas assembleias de base, com o mínimo possível de delegação de poderes, assentes no livre pensamento e na absoluta liberdade de organização, preferencialmente em rede e a partir da base, mantêm todo o seu carácter de inovação e de radicalidade.

É preciso voltar a colocar sobre a mesa questões como o poder e as relações de poder; o Estado; o salariato; a luta de classes. Reenquadrar a ecologia no contexto global da espécie humana e não apenas em termos de ambiente. Debater a violência e o pacifismo. Perceber como se pode passar de uma sociedade totalitária, onde o poder político e económico agem apenas em função do lucro e não da satisfação das necessidades do conjunto da humanidade, para uma sociedade assente na fruição e na utilização da imensa capacidade tecnológica hoje existente de modo a acabar com o fosso entre ricos e pobres, entre fartos e esfomeados, entre os que têm acesso à generalidade dos bens de consumo e os que deles estão totalmente excluídos, entre os que detêm o poder e aqueles que são totalmente despossuídos de qualquer grau de influência.

É preciso pensar e perceber o que são os chamados índices de felicidade ou de conforto e de que maneira, cada ser humano, enquanto tal, pode e deve participar, no chamado “banquete da vida”, de que hoje muitos milhões de seres humanos são, logo à nascença, postos à margem.

Queremos perceber também ao detalhe esta sociedade em que nos integramos. Alentejanos e eborenses consideramos ter muitas palavras a dizer no contexto local, fora dos confrontos da política partidária, onde a natureza dos interesses em jogo é quase sempre idêntica e pouco transformadora. Partindo desta nossa realidade sabemo-nos e sentimo-nos cidadãos do mundo, cosmopolitas, e queremos trazer também até ao espaço que habitamos novas experiências, outras ideias, formas diferentes de sonhar o futuro.

Não nos resignamos ao cardápio das ideias feitas, prontas a consumir, no “self-service” partidário. Fiéis à velha máxima da velha Associação Internacional de Trabalhadores de que a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores ou não o será, consideramos que todos, organizados e intervenientes, temos uma palavra a dizer na condução das nossas vidas e na construção de espaços de encontro e de ruptura com a apatia social e o imobilismo político que parecem caracterizar os dias que correm.

É contra isso que nos batemos e é contra isso que nos vamos bater. A favor de uma vida que valha, de facto, a pena viver. E não a sobrevida que o capitalismo (nas suas mais variadas formas) nos tem para oferecer.

Por tudo isto, prometemos não ficar parados e rasgar novas janelas na imensa planície das ideias e das práticas e convidamos quem esteja de acordo e solidário com este manifesto a juntar a sua à nossa voz.

Colectivo Libertário de Évora

Outubro/2012

aqui: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2012/10/29/manifesto-do-colectivo-libertario-de-evora/

20
Out21

( ALTERAÇÃO DE DATA!) FILME “A TROCA” É NA PRÓXIMA SEXTA-FEIRA, DIA 1 DE FEVEREIRO


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Por dificuldades de agenda, vamos passar o documentário “A TROCA”  na próxima sexta-feira, dia 1 de Fevereiro de 2013, às 21,30 H. na associação cultural “é neste país”, em Évora, e não no dia 2 como inicialmente tinha sido anunciado. Esperamos por todos na sexta-feira à noite para uma projecção interessante e um debate animado, para o qual convidamos todos os que se sintam motivados para esta temática que tem vindo a ganhar muitos adeptos quer em Évora, quer na região.

colectivo libertário de évora

aqui: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2013/01/28/atencao-alteracao-de-data-filme-a-troca-e-na-proxima-sexta-feira-dia-1-de-fevereiro/

 

20
Out21

MINA DE SÃO DOMINGOS: MISÉRIA E LUTA DE GERAÇÕES


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MINA DE SÃO DOMINGOS – 189? – A LA MINUTE (FOTÓGRAFO DE RUA) [FONTE: ANTÓNIO PACHECO] (AQUI)

 

Albino Forjaz Sampaio foi um jornalista e escritor republicano do início do século XX. Colaborou no jornal A LUTA, com Fialho de Almeida e Brito Camacho, a quem dedicou o livro “Crónicas Imorais”, editado em 1909 e que num dos capítulos aborda a situação dos mineiros de São Domingos, a propósito de uma greve dos 3 mil trabalhadores da empresa, propriedade de uma companhia inglesa, que transformara todo o couto mineiro numa verdadeira prisão, com polícia própria. São páginas que demonstram a miséria e a exploração que os trabalhadores mineiros viviam em São Domingos e que levaria a que esta mina do Baixo Alentejo fosse, já na República, um dos bastiões da organização sindical, com um forte sindicato dos mineiros integrando a CGT anarcosindicalista.

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*

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Valentim Adolfo João (30 de Março de 1902-29 de Janeiro de 1970)

A última grande greve em São Domingos registou-se em 1932, tendo havido uma violenta repressão subsequente em que os elementos mais destacados foram perseguidos, presos e despedidos da mina. A partir daí a presença anarquista e anarcosindicalista em São Domingos começou a decrescer. O último dirigente sindical anarquista – foi presidente do Sindicato dos Mineiros – Valentim Adolfo João era natural da Mina de São Domingos e esteve preso até quase ao final da década de 60, acusado de ter fornecido explosivos para o atentado a Salazar.

“AO PROLETARIADO: A CONFEDERAÇÃO GERAL DO TRABALHO E A GREVE NAS MINAS DE S. DOMINGOS”

(Apelo à solidariedade feito pela CGT, em 1932, quando a greve dos mineiros de São Domingos já durava há um mês)

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aqui: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2013/01/25/mina-de-sao-domingos-miseria-e-luta-de-geracoes/

20
Out21

POEMAS SOCIAIS EDITADOS PELA ASSOCIAÇÃO DOS TRABALHADORES RURAIS ESCOURALENSE (ESCOURAL-ÉVORA) POR VOLTA DE 1920


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No 2º poema há a indicação, manuscrita: “O presidente(*)  foi chamado ao juiz por causa disto”

(*) da Associação dos Trabalhadores Rurais Escouralense, fundada em 1911 – nota CLE

Fonte: projecto MOSCA (AQUI)

Título:
Caderno de poemas sociais
Data:
s.d. (c. 1920)
19
Out21

MINAS DE ALJUSTREL: HÁ 90 ANOS UMA GREVE DE QUATRO MESES OBRIGOU OS MINEIROS A ENVIAREM OS FILHOS PARA OUTRAS FAMÍLIAS OPERÁRIAS DE BEJA, BARREIRO E LISBOA


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“Aos heróicos mineiros e metalúrgicos de Aljustrel”

Esta fotografia mostra diversas Associações de Classe e Sindicatos de vários pontos do País, com as suas bandeiras,  que em 1923 vieram apoiar e solidarizar-se com a greve dos mineiros de Aljustrel travada alguns meses antes. Muitas destas associações já tinham demonstrado a sua solidariedade quando os filhos dos mineiros – eventualmente alguns ou a totalidade das crianças que estão na foto –  foram recebidos em Beja, Lisboa ou Barreiro por famílias operárias, enquanto a greve decorria.

Em baixo publicamos dois artigos de jornal. Um datado de Outubro de 1922, publicado no jornal “O Século”, não assinado, em que se dá conta da greve nas Minas de Aljustrel e da chegada de um grupo de filhos de mineiros a Lisboa, que fugiam assim à fome e à falta de condições que os pais em greve não lhes podiam dar.

O segundo artigo foi escrito cerca de 90 anos depois, em Maio de 2012 e publicado, como opinião, no “Diário do Alentejo”, pelo psicólogo Marcos Aguiar. São as memórias ainda vivas de um passado de luta que deve orgulhar gerações de aljustrelenses a quem, por este ou aquele motivo, esta gesta heróica tem sido ocultada. O roubo da memória colectiva é um instrumento do fascismo e das ditaduras.

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Os resultados de uma gréve

Chegam a Lisboa 19 filhos dos mineiros grévistas de Aljustrel, para se acolherem á proteção dos operarios da capital

Nas minas de Aljustrel declarou-se ha cêrca de um mez uma gréve que, até hoje, ainda não teve solução satisfatoria. Nem os industriaes transigem nem os operarios e estes debatem-se hoje na mais agonica das miserias. As suas reclamações são de mais tres escudos por dia, o que, junto aos 3$50 que ganhavam, lhes dava uma totalidade de 6$50, pouco mais ou menos o que tem qualquer operario em qualquer terra do paiz. Não transigem uns nem outros e assim as crianças, filhas dos mineiros, passavam já fome e inclemencias, o que, sabido dos operarios de Lisboa, resolveram estes tomar conta d’elas, mandando-as vir, para o que foi a Aljustrel um delegado da C. G. T. Antehontem partiram de Aljustrel para Beja 25, vindo depois 24 para Lisboa, por n’aquela cidade ter ficado uma, a cargo de uma familia compassiva. No Barreiro o operariado d’aquela vila tomou a seu cargo 5, chegando hontem, no comboio da manhã, 19 a Lisboa.

Estas eram esperadas por inumeras pessoas, que disputavam entre si a primasia no bemfazer.

A vinda das crianças, cujo aspéto não era feliz, como se calcula, deu logar a cenas comoventes. Bem cedo começam a sentir as agruras da vida os pobres inocentes que nenhuma culpa teem nos conflitos de que são vitimas. E bom seria que das lutas como esta não saisse apenas uma obstinada irredutibilidade. Essa leva apenas, como se está vendo, á miseria negra, aos prejuizos incalculaveis e á ruina economica das regiões onde se dá. Mais crianças se esperam por estes dias, pois parece que tão cedo o conflito não terá solução.

 (jornal O Século – 29.10.1922)

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O longo inverno dos mineiros de Aljustrel

Na passagem de 1922 para 1923, os mineiros da minha terra – Aljustrel – estiveram quatro meses em greve. Quatro meses que figuram na história do movimento anarcossindicalista como uma das mais longas paralisações de sempre, que colheu solidariedade em todo o País e, inclusivamente, além-fronteiras, junto do operariado do mundo industrializado de então. Muitos se identificaram com a causa dos mineiros de Aljustrel, documentada diariamente no jornal “A Batalha”, destacando-se um episódio, em particular, que me entusiasma e comove sempre que o evoco.
Tendo-se a greve arrastado por tanto tempo, a CGT (Confederação Geral do Trabalho) apelou ao proletariado nacional para que apoiasse os mineiros, ajudando os filhos dos grevistas. Assim, durante a greve dos mineiros de Aljustrel, mais de 200 crianças foram colocadas em comboios para serem recebidas e alimentadas pelos operários de Lisboa. A cargo do operariado de Beja ficaram 25 crianças e no Barreiro mais 50. Imagine-se um cortejo de centenas e centenas de pessoas em sofrimentos profundo, percorrendo o percurso que separa Aljustrel da estação de comboios do Carregueiro, para expedir voluntariamente os filhos da terra para as mãos de estranhos. Afigure-se o desespero que levou esta gente a tomar medidas tão extremas para proteger as suas crianças da miséria que a greve pressupunha. Invoque-se o medo que esta gente foi obrigada a dominar, tratando-se de tempos em que as greves eram reprimidas através do despedimento sumário e, não poucas vezes, pela violência e prisão.
Como é possível correr assim o risco de perder o pouco que se tem? Quem eram estas pessoas anónimas que afrontaram a todo–poderosa empresa mineira estrangeira? Mas o que moveu os meus conterrâneos para este gesto de afirmação social que envolveu tantos perigos? A resposta é complexa e ao mesmo tempo muito simples – a desesperança! Foi a desesperança perante as horríveis condições de trabalho e os baixos salários que levou esta gente simples a agir de forma tão radical. Em Aljustrel, no inverno de 1922/1923, da desesperança, nasceram heróis que, vencida a luta contra a prepotência do patrão estrangeiro, foram aclamados em todo o mundo industrializado como um exemplo a seguir.
Hoje, em Portugal, o desânimo é generalizado, ao ponto de alguns confundirem a “paz podre” que vivemos com a aceitação social das indignidades que nos são impostas. Não, não estamos em paz, estamos em torpor, incapazes de reagir a quem nos agride. Não, não estamos satisfeitos, estamos em apatia, observando, distantes, a forma como o País se carcome a si mesmo. Não, não estamos felizes, estamos em desesperança profunda, simplesmente ainda não conseguimos ter, nem por um momento, a mesma valentia dos mineiros de Aljustrel daquele longo inverno de há 90 anos.

Marcos Aguiar, Licenciado em Psicologia
 
(Diário do Alentejo – 19-05-2012)