No dia 1 de fevereiro de 1908 o rei D. Carlos e o principe herdeiro Luís Filipe foram mortos no Terreiro do Paço, em Lisboa, por dois carbonários, próximos dos ideais anarquistas. Foi o principio do fim da monarquia, tendo a República sido proclamada menos de dois anos depois a 5 de outubro de 1910.
Os autores materiais do atentado foram Manuel Buiça e Alfredo da Costa, um de Trás-os-Montes, o outro do Alentejo, os dois também mortos nesse diaem consequência do atentado, embora permaneçam dúvidas acerca do verdadeiro número de implicados (entre os quais o próprio escritor Aquilino Ribeiro, na altura um jovem militante anti-monárquico).
Rapidamente os dois autores do atentados foram celebrados como heróis, dado o descrédito a que a monarquia portuguesa tinha chegado.
Alfredo da Costa - Nasceu em Casével, filho de Manuel Luís da Costa e Maria João da Costa. Veio cedo da sua aldeia no Alentejo, no concelho de Castro Verde. Tendo aprendido as primeiras letras na sua aldeia natal começa a trabalhar como Empregado do comércio num estabelecimento que um tio seu abastado e lojista tinha estabelecido em Lisboa onde presidiu à Associação dos Empregados do Comércio de Lisboa
Torna-se mais tarde caixeiro-viajante por conta própria pois teria cortado relações com este tio correndo o país.
Sendo um autodidacta e rebelde funda em Angra do Heroísmo um jornal para defesa dos empregados do comércio, e tão bem conduziu a campanha que as suas reivindicações foram aceites e começaria a vigorar nessa ilha o repouso semanal. Nesta cidade também impulsiona o Núcleo da Juventude Anarco-Sindicalista.
Em 1903, em Estremoz, fez intensa propaganda republicana e daí começou a colaborar nos jornais de classe da capital. De entre algumas tiradas tem esta: "Se os senhores representantes da Nação mais uma vez nos votarem ao olvido, resta-nos a certeza de que os marmeleiros ainda crescem nos pauis" (escreveria ele em 1903) e "Tentar esmagá-lo (o opressor) num justificado impulso de revolta é um dever de todos nós" (dizia ainda em 1906).
Mediante um pequeno capital, emprestado por mão amiga, fundou uma pequena empresa de livraria, A Social Editora com Aquilino Ribeiro, onde foram editados alguns folhetos contra o regime. Esta encetou ainda a publicação em fascículos, distribuídos aos domicílios, do romance de índole popular, A Filha do Jardineiro (romance que através da ironia dava machadadas na carcomida árvore real de sete séculos, na empresa embrionária e mal sucedida consumiu este as suas poupanças, que não eram muitas.
Manuel Buiça - Nascido em Bouçoães, Trás-os-Montes, filho do reverendo Abílio da Silva Buíça, pároco de Vinhais, e de Maria Barroso, conhecem-se-lhe duas ligações conjugais. A primeira, entre 1896 e 1898, e a segunda com Hermínia Augusta da Costa, de que resultaram dois filhos - Elvira Celeste da Costa Buíça (nascida a 19 de dezembro de 1900) e Manuel Augusto da Costa Buíça (nascido a 12 de Setembro de 1907) que, à data do regicídio tinham sete anos e cinco meses, respectivamente. Cerca de cinco meses antes do Regicídio, Manuel Buíça enviúva.
Homem de carácter expansivo e exaltado, não mantinha, no entanto, muitas ligações exteriores ao seu círculo profissional e, frequentava, com Alfredo Costa e Aquilino Ribeiro (uma das pessoas a quem legou o testamento), o Café Gelo no Rossio.
Testamento - escrito a 28 de Janeiro de 1908, quatro dias antes do regicídio, não deixa de ser um documento interessante e digno de nota:
"Manuel dos Reis da Silva Buiça, viuvo, filho de Augusto da Silva Buiça e de Maria Barroso, residente em Vinhaes, concelho de Vinhaes, districto de Bragança. Sou natural de Bouçoais, concelho de Valpassos, districto de Vila Real (Traz-os-Montes), fui casado com D.Herminia Augusta da Silva Buíça, filha do major de cavalaria (reformado) e de D. Maria de Jesus Costa. O major chama-se João Augusto da Costa, viuvo. Ficaram-me de minha mulher dois filhos, a saber: Elvira, que nasceu a 19 de dezembro de 1900, na rua de Santa Marta, número… rez do chão e que não está ainda baptisada nem registada civilmente e Manuel que nasceu a 12 de setembro de 1907 nas Escadinhas da Mouraria, número quatro, quarto andar, esquerdo e foi registado na administração do primeiro bairro de Lisboa, no dia onze de outubro do anno acima referido. Foram testemunhas do acto Albano José Correia, casado, empregado no comércio e Aquilino Ribeiro, solteiro, publicista. Ambos os meus filhos vivem commigo e com a avó materna nas Escadinhas da Mouraria, 4, 4o andar, esquerdo. Minha família vive em Vinhaes para onde se deve participar a minha morte ou o meu desapparecimento, caso se dêem. Meus filhos ficam pobrissimos; não tenho nada que lhes legar senão o meu nome e o respeito e compaixão pelos que soffrem. Peço que os eduquem nos principios da liberdade, egualdade e fraternidade que eu commungo e por causa dos quaes ficarão, porventura, em breve, orphãos. Lisboa, 28 de janeiro de 1908. Manuel dos Reis da Silva Buiça. Reconhece a minha assignatura o tabelião Motta, rua do Crucifixo, Lisboa".
Gente de carácter, claro.